segunda-feira, 7 de março de 2022

As Minhas 101 Leituras - 11-20.

 Artes Marginais - A M Pires Cabral

Nasceu em Chacim, Macedo de Cavaleiros o mais importante trasmontano vivo. E o que seria de nós sem os trasmontanos? Gente curta de conhecimentos esquece que, do Norte, estes são os melhores. Reconhecido este poeta pelos seus pares da geração de setenta como um entre iguais. "Artes Marginais" recupera os poemas dos seus primeiros dez anos de publicação. No ensaio de saída do livro, Joaquim Manuel Magalhães escrevia: "Tenho a impressão que uma outra vantagem, para lá de pertencer a uma geração votada ao alheamento, coloca a poesia de A M Pires Cabral num espaço onde as páginas literárias promocionantes não chegam: o afastamento do centro." Este afastamento que lhe permitiu escrever coisas como: "Quando de mim disserem finalmente: / eis aquele cujos olhos injuriaram / em vão alguns astros poderosos - / estarei longe, estarei mudo e só, / estarei (se estiver, em todo o caso) / tecendo um fio intérmino e volátil. /  Estarei não restarei. / O costume. Que fácil rendição." Diga-se que a poesia subsequente a este livro não tem desmerecido. A M Pires Cabral, o homem que nasceu em Chacim, a terra do Real Filatório, pois que Trás-Os-Montes chegou a produzir a melhor seda.


Astérix Gladiador - Goscinny & Uderzo

Vi umas pranchas deste livro de BD há muitos anos num exemplar isolado da revista portuguesa Tintin que me chegou às mãos em tempos de penúria. Numa só página estava lá todo o humor de Goscinny e a limpeza de método do desenho de Uderzo. Desta dupla não há um livro mau. Li-os pela noite à minha filha vezes sem conta. São obras primas. 


Para quem cisma em comprar os Astérix's que não têm Goscinny sugiro antes "Hum-Pá-Pá" 😀


Astronomia - ?

A mais estranha das minhas amigas ofereceu-me este livro, usado, sublinhado, há muitos, muitos anos. Pertencia a uma colecção de divulgação duma editora portuguesa a que eu perdi o rasto. E ao livro.  O fascínio sobre esta ciência, ou seja, o estudo de tudo o que nos rodeia para além da exosfera já existia e foi exponenciado com o pequenino livro. Até hoje. Obrigado.



Bairro da Lata - John Steinbeck

Já escrevi várias vezes sobre a colecção de livros da RTP que surgiu nos anos setenta e que por 15 escudos o volume introduzia muita boa leitura e informação na casa das gentes. No que ao ler diz respeito este foi o livro de que eu mais gostei. Este livro não é uma comédia. Do que sei de Steinbeck este livro não destoa da sua produção. Mas para mim é o meu "feelgood-book". Porque habitado pelas melhores pessoas que eu já conheci no mundo dos livros. Para além de tudo isto sugiro a leitura de uma certa e determinada caça às rãs. Steinbeck escreve: "Os seus habitantes são, como disse o homem certa vez, "pegas, alcoviteiras, batoteiros e filhos da mãe", com o que pretendia dizer "toda a gente". Tivesse o homem espreitado por outra frincha e talvez dissesse: " Santos e anjos, mártires e homens bons", e significaria a mesma coisa.".


 Berlim, 1919.1933 - coord. Lionel Richard.

Este livro pertence a uma velha colecção da editora Terramar que se dedicava ao estudo de determinadas cidades - julgo que todas europeias - em determinada epóca, onde nelas a História correra mais depressa, ou mais espessa. Na realidade falamos da tradução de uma colecção francesa da editora Autrement. E a cidade mais importante para a História Europeia recente viveu os seus anos mais marcantes naqueles que este livro pretende retratar. "Os nazis fizeram da infiltração nos feudos comunistas o objectivo da sua acção em Berlim. Aliás, a partir de 1933, os cronistas oficiais das SA atribuíram um lugar central à vitória nazi sobre a "Babilónia Vermelha"- A secção nazi de Berlim foi fundada no início de 1925, as SA na primavera de 1926 e, desde logo, consagraram todos os seus esforços à "conquista do operário alemão"." Mas este livro é muito mais do que isto.


Boxe, O - Joyce Carol Oates

Este pequeno livro colecciona ensaios e histórias sobre boxe. Joyce Carol Oates assistiu a combates de boxe desde criança, quando era levada pelo pai. Ela escreve: “The only sport I’ve been interested in is boxing—but then, boxing isn’t a ‘sport’." A escrita é brilhante. Não, o boxe não é um desporto. 


Caderno do Regresso - Regina Guimarães

Tenho o prazer de conhecer de raspão pessoalmente a Regina Guimarães. Ela é muito próxima de gente que não me está longe. Este livro, pouco divulgado, que eu adquiri na velha Poetria com a Dina Ferreira, é assumidamente um diário poético, pessoal e lírico como só esta poeta podia escrever. Tem um dos poemas da minha vida e que eu desafio a procurarem. Começa assim: "Passeias dentro de mim / quando passeias comigo / embora eu não seja abrigo / nem sombra onde te deleites. / Cada olhar me trespassa / (...)"


Calvin & Hobbes - Bill Watterson

O que dizer sobre esta BD?  Aparecia na última página do Público e o meu pai cortava as tiras e guardava-as para as dar à neta, embora esta tivesse acesso generoso aos livros encadernados. Um jovem doente tive que, por curiosa coincidência onomástica, recebeu como presente a colectânea "Plácidos Domingos", onde se agrupavam as coloridas páginas domingueiras dos nossos heróis. O que dizer sobre o Calvin, sobre o Hobbes?


Cancioneiro para Timor, Um - Ruy Cinatti

Este livro é um dos mais bonitos que tenho. A poesia de Ruy Cinatti, contemporâneo de Sena e Sophia, tem muitos pontos altos. Ruy Cinatti, que lá trabalhou como agrónomo, apaixonou-se pelas gentes e pela terra e tentou na metrópole defender os povos timorenses da máquina colonial. A Guerra no Ultramar abafou a sua voz e foi proibido de voltar a Timor. A invasão de Timor pela Indonésia provocou-lhe uma crise existencial grave que quase o destruia. A poesia aqui escrita é o que o título diz, a tentativa de uma criação de um "cancioneiro", ou seja uma colecções de canções-poema para uma terra e um povo, em diálogo com poemas populares timorenses. O livro interessa também pelas fotografias e por outros textos de Cinatti sobre os timorenses nele incluidos. "O timorense meu amigo ensinou-me muito."


Cartilha Escolar - Ed Lello, Domignos Cerqueira

Neste livrinho muito cedo aprendi a ler, pelas mãos de minha mãe. Lembro.me bem da página onde aparecia a palavra "o-vo", cujo soletrar era-me, sei lá porquê, difícil. Na primeira classe tive um professor que dava pelo nome de Brandão e que, no intervalo de bater nos alunos, exibia-me aos colegas dadas as minhas qualidades de leitura. Visitei-o nos finais de 74, estava já eu no 1º ano do Ciclo Preparatório, por insistência dos meus pais. "Estás a ver, Manuel Guilherme? - dizia ele, mostrando-me a classe confusa e rebelde como nos meus tempos não era. "Agora não se pode bater em ninguém!". Que grande cabrão!





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