domingo, 30 de agosto de 2015

Havemos de ir a Viana.

"Ciganos verdes ciganos
Deixai-me com esta crença
Os pecados têm vinte anos
Os remorsos têm oitenta"

Pedro Homem de Mello foi outro dos grandes poetas que Amália Rodrigues cantou. "Havemos de ir a Viana" é um dos fados mais conhecidos. Mas talvez quem ouça o fado-canção não repare bem na paixão, no repente que o poema tem. Pedro Homem de Mello nasceu e morreu no Porto mas foi um minhoto pelo coração, vivendo em Afife. "Havemos de ir a Viana" é um fado rápido e que não deixa respirar o ouvido, entregando Amália a mensagem em cascata e poder de voz sem parar até que acaba - e fica a pairar. Só no fim pensamos. Porque antes - ao cantar uma paixão - não era o momento.

"Partamos de flor ao peito
Que o amor é como o vento
Quem pára perde-lhe o jeito
E morre a todo o momento"


sábado, 29 de agosto de 2015

Pequenas e grandes crises.

Estive na Grécia seis dias. Em Atenas, mais precisamente. Não me apercebi de nenhuma crise. 

Sempre tive muita curiosidade em visitar a Síria - Damasco, Aleppo - mas é impossível. Na guerra “civil” Síria – se-lo-á? – já morreram mais de 200000 pessoas, 1% da população total do país. 15% da população síria já não está na Síria: fugiu.  

Gostaria também de visitar a costa africana do Mar Vermelho na parte sul, mas a Eritreia parece-me um país a evitar. 

Dito isto, gostaria de dar os meus parabéns à Grécia. Receberam-me bem. Têm uma capital que é muito bonita, acolhedora, singular, enorme em história e em dimensão simbólica. Não me apercebi de nenhuma “depressão colectiva”, como, por ex., há em Portugal. Em nenhum momento tive medo. Ninguém me pediu nenhuma opinião sobre a crise. Também não me esforcei por dar “conselhos” a ninguém. Senti-me entre iguais.  
Havia um número razoável de lojas fechadas – como em Portugal há. O PIB per capita grego está neste momento nivelado pelo nosso - o PIB per capita eritreu é 40 vezes inferior. Acresce que os gregos têm um orgulho natural em serem o que são. Sobra-lhes história e sofrimento em partes iguais. São, repito, únicos. O patriotismo, palavra bonita que nada tem a ver com a palavra “nacionalismo”, não “renasceu” no Euro 2004, que eles, discretamente, nos ganharam. Já lá estava. Os gregos, resumindo e concluindo, parecem-me um povo fixe. Que estará a viver uma crise de dívida pública fenomenal, provocada por várias razões mas que, com tempo, se irá resolver. Estes anos transformaram a sua classe política de uma das mais corruptas e atrasadas da Europa numa classe política nova, interessante. E interessada como poucas na Europa em diminuir as desigualdades e as impunidades em que o país é fértil, como o nosso mas sem a classe política. O desemprego enorme, do qual eu pouco me terei apercebido obviamente porque saí pouco do circuito turístico, a sazonalidade ajudou, etc., está, aqui como em Portugal, a aguentar-se com a emigração e a solidariedade familiar, também aqui muito forte. Nota-se que alguns carros precisariam de uma demão de pintura, algumas paredes uma limpeza dos grafittis, como em Portugal. Bah, sim, é uma pequena crise. Grandes, grande, são as outras! 

E, posto isto, e faltando-me falar apenas do dia seis das férias, excluindo esse post não irei falar mais da Grécia por uns tempos

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Roma dia 3.

O terceiro dia em Roma tinha que ser planeado de forma a contemplar uma viagem para Atenas a coincidir com a hora do jantar. Roma fica mais perto de Atenas do que do Porto. A viagem não duraria duas horas. 
Saímos - depois de pagar e nos guardarem as malas para fazer um loop que começava em direcção a... sul, acho, e depois apanharia todos os musts que faltava fazer. A primeira atracção visitada foi o Teatro Marcelo, um teatro romano com construção mais recente sobreposta, edifício pouco citado nos musts de Roma. Eis que Roma tem... monumentos a mais. Depois rodámos sentido Capitólio, subimos a escadaria Cordonata, desenhada por Michelangelo, admirámos a simetria da praça, sofremos o calor que já por essa hora "batia". Por ali nos despedimos doFórum Romano e começámos a cruzar para fazer "visto" na Fonte de Trevi - em obras, portanto, "invisível", a Praça de Espanha, o terço à sombra da escadaria completamente ocupada por povo sentado, a igreja no top em restauro, patrocínio Bulgari. Desisti de subirmos aos jardins de Pinzio. Fomos até á Piazza del Popolo - continuava o castigo do sol, e finalmente voltámos para trás pelo rio até Trastevere, onde descansámos.

Faltava uma hora para a hora de pedir um táxi, apreceu-nos pela frente a Sinagoga de Roma. Entrámos. A mesma só era visitável em conjunto com o Museu Judaico. Recebemos uns audio-guias que, ao fim de meia-hora ainda não dominávamos. Entrámos na Sinagoga. Outra religião é, efectivamente outra arquitectura. Das paredes ao Mundo. Pelo meio de um ambiente de visita... algo tenso, nem percebi bem porquê, conseguios entrever a realidade de um gueto que o papado promovia, um gueto não é um bairro estreitinho, é uma prisão com casas dentro. O gueto de Roma tinha antigamente cinco sinagogas para os diferentes ritos das diferentes comunidades. Como só havia autorização para construir de raíz uma, fizeram as cinco literalmente em cima umas das outras. As portas do gueto eram fechadas durante a noite. A pobreza no seu interior era a regra. Encostado ao rio, as inundações eram frequentes. Instituido em 1555, só foi abolido - e abertas as portas - em 1870, quando da Unificação Italiana.

Quando saímos da Sinagoga chovia. O calor tinha cedido um pouco. Roma não merece voltar a ser visitada no verão, nem pensar.  Isto aprendemos. 

O taxista que nos levou para Ciampino era falador. Devia ser um bom romano, porque passou metade da viagem a falar mal dos romanos. 

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Armando Silva Carvalho - "A Sombra do Mar"

Armando Silva Carvalho, d.n. 1938, é outro grande poeta português. Começou a publicar em 1965. Agora que a idade já pesa, a sua grande capacidade de escárnio e mal dizer - o primeiro livro chamava-se "Lírica Consumível" - desceu um degrau. Em 2008 escreveu um livro notável que dava pelo nome "O Amante Japonês". Os menos atentos não reparariam que o livro falava de um carro.

O mês passado saiu "A Sombra do Mar". O livro começa como o dia começa, cada poema para um momento: o acordar, o espelho, o banho, a toalha do mesmo, o pequeno almoço. Depois o poeta vai para a rua e os poemas encetam a deriva dos temas que o "lá fora" oferece. 

Este livro, aberto hoje, parece-me muito bom. Perderei essa impressão quando houver mais leitura?

