domingo, 26 de junho de 2022
O Sul da Ucrânia, sua História, Presente e (eventual) Futuro.
quinta-feira, 23 de junho de 2022
As Minhas 101 Leituras: 41-50.
Garden Party, O - Katherine Mansfield
Li esta colecção de contos há muito, muito tempo. E já então fui atingido pelo seu discreto desacerto em relação às narrativas habituais a que eu então estava habituado. Nascida na Nova Zelândia e viajando para a Inglaterra c om 19 anos, em 1907, conheceu e foi reconhecida pelo Modernismo Inglês. Faleceu vítima de tuberculose em 1923. A sua vida foi uma eterna corrida à procura de alguma coisa. Uma melancolia e uma inquietação, a proucura, permeiam a sua escrita.
"- Tu não estás... Desculpa ter-te contado, John, querido. Ficaste triste? Não estragou a nossa noite... O bocadinho que tínhamos para estarmos um com o outro? / Ao ouvir isto, contudo, ele teve de esconder a cara. Pôs a cabeça no peito dela e envolveu-a com os braços. / A noite estragada! O bocadinho para estarem a sós estragado! Nunca mais iriam estar a sós um com o outro."
Gaspar, Belchir & Baltasar - Michel Tournier.
O nome Michel Tournier há muito tempo que me persegue. Sobretudo desde que li algures no século passado o mesmo ser rotulado de "o maior escritor católico vivo". Engtretanto morreu em 2016. Não lhe conheço as obras mais conhecidas. Algumas coisas que li surpreenderam-me pelo vício. O romance de que aqui falo é uma versão da história dos reis mago em que a narração do apelo em cada um deles a seguir a estrela e ir encontrar o Salvador é superior. Mas há um quarto rei mago, um quarto apelo, cujo encontro com o Salvador é atrasado por variadíssimas peripécias, atrasado precisamente trinta e três anos... e aqui está a mensagem Maior. Brilhante!
"A sala estava vazia. Uma vez mais chegara demasiado tarde. Tinha-se comido naquela mesa. Havia ainda treze recipientes, uma espécie de malgas pouco profundas, muito largas, munidas de um pé baixo e de duas pequenas asas. Em alguns deles, um fundo de vinho tinto. Em cima da mesa viam-se fragmentos de pão ázimo que os Judeus comiam nesta noite recordando a saída dos seus pais do Egipto."
Harrison Principles of Internal Medicine, 11th Edition - Braunwald et al.
Com este livro fiz o exame de acesso à Especialidade em 1990. Só o li uma vez, mais propriamente os capítulos indicados. Depois fiz resumos, resumos de resumos, resumos de resumos de resumos, etc. Foram meses muito difíceis pelo exame, por outras coisas. Fêz-se e entrei na Especialidade que quis: Medicina Interna. Quando escolhi fui um dos miúdos mais populares do Curso de 82-88..
Ilha de Próspero, A - Rui Knopfli
Rui Knopfli pertenceu à fantástica geração de escritores e poetas que Moçambique criou nas décadas qiue antecederam a independência. Nascido em Inhambane em 1932, foi delegado de propaganda médica e opositor ao regime. Saindo de Moçambique desencantado em 1975, "exilou-se" como conselheiro de imprensa da embaixada de Portugal em Londres onde viveu até 1997, quando morreu. O livro de que falo é dedicado à Ilha de Moçambique, poemas e fotos, ambos de Rui Knopfli. A primeira versão do livrinho surgiu em 1972, muito próximo do 25 de Abril, e o maior elogio veio de José Craveirinha. Claro que há um enorme fascínio pela criação da Ilha-Colónia Portuguesa, mas há também atenção demorada sobre tudo o resto, incluindo a Ilha que não é feita de pedra e cal, a Outra Ilha. Falamos de algo que é Património da Humanidade. O seu melhor retrato reside aqui.
"(...) Por isso dizia: "- Não negoceio. / Resisto." E saía ao postigo da praia / percorrendo S.Gabriel em surtidas céleres / de que o ruivo holandês expiava o tributo // conhecendo-lhe o golpe certeiro do montante. / O seu saldou-o em olvido, malária e cicatrizes. / E o português que era D. Estêvão de Ataíde / nasce na morte moçambicano."
