O ciclismo protuguês continuou a afirmar-se fora de fronteiras em 1957. E desta vez através de um rapaz de 22 anos chamado José Manuel Ribeiro da Silva. Nascido em Lordelo-Paredes, surpreendera Alves Barbosa ao ganhar a Volta a Portugal em 55. Segundo em 56, participaram os dois na selecção portuguesa que foi à Vuelta a España em 57. Ribeiro da Silva foi quarto, num pelotão interessante onde constavam os italianos Fornara e Nencini, os franceses Gemoiniani, Bauvin e Walkoviak (o tal vencedor do Tour em 56) Possivelmente alguns só estariam a fazer rodagem e a preparar-se para o Giro ou o Tour. Mas mesmo assim. À frente de Riberio da Silva só ficaram Loroño, que esteve intocável e ganhou com oito minutos de avanço sobre Bahamontes e em terceiro Bernardo Ruiz, um veterano espanhol também de grande qualidade. Alves Barbosa aparecia em 17º, do resto da selecção portuguesa só tinha sobrevivido Agostinho Ferreira que terminou penúltimo.
Portanto, os dois, Ribeiro da Silva e Alves Barbosa. Apareciam no Tour de France englobados na famosa equipa Luxemburgo-Mista, outra vez tendo Charly Gaul como chefe de fila.
E quem eram os favoritos do Tour nº 44?
Vendo o que tinha sido a época de 57 até Junho, a nova estrela francesa Anquetil ganhara o Paris-Nice. As corridas de um dia foram apanhadas por especialistas das mesmas. A Vuelta como já vimos pertencera aos espanhóis, com Loroño melhor que Bahamontes. O Giro fora ganho pelo local Nencini, que negara a vitória a Louison Bobet - Bobet não corria o Tour, não fora seleccionado. Gaul fôra quarto em Itália, Geminiani quinto. A Volta à Suiça pertencera ao italiano Fornara, que também não vinha ao Tour.
Ficava então a equipa de França com Walkoviak com o nº 1 mas siginificativamente Anquetil como nº 2. Bauvin e Jean Forestier logo a seguir. Dos espanhóis já falámos, vinham os dois rivais Loroño e Bahamontes. Gaul era a incógnita luxemburguesa. Os italianos traziam Nencini que vencera o Giro mas também os capazes Astrua, Padovan e Defilippis. Os belgas traziam à cabeça Adriaensens (Ockers falecera no fim de 56 num infeliz acidente de pista) mas também Close, Marcel Janssens e o jovem Joseph Planckaert. Os holandeses mantinham Wout Wagtmans como aposta para a CG. Na Suiça um nome novo, Rolf Graf. Nas equipas francesas regionais apareciam Dotto, Lauredi, Antonin Rolland e dois jovens, Marcel Rohrbach, que ganhara o Dauphiné, e Henry Anglade..
L'Équipe dava como favorito Bahamontes, visto o acontecido no ano anterior. Vários franceses apareciam como hipóteses logo atrás, entre eles Jacques Anquetil. A vitória no Paris-Nice mostrara que era algo mais do que um ás no Contra-Relógio. Tinha 23 anos. Ribeiro da SIlva 22.
As Grandes Voltas nos anos cinquenta eram muito mais incertas do que viriam a ser quinze, vinte anos depois, com o Tour de 56 a ser um caso extremo. Os roladores e as equipas masi fortes aproveitavam as etapas planas longas, sempre com mais de 200 km para fazerem cortes, provocar fugas, fazendo perder tempo aos trepadores e aos corredores das equipas piores. Por outro lado, as etapas de montanha raramente terminavam em alto. Era preciso saber descer ainda melhor do que subir. Um trepador que descesse mal ou que rolasse mal não tinha a vida fácil.
A 1ª etapa do Tour de 57, plana, entre Nantes e Granville, seguiu o desenho do ano anterior e, numa fuga voltou a ser o francês Darrigade a ser a primeira camisola amarela. Mas calma, os favoritos chegaram a terra minuto e meio depois, incluindo Ribeiro da Silva. Alves Barbosa perdeu algum tempo. A 2º etapa também aconteceu na Bretanha e decorreu sob um calor asfixiante. Nesta etapa desistiu Charly Gaul e meia equipa luxemburguesa. A intolerância de Gaul ao calor tornar-se-ia famosa. Isolado ganhou a etapa o francês René Privat, mas o mais importante era referir dos favoritos quem chegou nas primeiras linhas: Bahamontes, o italiano Astrua e os franceses Bauvin, Dotto e Forestier. Mas as diferenças, lembrando 56, eram escassas. Dos portugueses, Barbosa segurara-se razoavelmente, Ribeiro da Silva não, perdendo 27 minutos.