O último poema:

"Mar e Luar



Banhados pelo luar, o mar e os rochedos transfiguram-se,
as naus e os corvos duplicam-se em fantasmas,
coroadas figuras de espessa imaginação
são matéria viva.

Mas quem não vê a água despeja para os fundos
a multidão dos dias, o grosso das viagens que o corpo imaginou em outros corpos, perdidas,
quase iniciáticas, com direito à fome e ao baraço
público.

A música dos séculos repercute nas rochas,
ligaduras de som agarram a cabeça às massas duras
do tempo, há translações de milénios
nestes estratos, ardidas cidadelas da memória
traduzidas nas grutas.

Quem aborda, incauto, esta paisagem deve precaver-se.
Vertigens na garganta, guelras de batráquio,
a alma enrodilhada no sal, bárbaro o coração,
o corpo essa estéril mania.


                                                                         
                                                                            Peniche, Março de 2015".

domingo, 23 de agosto de 2015

Atenas dia 3.




O terceiro dia em Atenas foi parco em emoções, que não em calor que continuou sendo muito. A Ágora de Atenas é o equivalente ao Fórum de Roma. Em paralelo à sua maior antiguidade e à maior devastação que Atenas sofreu no seu património, tem menos que ver. O calor também não deixou que nos alargássemos demasiado. Começámos logo pelo top: o Templo de Hefesto. Mais abaixo está a reconstrução da Estoa de Átalo, que era uma espécie de galeria comercial aberta, back in the day. Hoje é também um museu e asistiu à assinatura do tratado de entrada de dez países para a UE, lembram-se, em 2004. 11 anos depois, quem se lembra das boas intenções...
Almoçámos numa humidificada esplanada do bairro de Thiseio e depois saímos da rota turística à procura do Technopolis. O ser a entrada um euro certificou não estarmos em tourist country. E o que é o Technopolis? Tipo a Central Tejo de Atenas, a antiga fábriga do gás para a cidade, transformada em museu e centro de espectáculos. Como chamariz adicional uma simpática grua segura uma base onde podiam jantar pequenos grupos de até 22 pessoas: "Dinner in the Sky!" A grua pode subir o pessoal até 50 metros, dependendo de como estiver o tempo, janta-se com cinto de segurança e, sim, pode-se ir ao WC mas equivale a ser um desmancha-prazeres, pois para tal a plataforma desce...

Após o conveniente intervalo no hotel jantámos em Plaka ao som das cigarras. A cerveja foi Alpha!

Big Eyes - 2014.




“Big Eyes” é o último filme de Tim Burton. Mas é mesmo um filme de Tim Burton? É. Mas o argumento não é dele, nem entra Helena Bonham Carter. Ergo… O filme utiliza as cores puras dos anos 50 e 60, a geometria das casas de então, os “olhos grandes” dos quadros de Margaret Keane dominam até à exaustão. Margaret – uma Amy Adams excepcional – foge de um divórcio para um sonho/casamento que vira pesadelo. Burton não foge ao facto desta pintura ser… rasca e foleira, brincando via Schartzman e Terence Stamp com a crítica e a pintura bem-pensada, e também não foge ao facto de ter sido a boa companhia das Testemunhas de Jeová que deu a coragem a Margaret de abrir o livro e provar que sabia pintar… aquilo, enquanto o seu marido nem isso sabia fazer: as Testemunhas de Jeová não mentem? 
É um filme a contar muito bem a sua história, com toques de Burton aqui e ali a aparecer, Burton teve medo que “Dark Shadows” , o filme anterior fosse entendido como mais do mesmo e abriu o leque. Gostei do filme. E agora, Tim?

Rushmore - 1998.








Wes Anderson  procurou reconhecimento nos últimos filmes, “Moonrise Kingdom” e “Grand Budapest Hotel”. Mas a sua aventura começou a ganhar asas com “Rushmore”, em1998, com argumento seu e do wedding crasher Owen Wilson. Há um colégio americano onde Jason Schwartzman, com 18 anos a fazer de 15, faz de tudo mesmo tudo excepto estudar. O professor fixe é Bill Murray – a criar a sua imagem alternativa, sedimentada depois com “Lost in Translation” – e a professora nova de quem todos gostam é Olivia Williams. O DVD estava há anos por ver na estante. E vê-lo depois dos outros filmes corta todas as surpresas. Os diálogos são deliciosamente alternativos, Schwartzman aterrou no mundo dos filmes com estrondo e na realidade é o motor do filme, recomendo a posteriori a série “Bored to Death”. Bill Murray gets the girl, os truques de Wes Anderson – primeiros planos, odd music, etc. – levam bem o filme até ao fim. Uma excelente comédia, um excelente filme. Sorri imenso, e gostei. Claro que este visionamento retrospectivo atrapalhou a pedida superadesão. E porque não rir, como por ex., em “Bridesmaids” ? Rir é out? 

Jangada de Pedra.

Não sou um Saramaguista. Mas quando a Eslováquia só quer receber imigrantes cristãos, a Macedónia expulsa os mesmos com gás lacrimogénio e bastonadas e o Reino Unido promete mais cães para defender “O Túnel”, eu penso: “podia bem acontecer, umas fissuras primeiro, ali bem em Ordesa, Pirinéus, que bonito mas que inútil, esta nossa ligação europeia, vamos lá quebrar esta merda, vamos embora, Europa adeus, fodei-vos, não mereceis o Sul que vos ilumina, que vai ser da Europa sem o nosso sol, a nossa luz, aqui vamos qual “Jangada de Pedra”, enfim, iremos, não sei se Rajoy vai deixar, o Passos Coelho, deixá-lo em Biarritz… 

About Robert Wyatt.

Mais uma vez Robert Wyatt. Ouvi-o pela primeira vez a cantar "Shipbuilding" de Elvis Costello, no RollsRock do António Sérgio, da Comercial, ano 82. Baterista dos Soft Machine nos anos 60, paraplégico desde 73 ao cair por uma janela abaixo. Com direito a um concerto de desagravo em 74 com a presença de Mike Oldfield, Nick Mason, you name it. Nesse mesmo ano lançou "Rock Bottom", uma obra-prima de não-rock, mais citada talvez do que ouvida. Mas o início dos anos 80 libertou o amplo iconoclasta que havia em Wyatt. Um disco de versões revolucionárias "Nothing Can Stop Us", um disco de pop alternativo "Old Rottenhat". Robert Wyatt pertencia ao CC do Partido Comunista Inglês, participava no single "Venceremos" dos Working Week, contra Pinochet, produzia "The Wind of Change"  a favor da SWAPO da Namíbia... Wyatt was hip again! Felizmente as idiosincrasias de Robert Wyatt nos discos seguintes, "Dondestan" - 1991, "Shleep" - 1997, "Cuckooland" - 2003 e "Comicopera" - 2007 equilibraram a atenção.
Robert Wyatt vive numa discreta casa com  a pintora e escritora Alfreda Benge - casamento tb no tal ano da ressurreição de 74, rodeado de sintetizadores, percussões e trompetes - os instrumentos de predilecção do homem. Fez 70 anos em Janeiro e diz que agora chega, nesta entrevista.



sábado, 22 de agosto de 2015

Atenas dia 5.