Incal, O - Moebius & Jodorowsky
Segui esta saga de BD na revista (A SUIVRE). Sobretudo pela fantástica limpeza do desenho, embora também a saga criada por Jodrowsky, um não admirável mundo novo, tivesse a sua piada. Moebius é a versão "linha-clara futurista" do desenhador Jean Giraud, conhecido com este nome como autor da saga Blueberry. A saga é constituida por seis volumes. O herói é um detective do futuro, John Difool e tudo começa quando ele, em fuga, se atira de um prédio abaixo. Não morre, claro, senão não havia saga...
Justine - Lawrence Durrell
É um dos meus pecados, nunca ter lido todo o Quarteto de Alexandria. Mas este primeiro volume, de Lawrence Durrell, cuja lenta história gira à volta de uma mulher, Justine, e de uma cidade, Alexandria, prende pelos múltiplos jogos de espelhos construídos por palavras que nos escondem e apresentam os vários personagens. Para cada um deles sucedem-se retratos sobre retratos, que se contradizem, completam, ressaltam, iluminam, e isto não termina aqui. A minha preguiça esbarrou nas duas vezes em que não terminei "Balthazar", que exponencia o que acontece em "Justine". Não interessa. Justine é uma das "mulheres-escritas" da minha vida. Neste momento é um livro que eu não consigo encontrar. Sinto-me incompleto. Estará em Ovar? E esta hipótese levanta-me a questão maior de todas, o que representa Ovar para mim.
Le Grand Guide du Yémen - Ed. Gallimard (trad. Insight Guide)
Este livro foi comprado por mim vai para muito tempo. Já então comprava livros de viagens, ou guias de viagens que sabia não ir fazer, estarem para lá do meu âmbito de possibilidades. O Iémen vivia então um pequeno intervalo de relativa paz. Um país, umas gentes, lindíssimas, uma civilização antiga, arquitectura única. Mais de metade das fotografias deste livro, com a Guerra Civil que entretanto está a acontecer, terão desaparecido, estarão irremediavelmente alteradas. Incluindo as pessoas, que envelheceram, morreram ou forma mortas.
Líricas Portuguesasa (3ª série) - organiz Jorge de Sena
Este livro está esgotado. Consultei-o pormenorizadamente pedindo-o emprestado à Biblioteca Gulbenkian da Câmara Municipal de Ovar. É uma antologia e abrange os anos (de nascimento dos poetas) de 1909 até 1929. Cada texto escrito por Jorge de Sena sobre cada um dos poetas apresentados é na realidade um pequeno ensaio, e algumas das coisas que ele escreveu ainda reverberam nu mundo da poesia portuguesa. Alguns dos poetas antologiados estão hoje esquecidos, Fernda Botelho, Alexandre Pinheiro Torres, o recém falecido João Rui de Sousa. É tempo de republicar este livro.
Livro de Português do 9º Ano?
Não me lembro de nas aulas os seus poemas terem sido objecto de discussão, mas foi neste livro que li Herberto Helder pela primeira vez.
Lótus Azul, O - Hergé
Um conhecido meu de há muitos anos falou de "O Lótus Azul" como "A definição do que é uma amizade". Era um exagerado. Uma imagem deste Tintin viajou numa mochila minha alguns anos. É indiscutivelmente o primeiro grande álbum do Tintin de Hergé. Tem algumas das pranchas icónicas de Tintin. É um prazer sempre revisitá-lo mais a sua inimitável "linha-clara". Num inquérito do Le Monde feito em 1999 esta banda desenhada foi considerada o 18º livro mais importante do séc. XX, n uma escolha de 100. "O Lótus Azul" é um ponto de viragem no desenho e no texto de Hergé. Fala-se da infljuência da Arte Chinesa no despojamento do desenho. E pela primeira vez a história contada faz justiça ao Outro, completamente ao contrário das aberrações de "Tintin no Congo". A obra saiu em 1935, a versão colorida em 1946. Quando falam em obra-prima há quem se refira até mais à versão a preto-e-brano, onde ressalta a qualidade do desenho.
sexta-feira, 17 de junho de 2022
A Cuca.
segunda-feira, 13 de junho de 2022
Mais Médicos.
