domingo, 13 de agosto de 2023

"Saúde Privada e Hospitais Privados em Portugal" por Miguel Gouveia.

 Saiu para a rua no final de 2022 o livro acima mencionado de Miguel Gouveia, publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos. Não me considero capaz de uma crítica compreensiva do texto. Algum viés aparente no texto pode apenas nascer do âmbito do estudo proposto e não obvia à fotografia da realidade que é tão fácil de tirar: o Serviço Nacional de Saúde não responde bem e cabalmente ao que lhe é pedido pelos portugueses. O viés que eu refiro nascerá do texto ser escrito por um economista da Católica, aquela universidade daquele curso de Medicina recentemente criado... Mas adiante. Eu, pobre trabalhador de um pobre SNS, de que estou a rir?

Miguel Gouveia é particularmente arguto a definir o Sistema Nacional de Saúde português como um sistema onde existe "progressividade fiscal". Ele escreve: "Ao baixar a qualidade de serviço do SNS e ao induzir segmentos da população com rendimentos médios e altos a recorrer ao setor privado, gera-se uma situação em que estes grupos estão, na verdade, a pagar o SNS com os seus impostos, mas a utilizá-lo com cada vez menos frequência. Isto leva a que o financiamento deste sistema de saúde seja muito mais progressivo quando se examina a contribuição líquida (subtraindo aos impostos os benefícios recebidos) por grupo de rendimento. Nesta lógica, os mais pobres seriam favorecidos pela redução da qualidade do SNS: se este sistema de saúde melhorasse, os grupos populacionais com rendimentos médios e altos passariam a utilizá-lo mais frequentemente, aumentando os seus custos globais. Isso levaria a um incremento dos impostos em geral, incluindo aqueles que seriam pagos pelos mais pobres. // Em suma, a reduzida qualidade do serviço do SNS (...) resolve o problema primordial das Finanças, que é a contenção de custos (...). Para quem ainda não tinha percebido Fernando Medina...

Este lvrinho merece leitura e releitura sérias. Em nenhum parágrafo há qualquer reflexão sobre a remuneração da classe médica, quer dum lado quer do outro da trincheira. A velha dedicação exclusiva é arrumada num simples parágrafo: "A opção pela exclusividade era usada oportunisticamente tanto por médicos em fim de carreira como por outros que desejavam aumentos de rendimentos sem aumentos de produtividade" (!). Claro que a partir daqui a discussão política recente da "dedicação exclusiva obrigatória" (com a qual não concordo) é veementemente desaconselhada, pois poderia levar a uma "explosão de custos". Defende-se a "situação corrente" de uma dita "prática dual", "desejável porque amortece a competição que existira pelo trabalho dos médicos em exclusividade e aumenta a oferta total de serviços realizada, com ganhos para o setor público (e também para o privado)". A baixa produtividade do SNS é um mantra repetido ad nauseam, e, por ex., o peso da formação só é mencionado ao se saudar o início de alguma formação em hospitais privados. 

A análise da resolução dos contratos das PPP restringe-se apenas aos números: poupava-se "X", produzia-se mais "Y". Portanto... mas porque falharam mesmo as renegociações? E o que aconteceu ali para os mesmos hospitais começarem a funcionar pior?

A questão da "escolha dos doentes" pelo sector privado é revista, bem como a "procura induzida". A maré de cesarianas que acontece no sector privado é mencionada e reprovada. 

O excesso de população médica é colocado em dúvida, por não se ter em conta os "médicos inactivos". O que importa, e por aí ficamos, é que não há falta de médicos em Portugal. Por outro lado, ao falar dos enfermeiros, dá atenção ao seu âmbito de competências ser em Portugal provavelmente mais restrito do que noutros países da Europa. A lógica dos custos aqui também subjacente...

Finalmente em nenhum momento a palavra "interior" é mencionada. E é o primeiro livro sobre saúde  em que não li a frase "o problema das urgências". 

A solução para quem escreve é "Além de melhorar a gestão dos recursos na prestação pública e na contratualização interna, requer-se capacidade do Estado para saber usar estratégias de contratualização com o setor privado." O Estado deve ser sobretudo um "contratador eficaz". 

Não vou dizer que discordo por completo. Até porque Miguel Gouveia chama Ernest Hemingway para nos explicar como se chega à falência (do SNS): "Gradualmente e, depois, de repente.". Que, como diria Salvador Martinha, "está a acontecer."


sexta-feira, 11 de agosto de 2023

Vinte e uma coisas sobre Milfontes.

1 - Milfontes deve ser a melhor porta para quem do mar chega ao Alentejo. Mas eu não tenho barco. A imponente foz do rio Mira tem a cobiçada água desejada pelas mil e uma estufas que ficam a montante. Onde nasce tanta água, tão secas estas terras?

2 - O castelo de Milfontes foi um antigo forte para defender estas terras dos piratas magrebinos. No Largo da Barbacã está um monumento aos pilotos Brito Paes e Sarmento Beires que voaram em 1924 daqui até Macau, pela primeira vez. O pequeno avião partiu dali perto, do Campo dos Coitos.