O museu mais importante de Atenas não é o museu da Acrópole mas sim o Museu Nacional de Arqueologia. Recebe menos turismo, entre outras razões, porque fica um bocado deslocado do centro. Por isso foi o projecto de todo um dia. Fomos pela vandoma turística até Monastiraki. Aqui metemos sentido norte para Athina, mais uma rua comercial, e visitámos o mercado central de Atenas. Grande e moderadamente caótico, a meio caminho entre a assepsia ocidental e o deboche alimentar do oriente. Umas centenas de metros depois a praça de Omonia, um nó rodoviário. Onde tive o único laivo de insegurança que dava pelo nome estranho, oh se estranho, de... "Cafetaria Janeiro", frequentada só por homens e predominantemente barbudos e desocupados. Seguimos ainda mais para norte e encontrámos o edifício Neoclássico que alberga o museu. Apesar do assalto ocidental feito durante séculos às ruínas gregas, muito ainda ficou para ser mostrado. Pode discutir-se se a civilização Grega foi uma civilização mediterrânica ou a primeira civilização europeia. Talvez a primeira opção seja a correcta. Mas a Europa nasceu do Mediterrâneo. E o seu nascer e crescer vê-se neste Museu como, possivelmente, em nenhum outro lado. As esculturas das Cíclades, os frescos Minóicos e de Santorini, Micenas, os períodos Arcaico, Clássico e Helenístico. Tudo isto foi visto com companhia interessada. Logo à entrada estava a máscara fúnebre em ouro de Agamemnon, nem mais.
E à saída tomámos uma fantástica sanduíche similar aquela do Pireu numa esplanada ao lado do Museu que tinha, julgo, seis televisões, cada uma a dar um canal diferente. Podias escolher onde sentar-te para ver o canal grego preferido! Clever, yes?

À noite voltámos a jantar numa praceta em Plaka. A cem metros ficava o Cinema Paris, um cinema de bairro ainda activo. Comprámos um pequeno poster do Pulp Fiction em grego, claro. O rapaz que nos embrulhou o poster, interrompeu o serviço várias vezes para "obliterar" os bilhetes da sessão nocturna...

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Atenas e as Cigarras.

Atenas é mesmo uma cidade do Sul. Por onde quer que andássemos era omnipresente o canto das cigarras. Até por brincadeira estimáva-mos o número de cigarras ao serviço e comentávamos: "agora calou-se a 37, olha, arrancou a 43!".
Sabe-se como termina a velha história onde as formigas não cantam as sim rabeiam pelo chão, trabalhando.

Nos últimos anos houve um assassinato de carácter do povo grego como nunca antes visto.
Não há como consultar os números da OCDE, ano de 2014: um grego trabalha 42 horas por semana, um alemão 35h, um português 40h. Eu sei, vão falar-me da produtividade e o caralho mais velho. Eu sei, trabalho numa "empresa" com "pontómetro" e sei como se pode nada fazer entre dedo e dedo. Mas, mas, mas.... não vamos por aí. O problema dos gregos não é não trabalharem. Embora para perto de 30% - os desempregados - efectivamente seja!

Já agora fui sempre atendido mais depressa em Atenas do que em Roma. 

Californication - séries 1 a 7.

Bom, para compensar, aqui o que não falta é sexo e drogas. Que duram sete épocas. Tudo começa com os Rolling Stones - You Can't Always Get What You Want - e porquê? Hank Moody - David Duchovny é um escritor novaiorquino que não escreve nada há "n" e que perdeu o amor da sua vida, Karen, para LA e para outro homem. Têm uma filha. Para consolo desta situação LA não é parca em oferecer-lhe... consolo - portanto, sex and the frequent use of recreational drugs. O pilot termina com "Rocket Man" - Elton John - que vai ser a canção também a fechar a série, 7 épocas depois. Curiosamente os Stones abriam aquele famoso filme "Os Amigos de Alex" e com a mesma canção...
Hank Moody é sobretudo um sweet talker. Não consegue evitar meter-se - e especificamente meter determinada parte do seu corpo - em problemas. Karen é o distante fio de prumo, bem como a filha. Hank Moody é um Amigo de Alex, resumindo e concluindo. Vinte e cinco anos depois as "good vibes" pos-hippies muito americanas versão LA- dream ainda vendem e convencem. A série vai-se vendendo porque os actores são óptimos, quem não quer ser Moody, as situações em que ele se mete são do mais rocambolesco mas voltando à velha temática, tipo mãe e filha, professora e aluna, não há duas sem três und so weiter. A série consegue sobreviver também porque Moody nunca desiste de Karen, nem Karen desiste de Moody - um sonho que comanda uma vida, et voilà - e porque há sempre nudez e agilidade para ver, e destruição narcótica qb. O partir da série 4-5 o sexo começa a ser algo mais bizarro do que o habitual, sobretudo quando aparece o produtor de cinema Stu, que acaba por ser uma espécie de mau da fita. Percebo agora porque demorei tanto a decidir ver a época sete. Como fechar a história de Hank Moody? "I miss the earth so much I miss my wife", diz Elton John. E o avião voa para NY e o Porche fica para trás. O que eu sugiro é ver as primeiras quatro épocas - com Kathleen Turner na época 3 e Rob Lowe na 4. And have fun doing it. 

NCIS - épocas 3 a 11.