No dia a seguir um CR por equipas foi o aperitivo para uma etapa de roladores vespertina. Onde Anquetil ganhou a primeira etapa no Tour da sua vida. A equipa francesa voltou a atacar e criar uma fuga. A ideia era roubar tempo a Bahamontes antes dos Alpes. Não conseguiram. Mas puseram tempo em muita outra gente. Nos primeiros dez minutos da CG estavam Bahamontes, Astrua, Dotto, Nencini e Anquetil. E o vencedor do ano anterior, Walkoviak. Mas ninguém falava nele. Nem nos portugueses, Barbosa no lugar 46, Ribeiro da Silva no 58.
A etapa 4 terminava em Roubaix e continha muito pavé. O calor continuava a castigar. Venceu um jovem belga, Marcel Janssens, isolado, que daria que falar. O pelotão principal chegaria 11 minutos depois, com os dois portugueses. O francês Forestier ganhara algum tempito mas a amarela era ainda de Privat. Janssens entrara para o top dez. Da equipa luxemburguesa tinham desistido todos os luxemburgueses. Restava um alemão, um inglês e... os dois portugueses. Barbosa andou um pouco escapado no início da etapa, sem mais.
A etapa 5 ia até Charleroi e voltava a seguir um caminho tipo "clássica", com pavé. Com menos calor mas chuva. Anquetil e Bauvin atacaram logo no início. Bauvin ganhou a etapa, Anquetil a amarela. Não houve pelotão organizado à chegada. Marcel Janssens perdeu apenas minuto e meio, Bahamontes doze. Os portugueses chegaram pouco depois. No top dez oito franceses. Em segundo Marcel Janssens, a 1 minuto. As distâncias ainda não eram proibitivas. A etapa 6 terminou em Metz e pouco acrescentou. A etapa 7 terminou em Colmar e também decorreu com pouca animação. Loroño correu na fuga e recuperou 8 minutos, Anquetil emprestava a camisola amarela a uma terceira figura. Bahamontes o melhor espanhol, Astrua o melhor italiano. Barbosa 37º, Ribeiro da Silva 48º.
Finalmente na etapa 8 Alves Barbosa conseguiu entrar na fuga e terminar 8º e ganhar 17' ao pelotão. Com ele ganharam o mesmo tempo Loroño, Forestier, Forestier ganhava a amarela e 14' de avanço sobre Anquetil, Loroño entrava no top dez, ultrapassando o seu chefe-de-fila. Barbosa subia a 16º, Ribeiro da Silva, perdendo algum tempo era 50º, num pelotão que agora era só de 79 corredores.
A etapa 9 acontecia como a última antes do dia de descanso e dos Alpes. Anquetil entra na fuga do dia aproveitando uma pequena subida, e acaba por vencer a sua segunda etapa. Dos belgas só Plackaert ia com ele, Janssens não, e também não o camisola amarela Forestier. Este ia para o dia de descanso apenas com 2.39 de avanço sobre Anquetil que se percebia ser o patrão da equipa. No top dez seis franceses. O veterano holandês Win Van Est estava a 11 minutos, os belgas Planckaert e Janssens a 12 e 15 minutos respectivamente, Loroño é 10º a 18 minutos. Bahamontes abandonou espalhafatosamente nesta etapa por dores num braço dizem uns, por birra ao ver-se ultrapassado por Loroño, dizem outros. Os dois melhores escaladores estavam fora.
A 10ª etapa terminava em Briançon e passava o Telegraph e o Galibier. Escaparam Janssens e Nencini, ganhando este a etapa. Anquetil subiu bem e voltou, portanto, ao esperado primeiro lugar. Loroño chegou logo a seguir a Anquetil mas 4 minutos passados... Ribeiro da Silva subiu mais ou menos, Alves Barbosa em marcha atrás... O primeiro adversário real de Anquetil era Marcel Janssens e era 4º a 11 minutos...