Ora vinha eu ontem todo contente auto-estrada abaixo depois de celebrar o Santo António em Braga quando ouvi a escritora Alexandra Leitão, ex-Ministra da Modernização e etc., falar no programa “O Princípio da Incerteza” na TSF sobre as confusões recentes das Urgências de Obstetrícia. Confusões que aliás resultaram num óbito. Segundo a escritora em questão a questão resolvia-se com simplicidade: mais médicos. Era preciso haver MAIS MÉDICOS, a formação devia ser acelerada, aliás já um tal de ministro Heitor tinha tentado isso mas motivos confessáveis e inconfessáveis tinham levado a que as Faculdades de Medicina não obedecessem, portanto MAIS MÉDICOS. E assim terminou o programa, sem contraditório.
Eu chamo-lhe escritora porque, entre outros livros, a ex-ministra de António Costa deu à publicação em 2011 o livro "Contratos Interadministrativos". Deve ser desta escrita que Alexandra Leitão retirou a sábia máxima: "Não creio que alguma vez a administração pública possa pagar aos médicos o que a privada lhes paga, logo... façam-se MAIS MÉDICOS!"
O Partido Socialista não quer nem precisa portanto que no Serviço Nacional de Saúde estejam os melhores. Basta que estejam uns quantos, uns quaisquer, o chamado quanto baste, e porque estamos em Portugal aplica-se assim a lógica de que para o Português "bacalhau basta", é só preciso pedir às cantinas das Faculdades de Medicina um esforçozinho e que cozinhem mais, mais, mais, como dizia antigamente o Herman, que é "para o povo"!.
Já agora no livro "Contratos Interadministrativos" deve lá vir explicado numa página que a escritora Alexandra Leitão já deve ter esquecido que nas especialidades cirúrigicss não se trabalha habitualmente "para a privada", trabalha-se independentemente com um convénio com um local privado de exercício da profissão em questão, tendo-se o sucesso que o mercado permite.
Portugal tem o terceiro maior ratio de médicos por habitante já nem sei se é da União Europeia ou da OCDE. Nesta coisa dos obstetras nem se coloca aquela coisa da distribuição e do interior, as crises aconteceram em Loures, em Almada, em Braga, para além das Caldas.
Com certeza isto tudo acontece porque os contratos são aliciantes e as horas do serviço de urgência demasiado bem pagas!
Mas porque um governo se preocupa sempre com todas as bocas que há para alimentar eu percebo, eu entendo este frenesi do MAIS MÉDICOS. Duas bocas há para alimentar, o SNS e a medicina privada. Quantos MAIS MÉDICOS houver mais barata vai ser a comida... para os dois estômagos em questão.
Voltando à Síria: a oeste de Aleppo. Lembrando que a Guerra Civil da Síria ainda não acabou.
segunda-feira, 6 de junho de 2022
Voltando à Siria: a leste de Aleppo.
Quando me dediquei a estudar Aleppo, a propósito do general das forças russas a comandar o esforço russo agora no Donbas e que tinha sido comandante antes na Síria, percebi que, ao contrário da sensação que perpassa da ausência de notícias, a Guerra Civil na Síria ainda não acabou. O norte da Síria nomeadamente é ainda uma manta de retalhos onde esporadicamente ainda acontecem combates. Não esquecendo que o Exército Islâmico ainda existe e, de vez em quando, ataca.
Decidi então dedicar a minha atenção ao norte da Síria a leste de Aleppo. A cidade mais importante a leste de Aleppo é Raqqa. Raqqa é uma cidade predominantemente árabe. Tem uma longa história com origens helenísticas e depois bizantinas. Chegou temporariamente a ser cabeça de califado com os Abássidas no séc. VIII-IX, no fim do califado de Harun al-Rashid. A expansão da cidade no séc XX quase obliterou os restos deste passado glorioso.
Raqqa voltou a entrar na história internacional quando, na sequência da Guerra Civil Síria, foi tomada pelas forças oposicionistas sírias em 2013, nomeadamente por forças com inspiração mais integrista. A Síria dos Assad sempre fôra um estado secular. Em Raqqa em 2013 foi instituido o primeiro tribunal da Sharia em território sírio. As coisas pioraram ainda mais quando em 2014 Raqqa foi conquistada pelo Exército Islâmico. Durante 3 anos Raqqa foi a capital do Califado Islâmico do Levante. Seria tema para outro escrito o que sofreu Raqqa durante estes três anos.