Se alguém quiser entender a mente americana deve ver a série NCIS da CBS. É desde há anos a série americana mais vista, e mantém esta popularidade intocada, apesar de alguma alteração no cast. Tem dois spin-off's o NCIS-LA, onde milita a "nossa" Daniela Ruah, e o NCIS-New Orleans, na minha opinião intragável.
Proponho as épocas 3 a 11, onde o cast esteve mais estável. NCIS é um corpo policial da marinha ficcionado que trata de todos os crimes graves que envolvam marines. Uma das frases mais ouvidas na série é "Dead marine!". A figura central é Leroy Jethro Gibbs, um nome só possível nos US, um herói de cabelo grisalho e poucas falas que vive a beber café e sorri contadas vezes. É acolitado por duas figuras masculinas, um diNozzo - italiano - e um McGeee - irlandês, um sendo activo e mexido, o outro informático e introvertido. Há ainda duas figuras femininas, Ziva David, agente emprestada da Mossad, e uma gótica Abby Sciuto, que é a especialista em todos os truques forenses. Finalmente temos o anatomo-patologista Dr. Palmer, a única figura mais velha que Gibbs, e o seu contraponto filosófico. As idiosincrasias de cada um destes personagens são muitas e bem feitas, diNozzo fala demais e leva carolos do chefe, McGee nunca tem namorada, Ziva fala mal inglês e articula mal "aquela" palavra, é sensual e costuma namorar com eventuais inimigos do país, o que é mesmo azar. Abby  Sciuto é de longe a mais engraçada e tem diálogos memoráveis com o seu adorado Gibbs, que lhe fornece café e mais café. Também aqui não há sexo nem drogas - a não ser como motivo das maldades sob investigação. E há correntes profundas que às vezes vêm à superficie para tomar conta da série - Ziva atira no irmão para salvar Gibbs, este tem uma relação distante e confusa com o pai e com o seu passado numa terra do interior USA. A acção é suf+, e a intriga "internacional" que, com frequência mete o pai de Ziva, apenas o director da Mossad, é apenas semi-crível. 
Não interessa, há momentos de puro western psicológico, e há intermezzos de descompressão com diálogos de encomenda. Leroy Jethro Gibbs é um John Wayne televisivo e chega a ter uma relação mais do que interessante com uma agente da CIA representada por Jamie Lee Curtis! Tudo que está à volta é uma construção perfeita desde que se acredite nela - e lembro que os americanos são bons a acreditar. Para equilibrar as coisas, na série 6 entra como chefe um negro, homem de maus fígados mas boas intenções, criando uma interessante tensão com Gibbs que lhe é distante. 
Ziva sai no fim da série 11. Para mim é o momento em que o castelo da cartas da série se desmorona. Acho que os americanos ainda não repararam nisso.

The Mentalist - séries 1 a 7.

The Mentalist estreou na CBS em 2008 e rapidamente ganhou o seu espaço graças às performances de Simon Baker e Robin Tunney, respectivamente o "psíquico" Patrick Jane e a detective Teresa Lisbon. A série tem várias simpatias, a começar pelo apelido da detective. Patrick Jane é um psíquico charlatão que vê a sua família assassinada por um psicopata que dá pelo nome de Red John, depois de o menosprezar na televisão. 


Tão superior "castigo" leva-o a colaborar com as forças da ordem - Lisbon - para encontrar Red John. A série tem um engraçado sabor a anacronismo - não tem os tecnicismos dos CSI's nem dos NCIS's, as cenas violentas são discretas, quase pouco críveis, não há sexo nem drogas. Patrick Jane conduz um Citroen DS e toma muito chá e descansa e resolve crimes num sofá de couro encomendado para ele no escritório do CBI - tipo FBI da California, topas? Mas a série é bem mais do que isto e a interacção Patrick Jane / Red John é muito interessante. Simon Baker é o mais charmoso dos actores, veja-se a publicidade Givenchy Gentlemen Only e também produz e dirige. Aqui e ali há episódios que são só pretextos para nos divertirmos com ele ou com ele e o seu - variável - interesse amoroso, Lisbon. Outros episódios há onde as coisas vão mais fundo e a série ganha mais espessura, sem nunca ficar como se fosse um peso-pesado televisivo. Conseguiu durar sete temporadas, com algum aliviar da espessura para as últimas, mas Simon Baker forneceu sempre o seu perfume - Gentlemen Only - para levar o barco a bom porto. Acabou e faz-me falta, confesso.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Atenas dia 1.

Acordámos à justa para o pequeno-almoço, correcto sem riqueza. Saimos e era quase hora de almoçar. O hotel abria para um pequeno largo com oliveiras e uns assentos. Um idoso levantou-se perguntou se necessitávamos ajuda. Não, era só questão de orientar um pouco o mapinha... Encontrámos uma rua comercial e já com bastantes turistas. Seguimos a corrente e no segundo restaurante decidimos parar. Tinham menu em português. Comemos na esplanada coberta com a companhia de uns simpáticos pardais. A comida era boa, apurada, abundante. À primeira escolha comemos melhor que em toda a jornada romana prévia. O calor era imenso. Transpirava da ponta dos - ausentes - cabelos, até aos pés. E começámos a subir para Anafiotika.
Na encosta norte da Acrópole existe um pequeno bairro de mui estreitas e empinadas ruelas que imita uma aldeia das ilhas gregas e porquê? porque os seus habitantes primeiros de uma determinada ilha terão vindo. Será assim ainda? As casas não parecem transformadas nem optimizadas, o bairro aqui e ali roça a definição de bairro-da-lata e é apenas meia dúzia de ruelas - mas é um charme. E lá em cima re-vi pela primeira vez o mar de casas de Atenas. Ah, é assim!

O calor infernal pediu um intervalo.
Já depois do meio da tarde, e após comprovar que o ar condicionado do quarto do hotel funcionava, arrisquei um projecto de caminhada mais extenso. Saímos em direcção ao Arcode Adriano e ao Templo de Zeus Olimpo e rumámos em direcção a Syntagma, a famosa praça das manifestações onde está o parlamento grego. A avenida é um pouco a subir e ao lado estão os Jardins Nacionais, que frequentámos um pouco como alterativa. Syntagma estava calma e tranquila, pouco depois metemos para a direita e penetrámos por Kolonaki, um bairro rico de Atenas. Sim, a sensação foi de no crisis" mas, como comparar, eu não estive ali seis anos antes. A partir de determinada rua passámos a cortar por entre blocos de apartamentos subindo por escadas e mais escadas até chegar ao teleférico que nos ia levar até à colina mais alta de Atenas, Lykavittos. O funicular desemboca estrategicamente num restaurante com esplanada. Mais um lance de escadas e temos uma pequenina igreja dedicada a S.Jorge. A vista é... indescritível.
Jantámos depois no restaurante, de nome... Orizontes, caro, claro, na companhia de ruidosos e simpáticos orientais. Jantámos boa comida, um pôr-do-sol e meio litro de cerveja Fix - em Atenas 0,33 de cerveja é considerado uma perda de tempo, tipo empata-fodas.
Descemos já de noite e refizémos todo o caminho bem, com menos calor e em segurança.
Para primeiro dia...





segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Igreja Nova, freguesia do concelho de Mafra.



1.


Ao acertar as rugas com o ido
Devia eu estar mais enrugado.
Muito do que foi vestido afinal
Não era meu mas emprestado.
E assim fica o haver de rugas
Explicado.


2.


Um poeta sem andaimes pode ser bom poeta mas não é boa pessoa.

#

A luz todos os dias acontece e não tem interruptor.

#

Arranjem uma cama de água para o nenúfar!

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O engano acontece devagar mas, mais tarde ou mais cedo, deixa-se ver.

#

Quem tem uma prótese valvular mecânica consegue ouvir sempre o coração, o que é uma grande chatice.

#

Azul e azul. Alternando com um azul outro azul ainda. O mais é branco. Grécia!

#

“Pagar com o corpo” – era uma expressão em voga quando da minha primeira viagem à Grécia, engraçado grupo de amigos. “Com o corpinho”, para ser mais preciso. Ok, eu pago.

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O turno da manhã é, às vezes, como um camião do lixo que se atrasou e quer, rápidamente, acabar o serviço.

#

 Anos, blocos de apartamentos para demolir.

