sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

O Segundo Semestre.

 
 
 
 
Ler Camilo / Ler Ferrante / Viena / Berlim / Blasted Mechanism no Iberanime / Pina / Elle / Arrival / Nevoeiro e Argeriz / Nadir / Amadeo / Miró / Flanêur, 1,2 & 3 / 90 anos / 18 anos / Matosinhos ter um Fim. 

A Tetralogia Napolitana de Elena Ferrante.




"E depois?". Esta pergunta é a chave de qualquer narrativa. Romance, novela, conto. Qualquer uma destas categorias, ou palavras, serve uma história que, linear ou densamente ramificada, vamos querer conhecer e que nos seja bem contada. Os tempos têm fornecido sucedâneos, daí as fotonovelas, as radionovelas, as telenovelas, onde a cada virar de esquina algo acontece, esperadamente inesperado. Os grandes romances da literatura universal contam também uma história, sem a qual não teriam nascido. Se medirmos o e-novela-do (perceberam?) da história pelo seu número de "cotovelos" / "curvas apertadas" por q100 páginas, possivelmente os que consideramos grandes romances têm um rácio relativamente baixo, com páginas e páginas de fantástica literatura a rodearem meia dúzia de eventos. A Guerra e Paz tem mesmo assim bastantes curvas, o Nouveaux Roman não, Paul  Auster sim. Na Tetralogia Napolitana de Elena Ferrante o rácio "cotovelos" / páginas é elevadíssimo. Está sempre muita coisa a acontecer. E quando não está pressentimos que na página a seguir ou quase vai acontecer algo muito importante e dramático. Há um frenesi, uma adrenalina vital de vida que não para de ser relatada e relatada e relatada. O texto é nervoso, ansioso, compulsivo, como é a relação-chave dos quatro livros, a relação entre a narradora, Elena Greco, e Raffaella Cerullo. Nas "Crónicas do Mal de Amor", que agrupam os três livros anteriores de Ferrante, o tempo é um pouco mais calmo e há mais "escrita". Aqui que Ferrante escreve bem percebemos em flashes, um, dois, três parágrafos, onde ela solta definições redondas sobre as emoções e os sentimentos que, aos pontapés, estão por ali a acontecer. Portanto, podemos chamar à Tetralogia Napolitana de Elena Ferrante um mega-romance-novela. Acabei de terminar o terceiro volume. Um vício. Mal posso esperar para começar o quarto. Eis o segredo do sucesso universal, do fénomeno. Ao qual presto homenagem.
É um livro sobre duas mulheres nascidas num bairro de Nápoles e que vivem as transformações italianas e ocidentais dos anos sessenta, setenta, oitenta. A escrita é cruamente feminina. O sexo, o corpo, o imaginário, o relacionamento que é sempre estranho com os homens, os filhos, as famílias. O resto por ali também aparece, uma Itália violenta, com terroristas, camorristas, o neo-fascismo, atentados, mortos, exploradores e explorados, Norte e Sul. Duas mulheres que aprendem a viver vivendo, devorando a vida mal a mesma lhes aparece pela frente. Ou desesperadas quando ela não vem. Que são duas caras de uma moeda. Que se amam e que se odeiam. Gémeas para a vida e rivais até à morte. "E depois?" Para a semana começo o quarto livro.



"Na manhã seguinte, pela primeira vez na minha vida, entrei num avião. Não sabia apertar o cinto, Nino ajudou-me. Que emocionante foi apertar-lhe a mão com força enquanto o ronco dos motores crescia, crescia, crescia, e o avião iniciava a sua corrida. Como foi comovente soltar-me da terra com um sacão e ver as casas transformarem-se em paralelepípedos e as ruas em risquinhas, e o campo reduzir-se a uma mancha verde, e o mar a inclinar-se como uma placa compacta, e as nuvens que se despenhavam em baixo, numa derrocada de rochas macias, e a angústia, a dor, a própria felicidade, que se tornavam parte de um movimento único, muito luminoso. Pareceu-me que voar submetia todas as coisas a um processo de simplificação, e suspirei, tentei abandonar-me. De vez em quando perguntava a Nino: estás contente? E ele fazia sinal que sim, e beijava-me. Por vezes tinha impressão que o chão, debaixo dos pés - a única superfície com que se podia contar - tremia."

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

George Michael.