3 - O centro de Milfontes, Vila Nova assim chamada logo quando fundada no séc XV, é o Largo do Rossio. Onde um café do mesmo nome, misteriosamente, mantém lugares vagos ao jantar nas suas mesas, quando para os outros restaurantes abundam as filas. Mistério que nunca procurámos perceber.

4 - A praia da vila é a praia da Franquia, extensa qb, calmas as águas que são de rio. E limpas. Em frente está a paria das Furnas, para a qual se pode ir de barquinho. 

5 - Para bons pequenos almoços recomendo no Rossio o Laréu. Simpática casa com boa música, bom ambiente, boa comida e que tem a coragem de fechar às 19h e aos domingos!

6 - Ainda no Rosssio a Hamburgueria CáPraMim também fornece boa comida, almoços, boa música. Melhor porém jantar pois os rapazes do turno da noite têm outra dinâmica.

7 - Sim, em Milfontes abundam indianos e nepaleses, homens entre os 20 e os 45 anos que circulam preferencialmente em grupos de 2 ou 3, no intervalo dos seus trabalhos nas estufas. Falam ao telemóvel, vêem quem passa, olham para o rio, para o mar. Ocupam hoje também algum comércio, alguma restauração. A questão do outro aqui diluída pela babel das férias. O ano passado terá havido uma queixa de assédio registada na GNR, uma.

8 - Há mutos carros cheios de pó a circular em Milfontes. Serão das pessoas que vão à praia do Malhão. Fica um pouco a norte, é acessível por estrada de terra batida, e é bonita, como bonitas são todas as praias a norte ou a sul de Milfontes, sempre mais ou menos abrigadas por alguma falésia. Idem  Almograve, Porto Côvo, por ex. Sim, pusémos a canção a tocar..

9 - Havia um pessegueiro na ilha mas à distância não parece haver. A praia da ilha do Pessegueiro tem menos falésia e a presença da mencionada ilha em frente, ruínas de um pequeno forte a coroarem a dita.

10 - Em contraponto, em Milfontes não vi ciganos. Vi-os sim, a sofrer o vento, com as barracas montadas junto a parques de estacionamento a tentar vender toalhas, brinquedos, elas de preto tão vestidas num o calor exigente.

11 - O estacionamento em terra batida ali logo atrás do centro também não ajuda à higiente das viaturas. M as há sempre lugar.

12 - A ladear o referido estacionamento estão dois restaurantes, a Tasca do Celso, inabordável sem marcação, e a Manjedoura, este mais acessível porque presente no Fork. A Manjedoura já terá sido um espaço mítico na Milfontes de in illo tempore. Hoje a comida é da Tasca do Celso e da pizzaria Mano a Mano,de Lsboa, com capital da Herdade do Touril que é dali perto. Ao sábado à noite revive velhos tempos e faz-se discoteca. Demora a acontecer... era para ser às 23h.. pouco depois da meia-noite desistimos, ainda estavam  a arrastar mesas. 

13 - Mas claro que na Manjedoura come-se muito bem e se é muito bem recebido. A chefe de sala tem uma filha a ajudar que vai ser uma muito boa enfermeira.

14 - A norte fica Sines, um enclave de vila com zona alta, portinho, prainhas e castelo no meio de um porto de escala europeia de águas profundas. Não é fácil. A Casa do Médico de S. Rafael só faz descontos para a malta da Zona Sul? 

15 - Na entrada de Milfontes parecia haver um circo. Não. Sinal dos tempos, era uma daquelas coisas a mostrar dinossauros.

16 - No Meu Super pode usar-se o Cartão Continente. E na mesma rua há uma bomba Galp.

17- Toda a gente me recomendou o Pátio Alentejo para jantar. Não calhou encontrá-lo.

18 - Na zona hippie dos tererés e do artesanato  havia uns brincos que mudavam de côr conforme várias variáveis que ainda hoje não alcanço.

19 - Posto isto, a praia mais bonita destes territórios é Odeceixe, que administrativamente já é Algarve. É ver, meus senhores, é ver. Dias depois da nossa excursão um grande incêndio interrompeu a estrada por onde fomos e andou a queimar mato e eucaliptos em terras por onde passámos: Brejão, São Miguel, Baiona. 

20 - Ao longe, o esqueleto do Meo Sudoente (faltavam uns dias para) parecia a ruína de uma feira de diversões num ardente descampado..

21 - Em Milfontes também há mar. A norte a parte marítima da Praia do Farol, a sul a extensão oeste da Praia das Furnas. As duas partes da praia do Farol, a de rio e a de foz/mar, estão ligada por um caminho em lajedo que circunda a corcova rochosa onde está uma casa com um farolim apenso. Esse caminho de lajedo é mais ou menos acessível conforme as marés. . Lá em cima, olhando o mar, portugueses, indianos, ingleses, franceses, todos possivelmente estaríamos a pensar o mesmo, ou nada...