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Eu diria que quinze minutos é um tempo vil, senhor ministro, nem meia hora vai dar para contar a minha história.

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Padecer é como quem desce aos poucos. Ter uma dor fodida é uma queda livre.

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Campo de tiro, no que à sedução diz respeito. Diz tu de que lado estou eu.

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Sopro certo.

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Abaixo do paralelo 40 só devia haver cervejas de meio litro.

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Tudo se pode traduzir em palavras. As traduções podem não ser boas.

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Resta-me um dia, ainda sem nome, apenas um dia.

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Que farei, oleiro, contigo?

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Deus não existe. Indiferente a isso, a papoila perde a sua graça, pétala a pétala.

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Vivo com uma pulseira electrónica. Sabes onde estou, não o que faço e penso.

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Tecidos, particípio passado. Tanto calor lá fora. Nem presente nem plural.

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Neste búzio ouço o mar a que não tenho direito.

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De cavalo para burro e de cão para gato, caçando. De homem novo para homem velho, de louva-a-deus para escaravelho do lixo.

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O pouco tempo pode ainda ser uma explicação?

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Ser uma ilha obriga a opções. Mas as ilhas atraem os poetas.

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La bonne. Menos que uma dama-de-companhia. Incapaz do mal. Na vida real é, porém, a amante do Conde de Segur.

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O rabo de uma lagartixa é uma perda de rabo e de tempo. O trabalho que a lagartixa tem para o refazer enerva-a. É uma fase em que é mais provável a lagartixa ficar debaixo da roda de um carro.

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Um trocadilho fácil é disparar o quadro e eu dizer “foi a resistência”.

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Não há ecografia que relate: foie gras!

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O fígado engorda em vida porque desconfia do que na outra vida vai encontrar.

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O teu nome na porta do frigorífico serve para segurar a to do list onde não estás, ó inacessível mas útil pessoa!

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Como legado delegar.

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Estou com esta sensação elíptica de que não vou chegar a lado nenhum.

#


Mudam-se os tempos, mantêm-se as vontades.

"C'est pour ça que je suis communiste!".

Não me lembro bem, Cristina Pinto, seria o ano de 1997 ou por aí perto, trouxeste da tua amada França, do Hospital onde tinhas feito Intensivos um simpático e jovem especialista em trombólise no tromboembolismo pulmonar, lembras-te, foram umas jornadas no Seminário de Vilar, quase juro, o rapaz fazia-se acompanhar por uma simpática anestesista, não sei bem o que quer dizer a expressão "boa como o milho" - porque não outra gramínea? - convidaste-me a acompanhá-los a conhecer melhor o Porto, subimos até à Serra do Pilar no meu AX, ficámos por ali a admirar o postal, o pôr do sol, eu a saber muito menos francês do que o desejado e ela ali enceta uma declaração virada para o rio, olhos semicerrados, estava sol, fala sobre tudo o que é importante na vida - foi então sem dúvida o que me pareceu - e termina: "c'est pour ça que je suis communiste!". 
Lembras-te Cristina Pinto? E se mantiveres algum contacto pergunta-lhe o que acha ela hoje "de tout ce que ce passe maintenant dans l'Europe, dans la France...", se ainda mantém acesa essa velha chama...

Mas, mais importante do que tudo o resto, lembras-te, Cristina Pinto?

sábado, 15 de agosto de 2015

Foz do Arelho, São Martinho do Porto e a Nazaré - 2011

A costa portuguesa que se faz desde Peniche até à Nazaré é a mais mexida e interessante do país, no que à orogenia diz respeito. 
Já falei do Baleal. Uma dezena de kms acima fica a foz da Lagoa de Óbidos, que se chama na realidade Foz do Arelho. Almoçámos e depois descemos à praia. Lembro-me que havia algum vento. A Foz do Arelho tem areia virada para a lagoa e virada para o mar. O entrono convence. 

Aproximámo-nos de São Martinho do Porto pelo lado da poluição. Na baía em concha semi-fechada por uma dupla arriba/muro, desagua o rio  Salir, mais os seus eflúvios suínicos. São Martinho do Porto recuperara finalmente bandeira azul em 2011, perdeu-a agora outra vez em 2015. Não chegámos à prais, parámos em Salir do Porto onde o tal rio acaba na baía, existe um longo passadiço que se faz bem, e uma encosta arenosa que é a delícia para quem se atreve.











A Nazaré fecha a costa mais original de Portugal com o Sítio e, a norte deste com o seu agora celebérrimo canhão. Em 2011 ainda não era assim. 




 A onda do McNamara só aconteceu em 2013. Espreitámos a praia do Norte, passeámos no Sítio e apreciámos a sua vista de vertigem, descemos o funicular, almoçámos num restaurante que estava vestido como se para um casamento, demos uma volta pela arrumada Nazaré de baixo, voltámos a subir o funicular. Nazaré sobrevive ao postal mas por uma unha negra.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Óbidos - 2011.

Nunca mais voltei a Óbidos. Que é uma terra que hoje, para além do mais, tem a vantagem de se oferecer como postal à vista para quem passa na A8. Óbidos não existe, ou existirá e nós não reparámos. Só voltarei a Óbidos com chuva. Fomos a Óbidos dois dias. Óbidos é agora a terra da ginja, do chocolate e da feira medieval. E, enquanto isso, por ali - à volta, e à volta significa à volta da lagoa de Óbidos, uma mancha de água que permite boas fotografias a partir da muralha, nascem e morrem resorts, A verdade é que já não me lembro se se avista da muralha, e não consigo nada na net que o documente. No medievo a lagoa lambia as muralhas, pelo que dizem.


No primeiro dia Óbidos estava, como é habitual, cheia de turistas. Foi uma benesse, mas cara, haver uma volta de charrette à nossa espera para acontecer. A Cata teve direito a ir à frente, em cima, e até pegou nas rédeas. E sei que divertimos algumas pessoas, à passagem. 
O segundo dia foi com companhia, a melhor companhia, a de gente amiga. Era a feira medieval, e Óbidos enquanto parque temático estava no seu auge. Mas a melhor companhia converte qualquer Zoomarine - para quem não gosta muito de água - num paraíso. E assim foi.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Atenas dia 4.

