Era uma piada fácil. E o Ricardo Araújo Pereira, apesar de tudo, ainda é um... Gato Fedorento. Ele sabia que a piada do "homogeneral" aplicada desde o seu confortável gabinete no jornal Expresso ia ter repercussões. E teve. E das boas.
Na realidade, se na famosa campanha da Fox nunca se fala de sexo mas sim de género, actualizam-se as definições sem actualizar as palavras. A campanha em questão parece-me muito importante, e tem uma função que está para além da informação prestada. Definições são uma dezenas. Definição de "heteronormatividade": "Processo social e institucionalizado de que a norma é a heterossexualidade, ignorando e alheando a diversidade de orientações sexuais, identidades, expressões de género e características sexuais existentes na sociedade.". Parecem-me definições (que são paredes) a mais.
É muito difícil hoje em dia pertencer a uma maioria. Se eu fosse militante do PS, para não ir mais longe, hoje viveria confuso e sofrido com o governo que temos. Lembro-me de ter - bem cedo - conversado com a minha filha sobre algo parecido com o assunto em questão. Num mundo ideal uma pessoa - e assim me considero, uma pessoa, uma coisa vivente indivídual, felizmente única (um erro nunca é para repetir) - poderá apaixonar-se por quem quiser, homem ou mulher. E porque não? Risos, expressões, conversas, não é isso que chama, que acende? E não está tudo isto espalhado pelos vários lados da questão em questão?
No mundo real não é bem assim. E nisto só por mim posso e vou falar. Como médico sei que sou um ser vivo. Mais um, um entre muitos à superfície de um planeta oh, tão em crise! Como os restantes tenho em mim mecanismos de reprodução cujo objectivo é, através de mim, manter a minha espécie viva. A estes mecanismos chama-se sexo (o aparelho reprodutor não chega, é preciso querer usá-lo com) . Se quisermos utilizar uma metáfora informática, isto é um programa. Manter a espécie viva precisa da "heteronormatividade" acima mencionada. Portanto o processo referido, antes de ser social ou institucional é biológico. Ou seja, não falamos de uma norma mas sim de uma necessidade. Não minha, não da sociedade. Da espécie. O amor veio dar capa de livro ao que as leoas e os leões fazem entre eles. E os louva-a-deus, sabendo nós como acabam. O fogo que "arde sem se ver" veio cozinhar e optimizar para o palato aquilo que cru é apenas um desiderato darwiniano. Devemos assim dar Graças a Deus pela poesia fantástica que é o Amor, o Maior dos disfarces.
No meu mundo real eu sou definitivamente heterossexual. Ou como o RAP diz, "heterogeneral". Estou assim feito. Não me sinto nem particularmente bem nem mal por isso. Há coisas em mim que gosto, muitas que não mesmo. Estas questões são das menos questionadas em mim. Sei que não tive educação nem sexual nem para a cidadania. Sei que a minha adolescência foi irrepetível de tão complicada. Mas aconteceu assim e assim estou eu agora feito e acontecido. Como a calvície.
Eu sei que o Amor pode ultrapassar ciclos de vida, gerações, idades correctas e incorrectas, eu sei. Que nos lares acontece e nas prisões mais solitárias da nossa realidade virtual, nada tendo a ver com aquilo que disse antes. Mas onde começou tudo?
Vivemos os tempos mais inclusivos da História. Vivemos. O humor do RAP é, entre milhões de outras coisas, algo que nos diferencia "dos animais". Não todos os cambiantes de género e sexo e interacção humana íntima e menos íntima que podem acontecer, que estão descritos em outras espécies animais. O melhor de mim é se tu sorrires, se o teu olhar se iluminar como antigamente, se eu ouvir o teu riso aberto. O resto de que não falei falando também é muito bom. Mas rir é o melhor que há, ponto.
As perseguições foram muitas e ainda as há. O mundo é ainda perigoso lá fora e não sei se não vai ficar a ser mais. Foi sempre a diferença. E sempre será. Se eu o beijar em público é diferente de eu a beijar em público. Mas não vamos agregar demasiado as coisas. Para não ir mais longe, esta terrível e imperfeita Europa Ocidental em que vivemos é, sem qualquer margem de dúvida, o mais inclusivo canto do Planeta Terra. É assim tão simples? Não é. Mas não podemos rir nem um pouco com o assunto?
Há muitos anos respondi a um questionário qualquer numa revista qualquer. Resulta que eu era 67% homem, 33% mulher.
Olhem, um Abraço Amigo e Risonho deste que se assina 100% Guilherme.
PS.: eu sei: branco, homem, "heterogeneral", europeu ocidental, nascido numa mui pobre ex-potência colonial, profissional "liberal" mas só a trabalhar na função pública, eu sei que carrego a culpa MÁXIMA. Mas na realidade eu sou, como todos, a mais pequena das minorias. Sou eu. E carrego apenas e só a minha história. Já é peso suficiente.
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