Raqqa foi libertada em 2017 pelas Forças Democráticas Sírias, constituidas sobretudo por curdos, curdos que tinha resistido heroicamente estes anos todos ao Exército Islâmico (EI) e que, com o apoio aéreo americano estavam a reconquistar terreno ao EI. Raqqa não é uma cidade predominantemente curda. Raqqa foi quase completamente destruída ao ser libertada. Portanto, deste 2017 pertence à Autoridade Autónoma do Norte e Este da Síria (AANES), que é uma entidade dominada pelas forças curdas. Vamos perceber como têm acontecido estes últimos cinco anos em Raqqa e, sobretudo, no resto do Nordeste Sírio.
Antes do mais Raqqa tem vindo lentamente a ser reconstruída. Lentamente. Bombardear é sempre bem mais fácil do que reconstruir. Várias ONG's declararam preto no branco que os ataques aéreos contra Raqqa, conduzidos pelos Estados Unidos, pelo Reino Unido e pela França tinham causados centenas e centenas de vítimas civis. E destruído a cidade quase toda. Sendo o Estado Islâmico uma força combatente que pouco se distinguiria do povo de Raqqa, poderia ter sido diferente?
Raqqa foi reconquistada pelas Forças Democráticas da Síria (FDS). O grosso destas forças é constituído pelas Forças de Protecção Popular (FPP ou YPG), o braço armado do Comité Supremo Curdo, formado em 2012 pela fusão de 2 partidos curdos sírios. As FPP tiveram uma participação reactiva na Guerra Civil Síria. Quando grupo fundamentalistas atacaram povoações curdas defenderam-se. Ficaram conhecidas internacionalmente por aguentarem o cerco de Kobani pelo Exército Islâmico, com o apoio aéreo americano. Depois, lentamente, foram conquistando terreno ao EI, ocupando progressivamente terras para leste e para oeste, para leste até à fronteira com o Iraque, a oeste coroando pelo norte Aleppo. A AANES acabou por ocupar praticamente todo o nordeste da Síria e desarticulara o Califado Islâmico - obtendo assim o reconhecimento americano. Nestes terrenos havia curdos mas também árabes, e ainda assírios, turcomanos, arménios, circassianos...
Este território começou a ser conhecido internacionalmente como "Rojava", que é a palavra curda para "ocidente", de Curdistão ocidental. E ganhou alguma popularidade por razões que iremos de seguida explorar. Pelo contrário, este território semi-autónomo de predomínio curdo no norte da Síria foi encarado como um inimigo pelo governo Turco, que várias vezes invadiu território Sírio para criar aquilo que os turcos chamavam "corredores de segurança", invasões cujos nomes (por ex., "Ramo de Oliveira") não condiziam com a atitude de destruição e terror praticada no terreno.
Quase metade da população curda vive na Turquia, sobretudo no seu sudeste. Desde os anos 80 que o Partido dos Trabalhadores do Curdistão, ou PKK, promove uma guerra de guerrilha contra o Estado Turco. A sua ideologia era de início marxista-leninista. O seu líder, Abdullah Öcalan, foi preso pela Turquia com a ajuda da CIA em 1999. Foi julgado e condenado a prisão perpétua. Durante 10 anos foi o único preso na ilha prisão de Imrali. Estando preso, Öcalan manteve muita actividade política, evoluindo progressivamente para uma atitude menos beligerante e procurando repetidas vezes negociações de paz. Por outro lado a sua ideologia abandonou o marxismo-leninismo e enveredou pelos caminhos de uma certa esquerda alternativa, defendendo uma espécie de democracia directa a que chamou "confederalismo democrático", promovendo a defesa de todas as minorias, das mulheres e defendendo inclusivé uma economia mais ecológica!
O que um prisioneiro escreve só ganhará importância quando alguém lhe prestar atenção. No caso de Öcalan, apesar desta sua nova moderação, o PKK continuou a ser considerado uma organização terrorista pela União Europeia, pelos Estados Unidos. O PKK nos anos 80 e 90 tivera as suas bases na Síria. Quando em 2014-2015 começaram a aparecer nos media ocidentais as primeiras reportagens sobre Rojava e as suas particularidades a confusão instalou-se. Que particularidades?