Em Atenas, com máximas de 36, com o Meditterrâneo a quatro kms, como não ir à praia? Atenas tem um tram que leva até à zona das praias. Leva o seu tempo mas leva. É uma espécie de quest for Carcavelos, mas as praias revelaram-se piores, pedra fina e escassa, as melhores com entrada paga e tudo o mais. 
Parámos emVoula e tínhamos fome e não queríamos andar muito. Comemos um insulto de marisco - insulto na escassez e no preço - servido por um simpático ucraniano, homónimo dum amigo meu do SU. Sim, eu perguntei-lhe e chamava-se Oleg. Depois descemos até à pedreira que dava por nome de praia. A água estava com a temperatura perfeita, a ondulação inexistente. Estava quase tudo absolvido. Numa zona onde a pedra quase-era-areia estava semi-enterrado um grego sexagenário. Quando se levantou passou por nós e cumprimentou-me... em grego. Depis deste elogio explicou-me, em inglês, que tinha problemas articulares variados e que o médico tinha-lhe recomendado vinte minutos de "enterrar-se na areia" todos os dias. Finalmente deixou as coisas à nossa frente e foi para a água. Quando decidimos voltar a Atenas,  o homem ainda estava na água. But we took the long way home.
O tram levou-nos até às portas do Pireu, o porto de Atenas, junto ao estádio do Olimpiakos, os que equipam de vermelho. Após andar um bocado fomos ter à enseada mais pequena de Pireu, Mikrolimano. A enseada-marina está completamente rodeada "por dentro" de bares e restaurantes. Comemos num destes a evolução civilizacional de tosta mista, uma coisa divina partida em quatro e acompanhada por umas batatas fritas e vários molhos. Podiamos tocar a água da enseada com os dedos, ou quase... 
Com as forças refeitas sobrevoámos a praia municipal do Pireu, a enseada Limani Zeas - a dos iates caros - e cruzámos para o Porto do Pireu mesmo, mãe-de-todos-os-ferries. Tomámos o metro - na realidade um comboio rápido de proximidade - até Monastiraki, voltámos a namorar mochilas, sandálias, etc. e, após merecido descanso, jantámos em bem em Plaka, numa pequena praça onde um cinema de bairro, o Cinema Paris, mantém-se activo. Again, I rest my case....

Roma dia 2.

Roma pede e facilmente fornece alguma reflexão sobre a história europeia. Cabeça de "O Império" da história ocidental, onde os seus habitantes se identificavam como romanos, ie, cidadãos da cidade-mãe, Roma sobreviveu ao desabar ao tornar-se cabeça de um outro império, este "espiritual", o da Igreja Cristã. O bispo de Roma era e é o Papa. Sendo que o mesmo teve e tem poderes temporais, até metade do séc XIX sobre uns "Estados Pontifícios" que eram grande parte do centro-sul de Itália, e, hoje, a cidade-estado do  Vaticano. 
Roma, como civilização antiga, tornou-se mais famosa pela engenharia e pela cópia do que pela originalidade. Daí que os monumentos mais famosos de Roma-a-Imperial sejam proezas de engenharia, nomeadamente o Coliseu e o Panteão. As restantes velharias romanas, com excepção de vários arcos de triunfo, não acrescentam ao que dias depois Atenas nos iria oferecer. Roma foi há dois mil anos o que Berlim hoje é para a "chamável" "civilização da couve-de-bruxelas", vulgo União Europeia.
Mas Roma é também uma cidade italiana. A efervescência grega citadina que produziu séculos de brilho só encontrou paralelismo mil e uns quantos anos depois nas cidades italianas: Florença, Bolonha, Pisa, Génova, Siena, Verona, Pádua, Veneza, Milão. Roma também fez parte deste torvelinho, embora com brilho variável, consoante a liberdade concedida pelo Papa de turno. A "eternidade" da nomeação papal era então amenizada pela alta mortalidade das mais comezinhas doenças ou dos mais variados venenos.
 A riqueza da Roma renascentista e barroca advém do seu patrono ser o mais poderoso e mais rico da cristantade, a saber, o Papa. E, se o Papa estivesse a isso disposto, tinha fundos infindáveis para encomendar, mandar, decidir. Por isto Roma é a cidade mais monumental de Itália.

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Roma dia 2: os bilhetes para os museus do Vaticano tinham sido comprados online. Algures na minha região insular direita meti a peregrina ideia que também me davam direito também a visitar a basílica de São Pedro. Não davam.
Fixar os nomes dos arquitectos mais importantes na história de Roma é simples: 3 "B"'s - Bramante, Bernini e Borromini - e... Miguel Ângelo. Já vamos falar deles.
Calma e lentamente fomos subindo pela sombra que as árvores que, de cima, ladeavam o Tibre para chegar perto do Vaticano. Precisados de fazer poupanças, descobri um Mac perto do Vaticano, no mapa um pouco acima e à direita. Era subterrâneo e foi o primeiro Mac onde me pediram esmola. A entrada nos Museus do Vaticano foi relativamente fácil. Mas a partir daqui só posso dizer isto: DEMASIADA GENTE. SEMPRE. E DEMASIADO COMÉRCIO, SIM. Os Museus do Vaticano são uma sucessão de corredores e salas com alguma lógica temporal. Os interiores são lindíssimos mas não os encostos, os atropelos, a transpiração. E a venda dos "recuerdos" em cada corredor de passagem. Acredito que os lucros sejam para as missões em África, mas... Consegui entrever Caravaggios, Pinturicchios, perdi-me metade dos frescos de Rafael nas Rafaelle Stanze - nomeadamente a ESCOLA DE ATENAS!, enfim. Finalmente fomos empurrados para uma Capela Sistina onde dentro estariam várias centenas de pessoas, de nariz no ar, a quem foi pedido "pouco barulho" para que se inciasse uma oração, Wtf... Ah, e esqueceram-se do famoso controlo de decoro, vulgo, não-vás-de-alças-não-mostres-os-joelhos. Saí agoniado. E não percebo porque não permitem, por uns euros, claro, descer a escada helicoidal de skate.
Um único intervalo de paz acontece num pátio onde está o Cortile della Pigna, parte monumental dos edifícios do Museu, projecto de Bramante. Ao lado uma esplanada caríssima.
A Basílica não nos mereceu mais uma fila e uma desidratação. A praça de São Pedro, de Bernini, a cúpula de Miguel Ângelo, a Pietá também de Miguel Ângelo que nos esperava lá dentro, o Baldaquino de Bernini, esquece! Os Museus do Vaticano convertem qualquer um ao budismo.
Passámos pelo Castelo de Sant'Angelo, lembrete do temporal poder papal, e, mudando de país, entrámos pelo coração de Roma adentro para ver o Pantheon por dentro. A enormidade do seu interior, a simplicidade da sua geometria e da sua... lógica, conseguiram sobreviver aos turistas. É do século II dc e, segundo a Wikipédia, ainda é a maior cúpula construida pelo Homem sem qualquer reforço metálico. Ali estão enterrados o primeiro rei de Itália, Verdi, Rafael. Não há registo de futebolistas. Um que outro gladiador nas catacumbas mais antigas? 

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Voltámos a jantar em Trastevere. Segui o conselho de um site mas - quando reparei no aspecto do recomendado, como que a pedir demolição - sentámo-nos no em frente. Meia hora depois o recomendado estava cheio. Mas jantámos bem. Tivemos direito a um mágico da treta e vários grupos de músicos. O mágico repete sempre a sua ladainha "guaaaarda, una, guaaaarda, due, guaaaarda, tre!" Eu e Cata imaginámos o mágico a fazer desaparecer o Coliseu, São Pedro e depois despedir-se modestamente, "Adiiiio", com o mesmo tom de voz, explicando "sent Coliseum to another dimension, sorry, no roaming to another dimension, can't bring back, I am just a poor magiiiician...". Repetimos a piada ilusionista depois em Atenas e assim acompanhou-nos durante toda a semana. 