Sim, confesso. Gostava muito do Jorge Miguel. Do seu esforço para que o tomassem a sério, da sua voz tão demarcada, tão fora de moda, da sua recusa em avançar para o hip-hop, da sua fraqueza por urinóis, da sua falta de coragem, da sua teimosia, dos seus sussurros descuidados que produziram quatro álbuns apenas quatro, mas onde existem duas ou três das minhas canções. Não dava para mais, Jorge, eu compreendo. Muita droga, muita pressão, envelhecer é fodido e então tu... Mesmo o fantástico vídeo de "Shoot The Dog" onde em 2002 gozavas com o Bush 2 já se sobrepunha a uma dance song cansadita. Despediste-te de nós com "Outside". Ide, foi o que disseste, ide lá para fora onde é bom! Mas fechaste a porta sobre ti, desapareceste e, dezoito anos, depois, morreste.

Vou agora expôr aqui alguns dos teus fantásticos dance vídeos onde, como hoje diziam no Observador mais valia "ser alegre do que ser triste", e onde criaste (ooops!) um imaginário oh tão mais-que-perfeito. Depois vou pôr a tua balada de que eu mais gosto - nunca foi bem o teu forte... - ("One More Try" seria já considerado um clássico se cantado por outra pessoa). E, no fim, um poema. Teu...















sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Dois Filmes. Elle & Arrival.

"Elle" é o último filme de Paul Verhoeven, o famoso realizador holandês que, após Robocop, Total Recall e Basic Instinct virou "Hollywood poison" e voltou para a Europa. "Elle" tem Isabelle Huppert (não há melhor) e tem uma pergunta por trás: como sabemos que estamos realmente vivos? Verhoeven faz um filme francês, mais ainda, parisiense. E em Paris há tudo, tem-se tudo. Trabalha-se fazendo realidade virtual, videojogos mais propriamente. Tudo já aconteceu, os filhos, os casamentos, as ilusões. O que resta? Um filho incapaz? Fazer o mal? Talvez sim, pelo menos durante um bom bocado - o tempo do filme - para voltar à vida.  Mas os homens até no mal são piores do que uma mulher, e Huppert - merci, mon Dieu! - prevalece! Great film to watch, dreadful sex scenes tough! Mas se calhar isso também faz parte. Porque... muita gente não vai perceber este filme. E eu, percebi?



"Arrival" coloca a questão: quem é Denis Villeneuve? Ah, bom, é um canadiano francês que tem feito filmes para o comercial, incluindo aquele baseado na história "duplicada" de José Saramago... "Arrival" faz também uma pergunta que, curiosamente, nada tem a ver com os extraterrestres - vagamente parecidos com a "Mão" da família Adams mas gigantes... - mas sim com qualidades que por eles a nossa amiga e, by the way, grande actriz Amy Adams adquire: se soubesses antecipadamente a vida que vais ter, ou pelo menos partes importantes dela, arrepiarias caminho? O filme é curioso, está bem desenhado, inventar o Sudão as a power to be é giro. Mas a pergunta que se leva para casa é bem terrena e pertence a cada um fornecer a resposta. Very watchable film indeed... tem uma mensagem pacifista mainstream mas, repito, a tal pergunta... pena quase não se notar a presença de Forest Whitaker.


quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Aleppo e o Rei Salomão.

A famosa parábola bíblica da justiça de Salomão aparecia num livro que eu tive da escola primária. Ao ameaçar cortar a criança ao meio Salomão provocava a esperada reacção da verdadeira mãe que logo preferia perder a criança mas que ela ficasse viva a vê-la morrer. Numa guerra civil é difícil decidir qual das duas palavras pesa mais, se a palavra "guerra" se a palavra "civil". Pesam as duas certamente e demasiado. Sobre a amálgama de combatentes em Aleppo leste não me vou pronunciar. Em guerra não nos vamos fazer esquisitos a decidir que armas são boas ou más quando um inimigo é comum, certo? Vou sim falar do governo de Bashar al Assad. Que neste encarniçamento patrocinado pela Rússia contra os rebeldes do leste de Aleppo não passa no teste da justiça de Salomão. Vão vencer a batalha, até talvez a guerra, mas a criança que é Aleppo - milhares talvez, cada uma um mundo que se perdeu - vão encontrá-la morta.

domingo, 11 de dezembro de 2016

O que fazer com o Museu Nacional que há no Porto?


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"Ah, então isto é que é o Museu Soares dos Reis?" Ouvi esta frase ontem a quem trata Serralves por tu. A resposta é simples: é o único Museu Nacional (MNSR) que há no Porto - não sei se o Centro Português de Fotografia conta - e é o Museu mais aborrecido que eu já visitei.