Nos territórios da AANES, criou-se um modelo de comunalismo e de poder descentralizado, a forma de um poder curdo melhor lidar com populações que frequentemente não eram curdas. Rojava foi dividida em três e depois sete regiões. Cada uma destas tem o seu governo eleito. Rojava tornou-se cedo conhecida pela sua milícia armada feminina. Mas depois tornou-se também conhecido que os direitos das mulheres, nomeadamente a igualdade da sua palavra como testemunho, etc., foram reconhecidos em lei. Algumas das regiões inclusivé chegaram a ter um governador homem e uma governadora mulher. Cada região fazia um esforço máximo para dar representação a todas as minorias e religiões. Em algumas regiões portanto a igualdade das mulheres não foi completamente adoptada... porque o povo não concordava! Ó ensino foi reformado para acontecer nas línguas-mãe dos territórios em questão: árabe, curdo, assírio, turco, optando muitas escolas por serem bilingues. Por outro lado na reconstrução da economia da região algumas opções "ecológicas" foram tomadas, criando-se uma nova agricultura mais sustentável. O nordeste da Síria era o celeiro de trigo do país. Tentou-se diversificar as produções. Donde vinham todas estas originalidades? Os retratos pendurados nas paredes por aqui e por ali não desmentiam: de Öcalan. O terrorista preso numa ilha na Turquia inspirava a governação de uma frágil ilha de diferença - Rojava - que emergia da mais brutal das guerras civis.
Rojava é objecto de estudo internacional. Publicam-se artigos sobre artigos, fazem-se congressos e simpósios, acredito até que haverá doutoramentos sobre Rojava. Mas "dos que importam" ninguém gosta de Rojava. A liderança síria da oposição no exílio critica a Rojava o "separatismo" e o ter criado uma "Constituição" própria antes de se ter acordado uma nova Constituição para a Síria. Os Curdos do Iraque, cujo sistema de governo não tem nada a ver com o de Rojava, não são muito solidários com os seus irmãos sírios. O Estado Turco tem um ódio visceral por Rojava e já atacou os seus territórios várias vezes. Donald Trump esqueceu-se do papel da AANES na derrota do EI e em 2019 decidiu unilateralmente retirar a presença americana no terreno, levando imediatamente a um ataque turco. Depois voltou atrás, tarde demais. Mesmo o PKK não tem relações lineares com a AANES, criticando a sua aliança estratégica com os americanos (se esquecermos o episódio Trump). A autonomia de Rojava só é reconhecida oficialmente... pelo Parlamento Catalão!
Rojava tem sido criticada também por algumas ONG's que dizem que Rojava não é o apregoado paraíso na terra. Que ainda há demasiada preponderância curda nos comandos de decisão. Que a democracia de base não substitui a democracia mais acima. Que o culto de personalidade em torno de Öcalan preocupa. Que a liberdade de imprensa não é a ideal. Que aqui e ali algumas minorias foram violentamente atacadas. Mas não há nenhuma ONG que não faça a ressalva de dizer que "não se compara com o terror que acontece no resto da Síria...."
As incursões turcas levaram a que a AANES contractualizasse com o Exército Sírio a presença deste em edifícios e quartéis-chave em várias povoações fronteiriças, de forma a que os turcos ao atacar não quisessem atacar... o Exército Sírio. Isto sem qualquer interferência de novo na autonomia de facto de Rojava. A AANES aliás aboliu oficialmente a palavra "Rojava" da denominação oficial da região (ou federação de regiões...) de modo a que a imagem "curda" ficasse diluída. O pendor ecológico de Rojava perde-se um pouco devido à sua independência económica depender e muito dos poços de petróleo que existem a leste. O petróleo, a electricidade produzida no Eufrates e o reviver da agricultura garantem portanto o sobreviver deste quase-estado, que de apoios externos apenas recebe algumas migalhas dos Estados Unidos.
A leste de Aleppo, incluindo martirizada cidade de Raqqa, acontece um quase-estado, uma experiência estranha de auto-governo em terras muçulmanas. Até quando durará...