Aos mágicos monocórdicos de Roma o meu muito obrigado!  
  

Vai com Deus!

Hoje, eram as quatro e meia da tarde, subi o elevador com uma não-proprietária deste condomínio pre-fechado em que vivo e onde, também, proprietário não sou, arrendo. Pelo vestuário utilitário serão utilitárias as funções de quem cumprimentei. Já a tinha cumprimentado na garagem, cumprimentei-a outra vez na espera do elevador, despediu-me ela quando saí, "Vá com Deus!". Os portugueses conseguem destruir qualquer expressão agradável. "Vai com Deus" hoje equivale a "não me chateies". Só em Portugal a expressão "Vai dar sangue!" é um insulto. Mas  não se tratou disto. 

A verdade é que, hoje, senti-me pela primeira vez acompanhado!

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Roma dia 1

Na dia noite anterior tinhamos percebido que estávamos no centro de Roma. Mas, mais precisamente, onde? A manhã serviu para isso. Que o pequeno-almoço fosse - obrigatoriamente - servido no quarto, obrigava a horários. Bem estudado o mapa fornecido pela recepção, foi sair, esquerda, direita, esquerda, e estávamos no rio, a atravessar a ponte Sisto V - o mesmo da Capela Sistina, para Trastevere. Tibre, o rio, em italiano é Tevere. Donde, "Trastevere", "para lá do". Nem mais. Estava calor, muito calor. Ruas estreitas debruadas de turistas, levaram-nos a Santa Maria in Trastevere e sua praça. A basílica é séc. XI, os mosaicos exteriores séc. XII, os interiores séc. XIII e de Pietro Cavallini, o Cimabue de Roma. Eu sei que já estou a inundar esta cena com nomes, etc., mas no livrinho em que eu, adolescente, aprendi a história da pintura ocidental, a primeira reprodução pertencia a Cimabue, pintor florentino, ergo. 
Esqueci-me de falar do rio. O Tibre é um rio verde, sujo e calmo, que corre dez a quinze metros abaixo de nós, acompanhado de ambos os lados por umas vias para duas rodas e peões que raramente são usadas e que são aqui e ali tomadas por múltiplos bares. Ao que parece o romano não desce ao rio para correr nem para pedalar mas sim para beber. Se depois se atira ao mesmo não sei. O Tibre não tem muito mais que se lhe diga. 
Progredimos pelas ruas estreitas de Transtevere por entre casas altas e bonitas, almoçámos razoavelmente e pagando um pouco menos que ao jantar. Bom, agora íamos ter serviço.

O calor apertava. Atravessámos o rio. Do outro lado da rua "os dois templos melhor conservados da Roma Republicana". Estavam tanto ao sol... Com um gelado subimos e contornámos a Via dei Cerchi e na entrada do Monte Palatino comprámos as entradas para o mesmo, o Fórum e o Coliseu. Nem eu nem a minha companhia estávamos para grandes subidas pelo que o Monte Palatino foi simplesmente ignorado. O Fórum Romano - aposto que não sabiam... - é um monte de ruínas. Com contadas sombras e água vendida por romanos não, romenos? Eu, pessoalmente, prefiro as ruínas com mais de um metro de altura, pelo que retive a Basílica de Maxêncio e Constantino - uma basílica civil, isto é, espaço de negócios, cuja forma depois inspirou as primeiras basílicas cristãs - e que se adivinha ter sido enorme, o Arco de Sétimo Severo e o Templo de Antonino e Faustina, uma grelha de colunas onde está uma igreja barroca construída dentro. No pino do calor lá saímos e fomos para o Coliseu. Ao lado do Coliseu fica mais um arco triunfal, o famoso de Constantino, mas o sol, sempre o inimigo, dissuadiu-nos da aproximação. Coliseu advém de Colosseum e, embora o Coliseu seja efectivamente enorme o nome pertencia no início a uma enorme estátua dedicada a Nero que lhe ficava perto. Derrubada a estátua, o nome derivou para a enorme elipse que por ali ainda estava, a duras penas. E está. Graças a conselhos amigos a compra prévia dos bilhetes evitou-nos uma de duas filas. A entrada foi fluida. Os gentios eram muitos. Mas, mesmo assim, a grandiosidade do monumento deixou-se ver. 
Exaustos e desidratados divisámos do outro lado da Via dei Fori Imperiali os Mercados de Trajano e a Coluna de Trajano. Que bem estavam ao longe, do outro lado da avenida... Na Piazza Venezia comprámos mais gelado e arrastámo-nos até ao quarto para um merecido descanso.

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Umas horas depois voltámos a sair para explorar as redondezas e decidir onde jantar. Os destinos óbvios foram Campo de Fiori e Piazza Navona. Ambas oferecem Roma numa bandeja. Navona acrescenta duas fontes desenhadas por Bernini e uma igreja desenhada por Borromini. E tem a forma do antigo "estádio" romano que ali... estava. Ambas as praças tinham demasiados estrangeiros, demasiados vendedores, demasiados mágicos da treta, demasiados músicos de rua - embora eu, confesso, tenha dado uns euros a um menos jovem que tocava "Forbidden Colors". Ainda fomos até à Piazza della Rotonda, com o Pantheon já fechado, talvez a mais verdadeira das três, porque menos equipada - por ex. - para jantar. Jantámos em Navona. Ao almoço fora cerveja Moretti, ao jantar foi cerveja Poretti.

domingo, 9 de agosto de 2015

O Baleal e a Consolação - 2011.

A praia da Consolação é para mim uma referência... literariamente romântica. Era a praia de Ruy Belo. Fica a sul de Peniche. 
Em 2001 era uma povoação anónima de costa, mais uma, sendo que 95% das terras assim o são, anónimas excepto para nós que de lá somos. Uma terra a crescer para uma arriba donde se desce para uma praia razoavelmente exposta a norte. Só depois de almoçar descobri que a sul o paredão permitia outro tipo de praia. E que depois voltava a haver areia. Ninguém retira a esta terra ter um nome tão bonito quanto necessário.





O Baleal é Peniche em ponto pequeno. Um rochedo alargado e comprido alberga duas dúzias de casas, algumas delas dedicadas à restauração. Ao continente liga-as uma duna e uma estrada de asfalto, transformando esta duna em duas praias. O Baleal fecha a concha onde ficam as praias a norte de Peniche. O surf aqui também é rei. Logo para dentro do Baleal fica Ferrel onde, em tempos que já lá vão e Deus sabe porquê, o Homem sonhou criar a central nuclear portuguesa.



O que eu me lembro de Peniche - 2011.

