domingo, 24 de julho de 2022

Preto não é Branco, Branco não é Preto.

 As questões inclusivas têm andado numa roda-viva. Foi a piada do Ricardo Araújo Pereira. E foi o texto do José Pacheco Pereira (JPP), publicado no Público a 9/7 intitulado "Porque é que "todes" não é todos, nem todas?". 

Vamos agora ao texto do JPP. Sendo um dos comentaristas políticos que mais aprecio, só posso considerar terem nascido de alguma preguiça algumas partes do texto. 

Começa a coisa por fazer uma crítica da linguagem "inclusiva", nomeadamente dos neologismos que a mim também me atrapalham, nomeadamente o "todes". Mas rapidamente envereda por outros caminhos ao lamentar o expurgo de palavras como "preto", "paneleiro", etc., enquanto "branquela" "não é atingido pelo opróbrio." Ressalva que "são insultos homofóbicos ou racistas", mas discorda de se tentar uma língua "sanitariamente" purificada como sendo um tique ditatorial. 

JPP não repara que o insulto "preto" o é embora a palavra apenas enuncie uma cor de pele, o insulto "paneleiro" o é embora apenas se trate de um comportamento sexual hoje considerado normal. Pelo contrário, "filho da puta", ou "cabrão de merda" são insultos que aplicam à pessoa visada um estatuto de maldade acrescida, a que nível seja. "Branquela" não qualificará, pois hoje também na prática não se insulta ninguém ao chamar-lhe de "ricaço"... 

Portanto, é diferente.

Depois JPP insurge-se contra o famoso quadro de definições da campanha de publicidade da Fox Life, dentro da mesma lógica que eu já apliquei - definições são paredes... - mas caindo no ridículo de apelar à abstrusa definição de "Trans Espécies" - que na campanha da Fox Life não consta, para ridicularizar todas as outras definições.

JPP busca encontrar a sua identidade no meio das definições acima - como eu já fiz. Questiona e bem que um mundo inclusivo exclua um heterossexual de falar da homossexualidade, um branco de falar de um mundo negro (a história do colonialismo dada como ex.), assumindo isso como não saudável. Erra quando pergunta porque há uma "União Negra das Artes" e não se aceita uma "União Branca das Artes". 

É verdade que as questões da "apropriação" me parecem uma patetice - se eu quisesse escrever uma História da Índia, porque não, que gene mo impede? Quem sabe se eu não a saberia escrever bem? No entanto gostaria e muito de conhecer uma História das Colonizações escrita por africanos e negros. Lembro o clássico "As Cruzadas vistas pelos árabes" de Amin Maalouf, uma leitura edificante. 

O comentário sobre a "União Negra das Artes" parece-me completamente despropositado.  

JPP insurge-se contra uma linguagem que na realidade não é tão inclusiva quanto isso. E sofre pela superioridade moral aparentemente anexa a esta nova linguagem. A História vive de fluxos e refluxos. Antes a superioridade moral era a nossa, José. Vamos ter calma. 

Só uma última nota, e voltando à Fox Life: "Aliada: Pessoa não-LGBTI+ que defende os direitos LGBTI+, apoiando a causa e/ou promovendo activamente a iguladade e não discriminação." Lembra-me a Avenida dos Aliados. Que assim foi denominada em homenagem aos Aliados da 1ª Grande Guerra. Mas que eu saiba guerra só há na Ucrânia, no Iémen, na Síria... em Portugal vivemos em paz.

sexta-feira, 22 de julho de 2022

Eu, heterogeneral, me confesso.


Era uma piada fácil. E o Ricardo Araújo Pereira, apesar de tudo, ainda é um... Gato Fedorento. Ele sabia que a piada do "homogeneral" aplicada desde o seu confortável gabinete no jornal Expresso ia ter repercussões. E teve. E das boas.