O Museu está agora a conhecer um "surge" de atenção com a visita à exposição Amadeo 1916-2016, que depois seguirá para o Museu do Chiado (que antes se chamava Museu Nacional de Arte Contemporânea mas mudou de nome para ficar... in!). Para chegar às salas da exposição Amadeo temos que atravessar o circuito de salas de pintura desde o início até meados do século XIX, depois o bloco de escultura com uma sala dedicada ao patrono, Soares dos Reis. E, finalmente, respiramos fundo, chegamos ao Amadeo.

Vamos por partes. Primeiro há que dizer que grande parte da pintura presente neste Museu tem um valor bastante relativo, documentando a evolução da pintura portuguesa que seguia, geralmente com décadas de atraso, a evolução das escolas europeias. Isto tem de ser dito, explicado, assumido. Com excepções. A primeira metade do giro pictórico parece uma viagem a preto, branco e sépia. Será precisa muita criatividade para ressaltar a originalidade que aqui ou ali aparece. Alguém que o faça, por favor. No site há destaques, repito, destaques - Vieira Portuense, por ex. Pena os destaques não estarem destacados nas salas. Metade das salas têm aliás as folhinhas do costume esgotadas ou não repostas... mas eu pensava que essa cena das pagelas estava até ultrapassada por outros meios... mas nem isso.
Pouco antes do intervalo escultórico chegamos à sala dos Realistas paisagistas, Silva Porto, Marques Oliveira... Hoje menosprezados, a sua importância merece algum enquadramento que aqui também falta. Os amarelos dourados, os azuis claros, embora tardios, foram importantes para o Portugal daqueles tempos.
A sala de Soares dos Reis tem dum lado o fantástico Desterrado e em contraponto as estátuas do Conde Ferreira e de Avelar Brotero. Isto é injusto sobretudo para estas últimas. O Desterrado merecia uma sala só para si. Um diálogo com a Infância de Caim de Teixeira Lopes seria talvez mais interessante.
Depois viramos e é a vez de Henrique Pousão. JÁ DISSE E REDISSE: só por Pousão a visita a este Museu vale e vale e vale a pena. Porque nada nas salas anteriores nos prepara para isto: um génio do Realismo terminal europeu, nascido alentejano e criado no Porto e a quem as cores de Roma, Nápoles e Capri forneceram a imortalidade, antes de morrer aos 25 anos de idade. Só um detalhe dá para nos aprecebermos que alguém pensou o arranjo da sala - nas duas paredes terminais os dois grandes quadros incompletos de Pousão - talvez fosse importante explicar que estão incompletos a quem os vê - o óbvio nem sempre o é.
O Realismo durou uma eternidade a desaparecer em Portugal. Na sala a seguir a Pousão recebe-nos o famoso retrato de Aurélia de Sousa e outros quadros qcuja qualidade variável merecia talvez algumas explicaçõezinhas.
A seguir duas salas Modernistas et al. À esquerda Eduardo Viana, o nosso quase-Delaunay - ah, mas era preciso que alguém contasse ao pessoal a piada. Depois um Alvarez, um Dordio Gomes, um muito conhecido Abel Salazar, um Sarah Afonso (enquadramento, please... esposa de Almada? primeiro pintor naif?), depois uns quadros surrealistas com um valor requentado, um escuríssimo Júlio Resende e uma parede Lanhas - mais uma vitrine de deliciosas pedras pintadas - onde alguém pode deixar os bilhetes da visita em cima, tanta a atenção. Como posfácio uma pequena sala António Pedro - esta sim com explicador na parede. Mais vale tarde do que nunca. Esta sala não explica porque não há no Porto uma Sala de Teatro com o nome de António Pedro. Adiante.
Nas salas do piso um - a volta que demos foi ao piso dois - estão as artes "decorativas". Só não as evita quem paga para as visitar. Eu, como Amigo de Serralves... Portanto não critico porque não visitei. Só um detalhe: quando se põe as artes "decorativas" em salas separadas é o primeiro passo para que, ao visitá-las, o passo acelere.

