Não sei onde hoje se aprende a ser bom. Muito ouvi criticar os meus livros da primária. Porque Lourenço Marques e a mulher que bem em casa estava, etc etc. Lembro-me da história de Filémon e Baucis. Morrendo abraçados sob a forma de um carvalho e uma tília, porque não queriam sobreviver um ao outro. Quanto aprendi naqueles livros. O meu tio Guilherme era um homem bom. Morreu ontem. Nunca lhe ouvi uma voz mais alta. Fugia de casa pela antena de radioamador, uma brincadeira. E sorria, coisa tão rara nos Gamas. Não me atrevo a dizer que uso o seu nome, embora seja assim. Sou Manuel Guilherme e Gama. Aqui onde escrevo, em Ovar, sou Manuel. Por recondicionamento o meu pai, Manuel também, chama-me hoje Guilherme. Assim esta noite. O meu tio Guilherme permitia-me a esperança de haver um Gama com bom coração, que eu nele adivinhava bem mais que nos restantes irmãos. Do meu ainda tenho dúvidas. No que diz respeito ao meu nome obrigado pelo empréstimo, hoje sei - explicaram-me - que era o certo e é. Se existisse o Zeus da história o meu tio já teria morrido há uns meses e estaria agora numa qualquer encosta, na forma de uma árvore e abraçado a outra árvore. Mas em Ovar não há encostas e Zeus não existe. Viver é então um trabalho lento e cujo fim se esgota na própria vida. Amemos então. E seja.
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