Na realidade, se na famosa campanha da Fox nunca se fala de sexo mas sim de género, actualizam-se as definições sem actualizar as palavras. A campanha em questão parece-me muito importante, e tem uma função que está para além da informação prestada. Definições são uma dezenas. Definição de "heteronormatividade": "Processo social e institucionalizado de que a norma é a heterossexualidade, ignorando e alheando a diversidade de orientações sexuais, identidades, expressões de género e características sexuais existentes na sociedade.". Parecem-me definições (que são paredes) a mais. 

É muito difícil hoje em dia pertencer a uma maioria. Se eu fosse militante do PS, para não ir mais longe, hoje viveria confuso e sofrido com o governo que temos. Lembro-me de ter - bem cedo - conversado com a minha filha sobre algo parecido com o assunto em questão. Num mundo ideal uma pessoa - e assim me considero, uma pessoa, uma coisa vivente indivídual, felizmente única (um erro nunca é para repetir) - poderá apaixonar-se por quem quiser, homem ou mulher. E porque não? Risos, expressões, conversas, não é isso que chama, que acende? E não está tudo isto espalhado pelos vários lados da questão em questão?

No mundo real não é bem assim. E nisto só por mim posso e vou falar. Como médico sei que sou um ser vivo. Mais um, um entre muitos à superfície de um planeta oh, tão em crise! Como os restantes tenho em mim mecanismos de reprodução cujo objectivo é, através de mim, manter a minha espécie viva. A estes mecanismos chama-se sexo (o aparelho reprodutor não chega, é preciso querer usá-lo com) . Se quisermos utilizar uma metáfora informática, isto é um programa. Manter a espécie viva precisa da "heteronormatividade" acima mencionada. Portanto o processo referido, antes de ser social ou institucional é biológico. Ou seja, não falamos de uma norma mas sim de uma necessidade. Não minha, não da sociedade. Da espécie. O amor veio dar capa de livro ao que as leoas e os leões fazem entre eles. E os louva-a-deus, sabendo nós como acabam. O fogo que "arde sem se ver" veio cozinhar e optimizar para o palato aquilo que cru é apenas um desiderato darwiniano. Devemos assim dar Graças a Deus pela poesia fantástica que é o Amor, o Maior dos disfarces. 

No meu mundo real eu sou definitivamente heterossexual. Ou como o RAP diz, "heterogeneral". Estou assim feito. Não me sinto nem particularmente bem nem mal por isso. Há coisas em mim que gosto, muitas que não mesmo. Estas questões são das menos questionadas em mim. Sei que não tive educação nem sexual nem para a cidadania. Sei que a minha adolescência foi irrepetível de tão complicada. Mas aconteceu assim e assim estou eu agora feito e acontecido. Como a calvície.

Eu sei que o Amor pode ultrapassar ciclos de vida, gerações, idades correctas e incorrectas, eu sei. Que nos lares acontece e nas prisões mais solitárias da nossa realidade virtual, nada tendo a ver com aquilo que disse antes. Mas onde começou tudo? 

Vivemos os tempos mais inclusivos da História. Vivemos. O humor do RAP é, entre milhões de outras coisas, algo que nos diferencia "dos animais". Não todos os cambiantes de género e sexo e interacção humana íntima e menos íntima que podem acontecer, que estão descritos em outras espécies animais. O melhor de mim é se tu sorrires, se o teu olhar se iluminar como antigamente, se eu ouvir o teu riso aberto. O resto de que não falei falando também é muito bom. Mas rir é o melhor que há, ponto.        

As perseguições foram muitas e ainda as há. O mundo é ainda perigoso lá fora e não sei se não vai ficar a ser mais. Foi sempre a diferença. E sempre será. Se eu o beijar em público é diferente de eu a beijar em público. Mas não vamos agregar demasiado as coisas. Para não ir mais longe, esta terrível e imperfeita Europa Ocidental em que vivemos é, sem qualquer margem de dúvida, o mais inclusivo canto do Planeta Terra. É assim tão simples? Não é. Mas não podemos rir nem um pouco com o  assunto?

Há muitos anos respondi a um questionário qualquer numa revista qualquer. Resulta que eu era 67% homem, 33% mulher. 