A etapa 11 para Cannes tinha no começo ainda alguma coisa de Pirenéus mas o mais importante foi o calor e a distância, 286 km. No final Nencini e Janssens atacaram Anquetil, que se defendeu com qualidade. Loroño e os portugueses foram apanhados desprevenidos no final e levaram + 5 minutos de atraso. A etapa 12 terminava em Marselha e tinha a subida icónica do Mont Faron. Vitória isolado de Stablinsky, um francês de origem polaca e futuro ganhador da Vuelta e do Campeonato do Mundo. O grupo de Anquetil e onde vinha Ribeiro da Silva ganhava mais cinco minutos a Loroño. Alves Barbosa chegou dentro do controlo mas resvés... As principais ameaças a Anquetil eram ainda Marcel Janssens a 11 minutos, Nencini a vinte! Ribeiro da Silva tinha subido para 31º. Barbosa descido para 40º.
Na etapa 13, plana, Loroño e Bauvin recuperaram numa fuga 10 minutos. Da equipa Luxemburgo-Mista restavam os portugueses. Eram mesmo outros tempos. Na etapa 14 Ribeiro da Silva entrou na fuga e ganhou 16 minutos. Nesta fuga o único austríaco do pelotão, Adolf Chriatian, subiu ao 4º lugar. Ribeiro da Silva era agora 27º.
A etapa 15a decorreu até Barcelona sem grandes aventuras. Algo terá acontecido a Alves Barbosa, que fechou último, com 25' de atraso. De tarde aconteceu um Contra-Relógio nas encostas de Montjuich. Anquetil ganhou à frente de Forestier e Loroño. Alves Barbosa foi 14º, Ribeiro da Silva 23º. Ribeiro da Silva 28º, Alves Barbosa 50º.
A etapa de 16 foi de transição em direcção aos Pirenéus e pouco rendeu. Na chegada a Aix-les-Termes as diferenças mínimas. Na etapa 17 passou-se o col du Porrtillón e aqui sim Loroño deu luta e distanciou Anquetil. Mas na descida para St-Gaudens as forças equilibraram-se. Alves Barbosa chegou fora do controlo, Ribeiro da Silva ficava sózinho.
A etapa 18 era a etapa dita rainha, com o Tourmalet e o Aubisque. No dia a seguir à eliminação de Alves Barbosa, Ribeiro da Silva ia ter o seu dia de glória. Pouco depois da partida criou-se a fuga e Ribeiro da Silva entrou nela. Quando chegaram ao Tourmalet o português tomou a dianteira e não mais a largou, passando primeiro no alto do Tourmalet. Atrás dele Dotto, Loroño, Anglade, Nencini e Adriaensens- Todos tinham conseguido ganhar algum tempo a Anquetil. Ribeiro da Silva foi apanhado na descida e os grupos juntaram-se mas o Aubisque voltou a separar os melhores trepadores, e a descida até Pau nâo permitiu novo reagrupamento. Nencini venceu a etapa, Loroño, Dotto e Andriaensens tinham ganhou mais de dois minutos a Anquetil, idem Janssens que se tinha incorporado tardiamente ao grupo da frente. Ribeiro da Silva terminou a etapa no grupo de Anquetil e era agora 21º. No dia seguinte, como único sobrevivente da equipa do Luxemburgo, seria incorporado na equipa France-Sud-Oest. Ribeiro da Silva ganhou o Prémio da Combatividade nesta etapa.
A etapa 19 foi um passeio até Bordéus onde se permitiu que um italiano ganhasse a etapa com mais de 20 minutos de vantagem sobre o pelotão. A etapa 20 foi um CR de 66 km que deu a quarta vitória de etapa a Anquetil. Ribeiro da Silva não era um all-rounder como Alves Barbosa e desceu dois lugares para 24º (já tinha antes sido ultrapassado pelo tal italiano dos 20'...). A classificação ficara decidida em Pau. Anquetil tinha agora com o CR uma vantagem de 14'56'' sobre o belga Marcel Janssens, a seguir apareciam a surpresa austríaca Adolf Christian, o francês Jean Forestier e o espanhol Loroño.
Nsda de importante aconteceu nas duas etapas finais, ambas ganhas pelo velocista francês Darrigade. Ribeiro da Silva ainda perdeu mais um lugar para outro italiano que tinha participado na fuga da penúltima etapa. Anquetil era o novo herói francês. Ribeiro da Silva tinha tido o seu momento de glória. Morreria num acidente de viação a 9 de Abril de 1958.
Graças à qualidade das prestações de Alves Barbosa em 56 e Ribeiro da Silva em 57, houve ciclistas portugueses convidados para os Tours de 58, 59 e 60. Em 61 já não. As proezas não se tinham repetido. Em 62 o Tour passou a ser disputado por equipas comerciais como as restantes provas do calendário velocipédico. Teríamos de esperar por 69 para ter um português - Joaquim Agostinho - a correr o Tour.
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