sábado, 30 de abril de 2016

Dos taxistas.

Quando se fala de taxistas pensa-se mais nos taxistas de Lisboa e até, mais concretamente, nos do Aeroporto da Portela. Aí já tive várias más experiências. A incorrecção profissional não se devia corrigir com o aparecer de competição, sim com o recurso mais liberal à Polícia. No Porto e arredores nunca tive problemas com os ditos, à excepção daquele senhor taxista que acumulava com o ser marido de uma doente minha: passou uma viagem de Águas Santas para o Hospital a discutir incompatibilidades íntimas entre ele e a sua senhora, e o verbo reflexivo 'servir-se' foi usado.
Por falar em servir, o serviço Uber é mais uma versão século XXI de um esquema de economia informal. De quem a responsabilidade? Para onde vão os impostos? Corrija-se, regule-se, castigue-se o que nos táxis está mal.

Quanto ao mais, atenção.

É a vida um jogo de snooker.

De vez em quando lá acontece um mau contacto.

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Dos moinhos muito grandes.

Porque hoje/ ontem foi dia de Cervantes e do Quixote vem à colação lembrar Heráclito de Éfeso e deixar escrito que águas passadas não movem os moinhos de hoje, mesmo que eles sejam tão grandes que pareçam gigantes. E é assim.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

'O Bosque' de João Miguel Fernandes Jorge.

'Chove no bosque. A chuva cai com força. Abri a janela, são duas da manhã. Granizo. Pequenas pedras sonoras. Baterias ligeiras sobre os telhados. Corre, agora, friíssima água, pelos muitos algerozes, canais de ventura que descem para o seio da terra. Acendi as luzes do pátio para ver as carpas no tanque. Apenas duas, como barcos em oferenda, cruzam as águas. De um vermelho coral que se reflecte na solidão e na treva da noite.'

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Prince Alternative.

Sete temas menos conhecidos para ouvir e ouvir:

Head, Dirty Mind, 1980.

Take Me With U, Purple Rain, 1984.

Condition Of The Heart, Around The World In A Day, 1985.

Venus de Milo, Parade, 1986.

I Wish U Heaven, Lovesexy, 1988.

Letitgo, Come, 1994.

I Will, Chaos and Disorder, 1996.

Have fun!

Prince Roger Nelson And Camilla Parker Bowles.

Em 2005, fascinado com o ser sexual chamado Camilla Parker Bowles, compilei em Cd que depois distribui a amigos, uns quantos temas de Prince que me pareceram adequados à posição da cousa, a saber:

Hot Thing / New Position / Lady Cab Driver / Get Off / Shhhhh / Do Me, Baby / Insatiable / Push / Girls & Boys / International Lover / It / When 2 R In Love / Jack U Off.

It felt so good it must've been a crime...

I Hate U.

"Parade" foi disco do ano 1986 para a revista "Face". Era irrelevante ser a banda-sonora de um filme intragável. O realizador do filme e autor das músicas era Prince Roger Nelson e o disco era redondo, perfeito. Eu comprava naqueles dias a "Face" mas antes da nomeação eu já sabia: "les enfants qui mentent ne von't pas au paradis!" E o disco era tanta mais coisa do que a canção "Kiss".
Em 1987 a mesma revista "Face" colocava em número dois o Duplo LP "Sing'O'Times". Não me lembro do número um. Prince tomava o caminho oposto e em vez de uma banda-sonora conceptual abria o caixote e fazia canções para todos os gostos.
Em 1986 e 1987 musicalmente fui muito feliz. Conhecia as batidas, os baixos, os solos, os gemidos e as catch-frases de cor.
Um doente meu, um rapaz perdido que veio curar a sua endocardite da Bélgica para Portugal e para um certo Piso 8, ofereceu-me em cassette "Purple Rain", anos depois. E descobri por então também "Around The World In A Day". Nesse ano, 93, musicalmente, também fui muito feliz.
Prince ficou mortalmente ferido quando o hip-hop tomou conta da black nation. Um génio da composição pop, black people didn't pop anymore, élace! O nível estratosférico do seu catálogo de canções e da sua linha de música também nos faz esquecer que há quem diga ter ele sido o melhor guitarrista desde Hendrix.
 
Prince deu-me uma canção para tudo. Eu, portanto, para tudo tenho uma canção e isto não há dinheiro nem gratidão que pague.
Este mês de Abril nevou muito. Eu devia ter percebido.

terça-feira, 5 de abril de 2016

segunda-feira, 4 de abril de 2016

O Visconde Cortado ao Meio - Italo Calvino.

