Tudo começa com a Laurie Anderson. 1982. Big Science. From The Air. Tinha então, Catarina, dezoito anos eu, Catarina. Como tu agora.
Esta peça, "Dicionário" é o fim. É o fim, já disse. Não haverá mais disto. Disto o quê? Espectáculos no Palácio do Bolhão, com pais atentos, nervosos e parciais. Professores. Colegas a aplaudir sempre. Dezoito anos, Catarina. Às vezes esqueço-me do novinha que és. Adolescente é a palavra mais difícil de definir. Uma criança a quem cresceu muito o corpo? E a quem o mundo todo aparece brilhante, brilhante, o mundo aquela hipótese de deslumbramento e exploração sem fim? Ou o adolescente é como nós, apenas antes? O Galante falou de "pornografia autobiográfica". Odeio a pornografia e a palavra também. Nudez chegava mas eu percebo a confusão. Foi um "como aqui chegamos" com algum ajuste de contas. E nós deste lado a perguntar: "É verdade? Tudo isto é mesmo verdade? Não estamos afinal no teatro? Na terra da efabulação e do disfarce?" Mas atiram-nos com frases, momentos, fotografias, e as frases foram, as fotografias aconteceram e os momentos também. Os nossos jovens estão cansados de ouvir: "Ainda não viveste nada!" o que não é verdade, eles ainda só viveram é pouco! E o quê? A resposta é os pais, os pais, pornograficamente os pais, mas também a infância (e os avós), esta escola. Talvez um primeiro amor, talvez um segundo. E por entre a catarse ouve-se os Beach Boys - Pet Sounds - e fala-se de um urso que vai ser corajoso. Até dá para rir! E infelizmente traduzem o mais bonito verbo do Petit Prince. "Apprivoiser!" "Si tu m'apprivoises, nous aurons besoin l'un de l'autre. Tu seras pour moi unique au monde. Je serais pour toi unique au monde..."
O "Dicionário" é composto de palavras e que seria de nós sem esses nós duros que são certas e determinadas palavras. Lembro "quarto", "prisão", "encruzilhada", "fundo", houve mais. A encenação brilhante, os nossos jovens muito bem, chorosos no fim, claro, claro, isto era o fim. E eles ali de pé, oferecendo-se à nossa adoração, tão altos, tão novos e tão fortes, talvez...
Como dizia o Vasco, isto foi apenas "O Prefácio".
Ou como dizia a Laurie Anderson, "There is no pilot" (from now on...).
Catarina, orgulho-me de ti todos os dias. Ontem foi um bocadinho mais.
ps: parabéns Joana Craveiro. Brilhante, brilhante. Tantas catarses e todas soarem diferente, é obra!
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