Olhem, um Abraço Amigo e Risonho deste que se assina 100% Guilherme.


PS.: eu sei: branco, homem, "heterogeneral", europeu ocidental, nascido numa mui pobre ex-potência colonial, profissional "liberal" mas só a trabalhar na função pública, eu sei que carrego a culpa MÁXIMA. Mas na realidade eu sou, como todos, a mais pequena das minorias. Sou eu.  E carrego apenas e só a minha história. Já é peso suficiente.



sábado, 16 de julho de 2022

O problema chamado Pedro Marques Lopes.

 Ontem ia a conduzir para Ovar e pus-me a ouvir o Bloco Central. Aguentei apenas dez minutos. 

Nos últimos dez anos Pedro Marques Lopes tornou-se uma presença notada na televisão e na rádio. Onde está fala e fala e fala, habitualmente mais do que os restantes, criando as suas verdades e partilhando-as com o mundo, porque verdades são. O Pedro Marques Lopes é a versão 2.0, melhor, a versão 5 G do protuguês quer diz "eu disso não percebo nada MAS...". Eu não percebo a antena que o Pedro Marques Lopes tem. Mas tem.

E em que consistiram esses dez minutos de estupor: 

Primeiro Pedro Marques Lopes (PML) confessou que até ele também tinha um "terrenito que está sujo" e que assim está "porque não compensa". Portanto não se limpa porque a multa é mais barata e que se foda se o meu incêndio vai para o teu limpo terreno logo ali ao lado porque o meu "está sujo". Não se podia agravar a multa por ostentação e vanglória?

Depois PML sentenciou que definitivamente o problema não estava no eucalipto, "26% da nossa floresta", mas sim nos matos abandonados, porque "os eucaliptais são explorados comercialmente e estão limpos". O meu caminho para Ovar, a conselho do Google Maps, foi via CREP. A maior parte dos eucaliptais que eu vi pelo caminho não estão limpos do coberto baixo. Não estão. Como vi ontem isso também ao fazer a A 25. O eucaliptal está muito jovem, plantado sobre fogos recentes, muito junto, e cobre teimosamente encostas íngremes onde limpar é uma quase impossibilidade. Mas replantar não o foi. Perto de Ovar o eucaliptal, pouco cuidado porque "expontâneo" tem a agravante - que é frequente na região centro - de estar suplementado com uma verdadeira floresta de mimosas/austrálias, planta exógena ainda mais difícil de extirpar, sem qualquer valor económico, e que rapidamente ganha corpo arbóreo. Mas eu não ando pelas mesmas estradas que o PML frequenta...

Finalmente PML decidiu duvidar do profissionalismo dos nossos bombeiros. Eu quase nasci entre bombeiros. O meu pai pertenceu aos corpos dirigentes dos BV de Ovar muitos anos. Tive tios bombeiros. Assisti a homens estropiados pelo fogo receberem medalhas e louvores com a orgulhosa família a assistir. Homens que o meu pai tratava por tu. Sei que os bombeiros de hoje não são os de ontem. A expressão "bombeiros voluntários" é assassina. Admito que o meu tio António para há setenta anos ter querido ser bombeiro bastou-lhe querer ser. Hoje um bombeiro voluntário só o é depois de umas centenas de horas de formação. Em Portugal haverá menos de 30000 voluntários - o número está compreeensivelmente a descer. Os profissionais não chegam a dez mil, creio. Não tenho ouvido falar este ano sobre problemas no diálogo entre os bombeiros, a protecção civil, etc. Quarta-feira em Elvas estavam 42º às 20h, hora de jantar. Os bombeiros estão a fazer, parece-me um óptimo trabalho. Quando se enganam às vezes pagam com a vida.

Pedro Marques Lopes, faz-me um favor, eu percebo que para ti não é fácil, advogado de nada e gestor apenas de ti próprio:


CALA-TE! CALA-TE! CALA-TE! CALA-TE!



CALA-TE!