Ora vamos aprender com os outros - nunca, repito, nunca, se deve aceder a uma exposição temporária através da exposição permanente. Menoriza a exposição permanente, como é óbvio. 
No Museu Nacional Machado de Castro (MNMC), em Coimbra, estatuária, cerâmica, pinturas dialogam bem, embora a colecção do Museu seja muito diferente: a pintura é antiga bem como o grosso da estatuária, etc. Mas o Museu foi criativo na sua exposição. 
Por outro lado a colecção de pintura do MNSR partilha interesses com as colecções do Museu do Chiado em Lisboa e com o Museu Grão Vasco em Viseu - que só hoje aprendi também ser Nacional.. - lembro-me bem de ter lá visitado uma interessante ala de pintura  de séc XIX-XX. Intercambiar quadros seria uma boa opção, para optimizar colecções cuja latitude e longitude qualitativa não é assim tão extensa... 

Resumindo, visitar Pousão, uma e outra vez. O resto, aqui e ali, também vale a pena. Está ali a história de um país na periferia da Europa a tentar recuperar de um atraso artístico secular. Ah, já agora, algumas das obras pequenas do Pousão têm umas molduras assassinas... Ah, e porque não visitamos os jardins?

Uma mensagem de esperança: lembro-me de gostar da cafetaria, de uma visita anterior.


quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Carachi, Sind, Pakistan.



"Does anyone else miss Theresa Cullen, her bitter human thoughts, and the special feeling you got when she lit up a cigarette?"

Este comentário foi escrito por uma jovem modelo paquistanesa no grupo fechado a que aderi e que segue a série "WestWorld". Completamente de acordo. Fiquei com vontade de esquecer todos os perigos, os perigos com que ela se defrontará diariamente, e de viajar até Carachi, Sind, Pakistan. Se possível já amanhã.

Felizes os que têm aldeias.

Felizes os que têm uma aldeia onde voltar, felizes. Partiram delas um dia, eles ou os pais, o que é a mesma coisa. Voltam saindo naquele nó da auto-estrada, uma pequena ansiedade dissimulada, começam a subir a serra, as vistas, a névoa, acontecem as reconhecidas curvas, o entroncamento onde o tio Zé teve o acidente com a mota, aparecem as oliveiras, a vinha, as maceeiras, os soutos de castanheiros, as terras têm nome e dono, comenta-se quem comprou a quem, quem partiu, quem herdou, numa rua inclinada encosta-se o carro, chegámos. Felizes os que têm aldeias.

Pouco antes de chegar a Vila Pouca é seguir as indicações para Valpaços e Carrazedo e toma-se a estrada para a Padrela. Que mal começa a subir nos oferece vistas sobre o socalco de Vila Pouca, encalhado entre a Padrela e o Alvão, vistas, impedidas aqui e ali por abetos, pinheiros, carvalhos, etc. Depois entrei em terrenos de mato baixo e a névoa fechou toda e qualquer vista. No site da CM fala de uma "via panorâmica" da Lagoa. Passámos pela dita aldeia, a névoa permitiu ver casas, bons campos, pouco mais. Em Carrazedo a visão era de um par de metros à minha frente. A Padrela - que também é uma bonita aldeia onde um intervalo no branco me permitiu ver a marcha de um Outono já a terminar - é uma serra que é um planalto enrugado que vem subindo irregular até se derrubar sobre as terras de Aguiar. Isto adivinhei, não vi.

Posto isto conduzi até Argeriz, que ficava a meia dúzia de quilómetros. A Argeriz e a mais nenhuma terra devo o gostar de castanhas - cruas, cozidas, secas, assadas, em todo e qualquer cozinhado - e de alheiras e de folar de Chaves. Estas aldeias são feitas de mulheres, mulheres que enchem as casas onde persistem, por pequenas que sejam as mulheres de de falo. Lembro sobretudo de uma, tão pequena que era, lembro acompanhar a sua doença, como um enfermeiro a passou de uma cama para outra ao colo, tão pouco pesava. Encontrei a casa, já não encontrei as mulheres, as que estavam, acredito que as que voltavam ainda lá voltarão, perdi esse contacto há tantos anos, numa das curvas de que falei antes, onde o tio Zé teve o acidente, ou o primo Xico se estatelou com a bicicleta. A casa ali se mantém, orgulhosa, ainda bem que alguém a cuida, ainda bem. Desconheço a história recente da mesma, nem tenho porque a saber. Do pátio traseiro da igreja pude espreitar as escadas onde cheguei a sentar-me e descascar castanhas.

Quem tem uma aldeia tem quase tudo. Quem não a tem é obrigado a fazer bastante mais pela vida.

Ao voltar, da auto-estrada que vai para sul pendurada nos inícios do Alvão, ainda se via do outro lado a Padrela fechada por uma névoa, uma nuvem que parecia ser só sua, de mais ninguém.

sábado, 3 de dezembro de 2016

O futuro da democracia.