Na costa norte da península de Peniche há um pequeno parque de campismo com uns bungalows que se alugam. Há ainda uma piscina e uns matraquilhos à porta da recepção. Já não me lembro bem da disposição das camas, lembro-me de jogar às cartas e de fazer puzzles no chão. E que foi sobretudo em Peniche que percebi que os jogar matraquilhos com a minha filha a partir dali só me viria a trazer uma infinidade de desgostos, fruto de uma aprendizagem juvenil - minha - inexistente. A península de Peniche, que termina no cabo Carvoeiro, é eternamente batida pelo vento norte. É onde a tábua ocidental portuguesa deixa de ser tábua e se atreve mais a entrar pelo mar dentro. Sei eu que não foi bem assim, mapas do medievo mostram Peniche ainda como uma ilha rochosa, uma espécie de hiper-Berlenga, que toneladas de areia e séculos ligaram à terra-mãe. As Berlengas vêem-se bem ao longe, uma sugestão de viagem e de vómito que nunca, felizmente, foi encarada. Nem me lembrei também de visitar o antigo forte e prisão.



As praias de Peniche, que as há a norte e a sul do gargalo peninsular, são arenosas e ventosas. A sul está a famosa "Supertubos". Toda a península é um fenómeno geológico formidável, embora o turismo se restrinja à fotografia no cabo Carvoeiro, onde há um restaurante onde talvez não tenhamos comido. Peniche em si é um Furadouro com o tamanho de uma vila grande, aquilo que em Portugal se chama portanto uma "pequena cidade". Cheira a mar e a pesca por todo o lado, o urbanismo tem aquele descuido e atropelo típico das terras da costa, vivo e agreste, como que a avisar e a marcar posse. Peniche não é fácil. Em 94 tinha estado em Peniche e comi óptimo peixe. Não ficou desta viagem qualquer lembrança gastronómica de relevo. Peniche está feita ainda com se estivesse situada numa ilha, ilha que deixou de o ser há meia dúzia de séculos. O porto antigamente era na Atouguia e avançou meia dúzia de quilómetros. Et voilà.

Férias de 2011 e 2014.

Meu caro Nélson, reparei agora que faltam nos meus anais da escrita as férias dos anos de 2011 e 2014. Por diferentes razões isso aconteceu e eu não me dei à análises proctológica das mesmas. 2011 foi depois de 2010 e foram umas férias apenas mais ou menos. O ano passado não estava eu para escritas, estava eu sim "completo e fechado". Ainda vamos a tempo de reparar a coisa e fazer os exames adequados, se bem com a naestesia do tempo que já passou.

sábado, 8 de agosto de 2015

Atenas dia 2.


A noite também não correu bem, pois o calor era muito. E o Yahoo não prometia mudança de planos. Seria um dia tão bom como outro qualquer para visitar a Acrópole. Plaka fica logo à direita do monte sagrado. Em vinte passadas estávamos em Dionissiou Areopagitou, a rua completamente pedonalizada que faz o sul da Acrópole. O nome"acrópole" deriva de "alto" e "cidade". A entrada permite visitar muitos outros sítios interessantes em Atenas, como a Ágora. Entrámos porém porque queriamos o prato principal. O êxtase do local não dispensava a procura incessante por sombra e água. À direita o teatro de Dionísio. Nele pode ter acontecido a primeira representação de uma peça de Sófocles, estudada pela Cata uns meses atrás. Dessa e de todas as outras. Dois mil e quinhentos anos de teatro estavam resumidos na ala sul da Acrópole, porque mais à frente o teatro de Herodes Ático, construido no tempo do domínio romano, mantém-se em funções ainda hoje. A calorosa subida rodeia a colina para entrar pelos majestosos Propileus, ou "portões de entrada". Entra-se assim numa espécie de pedreira onde há um yin e um yang. E o yang está logo ali à nossa frente, uma enormidade de colunas dóricas em lenta reconstrução, o Partenon. À esquerda o yin, ou Erecteion, com as suas colunas jónicas e as cariátides. Não há aqui espaço nem capacidade para escrever o que é aquilo. Mesmo apesar de toda a gente, de todos os selfie sticks. Na Grécia começou a Europa? Então foi aqui, em cima deste monte, com Péricles e Fídias. O Partenon esmaga e ordena. O Erecteion faz-se amar. Saimos por onde entrámos, os Propileus. À esquerda elevada o pequeno templo de Atena Niké, completamente restaurado, lindíssimo. 


O Museu da Acrópole é recente. É mais um daqueles projectos "chateia-alemão". Infelizmente o projecto não é de um arquitecto grego. Como na Acrópole e em toda a Grécia, under-18 não paga! A visita foi-me guiada pela minha filha, e as palavras "arcaico", clássico" e "helenístico" foram ditas vezes sem fim. Ela contou-me como uma professora sua diferenciou os três períodos da escultura grega através de uma coreografia que não vou descrever. O museu é muito bom. Tem no piso do meio as cariátides originais do Erecteion, ou melhor, falta uma que os ingleses... levaram. As cariátides são talvez, o exemplo mais antigo de "Poesia em Movimento", passe a lamechice. Podia viver ali dias a admirá-las, só o olhar. O piso superior é uma homenagem e um lamento: uma homenagem aos frisos do Partenon, e um lamento pelo grosso dos mesmos estar em Londres, no  British Museum. Almoçámos, e bem, logo ali, na zona pedonal. No restaurante em frente, dois casais. O primeiro casal era constituido por um homem de idade e uma mulher ainda jovem, com a cabeça coberta. Ele levantou-se e foi buscar-lhe um gelado. Já vos disse como os gelados também são fundamentais em Atenas? Na mesa ao lado um rapaz recebia o gelado que a... namorada? - lhe tinha ido buscar. Fomos descansar para o hotel.




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Já com a tarde avançada mas sem que o calor abrandasse, saímos para fazer Adrianou em direcção para Monastiraki.Começámos por espreitar um baptizado ortodoxo.










Adrianou é uma rua comercial-para-turistas que liga Plaka a Monastiraki e que acaba numa zona de restaurantes com vistas para o metro e a Ágora. Sandálias, mochilas, t-shirts, colares, pulseiras, estes cinco itens foram cuidadosamente analizados e seriam motivo de muita conversa nos dias seguintes. Na Livraria de Adriano, séc. II dc, mete-se para a direita e vamos ter à praça de Monastiraki. Há muitos turistas, é certo, mas Monastiraki é Atenas: as pequenas ruas à volta são uma feira-da-ladra; há uma estação de metro, uma mesquita que agora é várias outras coisas, uma igreja ortodoxa logo ao lado, e de Monastiraki saem para a direita Mitropoleos e Ermou, ruas comerciais parcialmente pedonalizadas para oeste, para norte sai Athinas, que leva ao Mercado Central de Atenas. Fizémos Ermou e Mitropoleos, marcadas cada uma por uma pequena e linda igreja bizantina, em Ermou mesmo no meio da rua, impondo. Jantámos em Adrianou, à luz da vela, com vista para o Partenon. I rest my case.