"- E porque há tantos cavalos caídos neste local, Curzio? - interrogou Medardo.
- Quando um cavalo se sente esventrado - explicou Curzio -, procura aguentar as vísceras. Uns assentam o ventre no solo, outros voltam-se de barriga para o ar para não as fazerem pender. Mas não tarda que a morte venha colhê-los à mesma.
- Portanto, nesta guerra as principais vítimas são os cavalos?
- As cimitarras turcas parecem feitas de propósito para, de um só golpe, lhes abrirem os ventres. Mas mais adiante ireis encontrar os corpos dos homens. Caem primeiro as montadas e depois os cavaleiros. Ah! Mas estamos a chegar ao acampamento.
Avançando agora a galope, verificaram que os tombados da última batalha tinham sido quase todos removidos e sepultados. Via-se apenas um ou outro membro solto, sobretudo dedos espalhados pelo restolho.
- De vez em quando - notou meu tio Medardo -, há um dedo que nos indica o caminho. Que quererá isto dizer?"

sábado, 2 de abril de 2016

As florestas e a prostituição. Apontamentos para um estudo.

Barcelos é um concelho grande. Dividido em inúmeras freguesias. Que, após a fusão de umas quantas, ainda são muitas. Não admira que haja duas, uma percentagem afinal pequena, que se dediquem aparentemente bastante à prostituição, a saber: Palme e Feitos. Ou apenas cedem o espaço?

Fiz muitas vezes por estrada o caminho Valença-Porto no últimos anos do século passado, por ainda não haver auto-estrada. Por puro aborrecimento variei a rota aqui e ali. Uma das opções que me pareciam mais interessantes, desde que a pressa não fosse exagerada, era fazer a estrada Viana-Braga, ou seja, a Nacional 103. Que quando entra no concelho de Barcelos entra ao mesmo tempo numa zona de floresta relativamente fechada e homogénea, eu sei que não autóctone, eu sei que não especialmente viva em espécies animais, mas extensa o suficiente para esquecer que estamos a entrar no Baixo Minho, esse excesso de casas, armazéns, fábricas e mamarrachos que tantos desgostos nos dá on the way. Mimosas e eucaliptos convivem com platanos, carvalhos, etc. Lembro que antigamente eu conhecia as "mimosas" pelo nome de "austrálias", sem saber ser a Austrália a verdadeira origem da infestante. Estes quilómetros de floresta, atravessados por uma estrada predominantemente recta, terão sido ou ainda serão o alfobre duma das zonas com maior prostituição de estrada do Minho - a famosa "recta dos Feitos", pois o coberto vegetal termina quando abre para as casas e os campos de Feitos. Do século passado não me lembro de nenhuma carne assim exposta na interessante estrada. E esta semana quando lá passei também não vi nada parecido. 

Em Ovar a zona mais conhecida de prostituição de estrada foi a Estrada da Mata, que liga as traseiras do Furadouro a Maceda e Cortegaça. Uma vez, há muitos anos, ao deambular de carro após uma noite de Urgência e porque, novo, muito novo, me recusava a ir dormir, vi por entre os pinheiros da Estrada da Mata uma dezena de jovens que descansava - dormia? - em cima da caruma, suponho que à espera da recolha, o trabalho nocturno feito. A fotografia teria sido fantástica , tivesse eu tido câmara e coragem. Hoje em dia a Estrada da Mata tem uma ciclovia e foi "domesticada". Lembro que a Mata é um pinhal extensíssimo e pertence maioritariamente ao Estado. Ali quase de certeza já não há putas. Em Feitos e Palme talvez tenha tido apenas azar nas minhas passagens, afinal apenas ocasionais. Ou sorte?


Isto da prostituição no mato tem o seu perfume, não nego. E não vamos brincar com a palavra "perfume". A prostituição porém tem pouco ou nada a ver com a sofisticação associada a um qualquer perfume, menos ainda com os filmes que nos dão a ver sobre a temática: nem "Pretty Woman" nem "Monster" se aplicam. O que há é miséria, fome, as famosas e incontroláveis necessidade masculinas, e tráfico de gente. Lembro-me da primeira e única vez que, adolescente, fui transportado na parte de trás duma HiAce. Dei comigo a pensar que naquele espaco amplo muito se podia transportar: dez mulheres para a Recta dos Feitos ou doze trabalhadores para Espanha. 

Tenho no entanto uma pena imensa de não ter feito aquela fotografia na Estrada da Mata, vai para vinte e mais anos. A imagem daquelas mulheres merecia melhor recordação.