Já pensaram que em qualquer filme de ficção científica, qualquer um, no futuro não há democracia?

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

As Primárias Francesas.

Está assumido que Marine Le Pen irá à segunda volta das Presidenciais Francesas. E que o seu adversário vai ser François Fillon, um candidato de direita que na realidade é uma espécie de Sarkozy um pouco menos mau. Porque o eleitorado francês está cada vez mais à direita e tal e coisa...

O eleitorado françês é predominantemente de direita desde o fim da era Miterrand. A vitória isolada de Hollande aconteceu contra Sarkozy e não a favor dele. Fazendo contas simples, 40% vota à direita, 20% extrema-direita - sim, 20% - 25-30% PSF e 10-15% forças mais à esquerda. Um candidato unitário de esquerda ultrapassaria Le Pen e obrigaria Fillon a ganhar com o apoio de Marine Le Pen ou talvez não, se o centro (assumindo que ainda o há) tivesse algum juízo. Infelizmente não há esse candidato unitário de esquerda, que poderia ser Taubira, Aubry, até talvez Ségolene Royal. E infelizmente a esquerda já deu as Presidenciais como perdidas e Mélenchon candidata-se só para marcar território e Macron para atrapalhar Manuel Valls e reinventar para si um centro que neste momento de conflito, já não existe. Manuel Valls, uma espécie de Michel Rocard ainda menos socialista e sem metade do charme. Nem Macron nem Mélenchon vão chegar a lado nenhum. Nem a França, pelo que me parece.

Previsão? Fillon ganha as Presidenciais com uma abstenção record e com uma vantagem não tão elevada quanto isso sobre Marine Le Pen.

O Azibo.

A barragem do Azibo pertence ao concelho de Macedo de Cavaleiros mas não é preciso passar pela sede do concelho para lá chegar. A A4 tem uma saída que nos deixa quase à porta. 
Já me contaram que o verão enche e faz transbordar esta Área de Paisagem Protegida. Uma visita num feriado com o Outono avançado, frio mas limpo, foi feita quase sem ninguém a atrapalhar. Uma das cafetarias estava muito disfarçadamente aberta, oferecendo alguma música ambiente para uma das praias que bordejam a albufeira. Há quem não consiga viver sem uma banda-sonora. Caminhando um pouco em direcção ao trilho que abandona as praias e rodeia em parte a albufeira o silêncio era completo. 



segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Amadeo dizia a verdade.

A chalupa

Amadeo de Souza Cardoso disse, entrevistado: "Sou impressionista, cubista, futurista, abstraccionista? De tudo um pouco." A exposição que reside até 16/12 no MN Soares dos Reis no Porto recomenda-se e em abundância. Atravessa-se as cores escuras das primeiras salas da exposição permanente, os tons suaves dos primeiros realistas, Silva Porto, etc., e a sala das esculturas do patrono, Soares dos Reis. E preparem-se. A pintura acima, "A chalupa". Futurismo, certo? A pintura do meio, "Máscara de Olhos Verdes". Fauvismo, não? Amadeo foi muito mais do que a última descoberta da explosão cubista da Escola de Paris. E a pintura final? Lembra Mário Eloy, o pintor português louco, décadas depois, o que mais próximo nós tivemos do... Expressionismo! Como se chama o quadro? "O Jovem Louco".

Green Eye Mask - Amadeo de Souza-Cardoso

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O Exame, de Cristian Mungiu (with spoilers).

Porque decido ver um filme? Porque fui ver o filme “O Exame” de Cristian Mungiu (vidé entrevista)? Por um equívoco de metalinguagem. Nem mais. Giro. Correu bem.

É de cem minutos a demora média de um filme. É muito tempo. É um piscar de olhos. 

O PIB per capita da Roménia é metade do de Portugal. Tenho talvez metade da capacidade de esforço que tinha há vinte e cinco anos. Fiz recruta há, isso, exactamente 25 anos. Sofri o velho teste de Cooper à entrada e à saída. Impressionante o que um mês fez pela minha capacidade física, já então no limiar da deficiência. Hoje… O romeno é uma língua engraçada, soa a italiano cortado com checo, como se fosse uma droga de rua. Soa bem mesmo assim, como as drogas de rua que batem bem mesmo assim, cortadas. Portugal vive em queixa. Imaginem agora metade do nível de vida que temos, metade ou um pouco menos.

