Onde foi que tu, mentindo, desapareceste num passeio do outro lado da rua, fumando? Terias prometido parar, eu estava com a Mãe e ela não se conteve, vámos os dois o fumo, adivinhávamos o suspiro de alívio, o prazer recuperado.
Cheguei a contar-te os cigarros, fiz gráficos, a Mãe a perguntar-me, fumavas pelo menos meio maço sempre.
A explicação "outros tempos" serve para tanta coisa. A Mãe casou contigo sem saber que fumavas. Ou tu prometeste parar e não paraste. Mentiste. A Mãe descobriu os restos, as priscas, e foi informada por um qualquer elemento menor neste enredo: na trabalho tu fumavas. Acontecia tu fumares na fábrica que tinha sido do pai dela, como não chegar a saber?
Havia aquele cinzeiro de pé alto na sala ao lado do teu maple. Em que fase da nossa vida te sentavas ali? Sentavas-te ali ao fim da tarde? Lendo o jornal? Penso agora que da nossa biblioteca - e onde uma parte minoritária mas importante dos livros eram teus - nunca te vi folhear um livro. Esperaste sentado que te chamassem para jantar resgatado por um cigarro pensativo? Sim, porque lembro-me UMA VEZ de ter conversado contigo sentado no tal maple. Uma só.
Paraste de fumar quando obedeceste a uma indicação médica alheia. Sem mais. Então fumavas já menos. Trabalhavas aos recados numa garagem e distribuidora de gás, fazias um pouco de tudo, a capa caída pelos revezes da vida, já sem a prosápia de quem ao menos galo era das portas de sua casa para dentro. Paraste, ponto..
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