E, porém, o nível de vida não tem nada a ver com a vida das pessoas, suas curvas e acidentes. As linhas que prendem e seguram, grossas ou finas. Sempre há  linha que é mais fina, mal entrançada ou enganosa na força. Pensamos que apenas parte delas são importantes, que há aquela e aquela amarra que podemos deixar cair e porém olhamos para baixo e o abismo logo aparece, logo ali. Assim o filme, que é o filme sobretudo de um pai, um cirurgião predominamente honesto numa Roménia predominantemente mini/médio-corrupta, que quer lançar a filha, rapariga de boas notas para fora dde tudo aquilo, para Cambridge, para fugir ao PIB per capita inferior a metade do português. Um romeno que sobreviveu a toda a Roménia – tem idade para ainda ter conhecido Ceausescu, e depois a transição, e depois todos os desastres da história política romena recente… - mas que quer, em suma, que a filha deixe de ser romena. Um doente meu pagou o curso de medicina a um sobrinho na Roménia – correu bem, divertiu-se imenso, foi bem recebido mas as palavras-chave são “já voltou”. Ninguém quer aquilo?

O filme tem duas cenas que ditam a sua qualidade, que me parece bastante. Numa a polícia romena, num alto arborizado e servido por um teleférico, procura alguém. Vemos meia dúzia de polícias, parados, com binóculos, olhando para um lado, para o outro, parados. Procuram sem procurar. Que se só para que conste. O chefe de polícia, amigo de infância do cirurgião, conversa com este sobre o que são os "factos da vida" na Roménia. E depois diz: “Bela vista, esta!”. Responde o cirurgião: “Quando éramos crianças a vista para o outro lado era a melhor. Mas as árvores cresceram!” Sim, como ver? Como decidir? As árvores cresceram. Pouco depois o cirurgião, que degrau a degrau vi perdendo mulher, amante, filha, honestidade, carro, numa paragem de autocarro julga ver o maltratador da sua filha. Sai e procura-o, no meio da noite, por entre estranhas casotas de madeira, zonas abandonadas. Mas nada lhe acontece. Nada. Espera-se um ataque que não acontece. Chega a casa da amante e dorme no sofá. "Onde" em sua casa dormia antes, no sofá.

Assim é sempre, as verdadeiras e definitivas crises são raras, vislumbramos o abismo, o ataque, a degola. E não. O tempo passa e sempre acontece menos do que parecia. Mas passa o tempo, ora se passa. Cem minutos, e o fim de um período lectivo. Pai a querer o melhor para a filha. Filha que duvida. O que um filho não vê não é visto - regra número um.

O exame final acontece, no Norte costumamos dizer que “quem não chora não mama”. Uma vez vigiei uns testes, uma aluna começou a soluçar, não entregava o teste, já passava a hora. Esperei um pouco. Outra aluna veio ter comigo. “Quero o meu teste de volta. É que se não recolhe o dela...”. A Roménia não é Portugal, na minha consulta muitos doentes contam-me de familiares mais novos que emigraram, sem grande drama anexo, que estão bem, que talvez não voltem. Mas eu não sou cirurgião. Ninguém é o outro ninguém. A dificuldade está no alguém que tentamos ser e, no entanto, o caminho para lá não é fácil de ver, crescidas as árvores - lá e cá.



sábado, 26 de novembro de 2016

Alto Douro, fim de Novembro.

As boas coisas, as boas terras, merecem ser vistas não só quando mandam os cartazes e os guias mas também nos outros dias. A aposta não será assim tão arriscada porque, se as coisas são boas e se as terras também, a recompensa é mais do que provável. Assim o Alto Douro Vinhateiro.

Hoje, passado o Marão, que me ofereceu as suas primeiras nevadas - e que bom fazer a IP4 agora com menos trânsito do que antes - tinha pensado ir espreitar o Montemuro por trás, que nevado também deveria estar. Ao descer a A24 pouco antes da Régua vi à minha frente as Meadas completamente fechadas com nuvens e percebi que iria gastar muito gasóleo para nada. Sendo assim, não havia como olhar à minha volta e sair da auto-estrada, onde parar não se pode, e fazer um pouco da N2. Novembro a acabar, as cores são de um Outono final. A vindima aconteceu ainda não há muito, a apanha da azeitona é por estes tempos. A terra deu tudo o que tinha para dar. Toda a chuva é bem vinda. As cores acobreadas das folhas da videira contrastam com o verde perene da oliveira, com o castanho escuro do terreno. Onde as há as cerejeiras também amarelaram. Os tons são de fim de festa, soa o aviso "vamos recolher", vem aí o Sr. Inverno, e eu bem que o sei porque a neve, já a vi.


ABE, pá, da-se!!!!

Deparei-me com um guia simpático, gratuito, chamado "Inbicta", produzido pela ABE, Marketing & Comunicação. Pousado estava em Serralves para disfrute, por ex., meu, e incluia referências aos restaurantes, sítios para visitar e lojas de maior interesse nas três zonas do Porto com mais "footfall". Nem mais. Longe de ser exaustivo mas bem feito, trata-se de um daqueles guias alt-mainstream que toda a Cidade Europeia tem, tal, hoje em dia, o Porto.

Dediquei-me, porque sem mais o que fazer, a contar das 22 lojas mencionadas, quantas tinham nome (em) português. Contei 4. Considerei a Haity e a Eureka matchs nulos. Explicito que as zonas de maior "footfall" eram Clérigos, Santa Catarina e Boavista.

Portanto, as 4 portuguesas: Luís Buchinho, Anselmo 1910, Porto Meia e Fátima Mendes.

As apátridas: Fashion Clinic x 2, Max&Co, Fly London, La Petite Coquette, Porto In, Paez, Clérigos In, Daily Day, Dumonde Chocolat, Violet & Ginger, The Feeting Room, FreshJealous, Skunkfunk, Pollux, Xtreme.

Da-se!!!!

PS: a ABE tem escritórios em Vale de Cambra, S.João da Madeira e Luanda, por esta ordem.

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Insisto, é o Silo!

Só eu para falhar o quase único dia em que o Nuno Malheiro Sarmento não podia estar presente no Silo do Norte Shopping, a galeria de arte que eu mais aprecio e frequento no Grande Porto, estrategicamente localizada no Norteshopping. Mas estavam lá as obras, ergo...

O Silo, concebido pelo Eduardo Souto Moura, está feito de uma forma que permite criar uma enorme diferença de ambiente entre o piso superior, luminoso, e o piso inferior, mais nocturno. Claro que o tijolo que domina o espaço modera todo e qualquer excesso de luz. E, no entanto, mas, porém...

Nunca o Silo tinha arriscado, que eu tenha tomado conhecimento, uma exposição colectiva desta dimensão. São trinta, os artistas, trinta. Trinta caminhos, trinta hipóteses de trabalho. É tirar apontamentos. 

Poderei tomar a liberdade de apelidar o meu amigo Nuno de galerista? Não vai ficar chateado? Pois assim não sendo, aqui deixo escrito que o galerista dispôs as obras com suprema inteligência, com um crescendo nas técnicas e nos volumes no piso superior da direita para a esquerda, e guardando algumas opções mais atípicas para o piso inferior. Não vou destacar nomes, destaco a diversidade das propostas, a curiosidade que quase todas as obras me suscitaram. Ah, e, aqui e ali, a preços muito acessíveis, caro galerista!

Pois é, visitemos então!


terça-feira, 22 de novembro de 2016

Quatre-vingt-dix.

Os franceses é que a sabem toda, com aquela coisa do quatre-vingt-dix, como se os oitenta fossem uma espécie de limiar e a partir daí os anos a haver um sobejo, quatre-vingt-un, quatre-vingt-deux...
 
Noventa anos é mesmo muito tempo. E quando ontem me perguntaram se havia algum dvd ou cd que tu, dentro dos teus gostos que assumiram que eu conhecia, tu gostarias de receber, respondi a verdade, que não sabia, e depois menti: disse que não me lembrava de alguma vez ter tido conhecimento de tu com a minha mãe terem alguma vez ido juntos ao cinema. Efectivamente vocês foram uma noite ao cinema, uns tios meus ficaram a tomar conta de mim, a experiência não correu bem, eu expliquei-vos isso na volta. Hoje que penso, como diz a tua neta, nasceste antes do Sunrise do Murnau (27) e do Maria do Mar, do Leitão de Barros (1930). Nasceste meses depois do Vinte e Oito de Maio, e o teu primeiro Presidente da República foi o Marechal Gomes da Costa, que hoje por hoje dá nome a tantas avenidas.
 
Da tua infância nada sei também. Um destes recentes dias - recentes querendo dizer nos últimos anos - em conversa com o teu irmão Mário, este contou-me pequenas peripécias da sua infância, da tua também, portanto. Nesses pouco minutos pude espreitar pela primeira vez o nunca contado, como foi Ovar nos anos trinta, nos anos quarenta, como foram as coisas que eu nunca te perguntei e por isso tu nunca me contaste.
 
Uma história apenas contas uma e outra vez, a do namoros dos teus pais, meus avós, de talho para talho, porque os mesmos onde trabalhavam ficavam na mesma rua. Vamos assumir que se trata de uma história com um final feliz, mais propriamente sete, pois foram sete os filhos que vingaram. E porque vingam os filhos? Porque a má sorte é assumida ao nascer, o chegar a adulto um calhar, uma coincidência, um bafejo da sorte. Dos filhos só tu e o meu tio Guilherme não fizeram do cortar carne profissão, parcial ou completa. Ser talhante, cortar a carne que outros vão comer, é uma profissão peculiar. Começa pelos cheiros. Aos quais me habituei de pequeno. O cheiro da carne crua, nomeadamente da de vaca, é-me agradável. Depois o toque. Pegar nela, escolher o melhor lado para cortar, adivinhar as aponevroses, o fio da carne, de forma a que saiam bons nacos para cozer, para assar, bifes. E antes olhaste e disseste de onde era a carne, a peça pendurada de um gancho na tua imaginação. Chambão, chã-de-dentro, a pá. A rabada, que me ficava na boca ao trincar e eu não gostava dela. Nos supermercados começaram a cortar a carne de uma forma diferente - disseste-me. E eu a pensar, solidário. "que pena!". Quando, uma vez por semestre, compro carne num talho e a cozinho, preparo-me, lavo as mãos, escolho a melhor faca e pego na carne, dou-lhe voltas e voltas, corto e volto a cortar. Como se soubesse.
 
Penso agora que a minha filha pouco ou nada sabe também da minha infância. Talvez a minha seja a tua vergonha, porque a minha infância foi confusa, pequena, escondida. Mas mais um vez engano-me. A tua vergonha não será, certamente, a minha. Para começar, quarenta anos de distância nos separam. Depois seis irmãos. Sei hoje, levei cinquenta e dois anos para o aprender, que coisas minhas há que são tuas, outras da minha mãe, outras minha tão somente. Ninguém copia ninguém. Peça a peça, fui-me reavendo, recentrando. Assim a minha filha que, esquecido o disfarce da cara, nada a mim deve.
 
Numa coisa porém te copio: os cuidados que pela manhã tinhas comigo nos tempos de apanhar o comboio para a faculdade, o acordares-me, o certificares-te que eu acordei, o aqueceres-me o pequeno almoço. Assim mais ou menos faço hoje, quando o turno é meu. Lembro-me porém quando, quase preocupado, me avisavas de como o café pode ser forte, melhor o descafeinado, ainda não te tinhas apercebido como o Porto me tinha feito crescer tão rápido e tão para fora.
 
Não conheço quem, com valia, de ti tenha má opinião. Essa unanimidade exterior à casa confundiu-me em tempos. Hoje sei que é afinal muito cansativo fazer o correcto todos os dias nesta vida sem prémio. Sem prémio, repito. Todos os dias. Mas prémio haverá às vezes, como agora, noventa anos passados, no simples que tens os teus dias. Merecidos dias simples e claros.
 
Falo, ou escrevo, demais. Estendo-me as mais das vezes ao comprido. Hoje também. Uma última coisa há que queria reaprender contigo: a, só, palavra justa. Ou, na sua ausência, o silêncio.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Balanço rápido de um C.


Sobrevalorizamos as diferenças percentuais.

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Uma não inferioridade habitualmente não chega, pelo que estou lembrado.

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Um intervalo de não inferioridade desenha-se entre as minhas noites e as tuas manhãs.

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O subgrupo que mais me interessa é o das mãos.

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Elegíveis? Ilegíveis?

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Craig Anderson, you are so wrong!

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Que problema havia com a saia dela? As ancas subjacentes? Ou o diálogo entre ambas?

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Não, ninguém troca experiências.

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Houve quem fosse mesmo embora. Uns poucos.

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Preso, transportam-te na boca, fraco animal domado. Á porta te deixaram desta sala - "Vai, mas

com cuidadinho!" Entras, humilhas. No regresso és agraciado com um abocanhar vagamente

meigo, os dentes buscando repetir por piedade ou desdém as mesmas feridas que eles na tua

carne mole provocaram na vez anterior

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Mas, já agora, palmas que se ouçam!

domingo, 20 de novembro de 2016

Em dois dias.

Em dois dias o meu pai vai fazer noventa anos. Uma vez mais não sei o que oferecer-lhe. Ainda ontem jantei a seu lado. As suas limitações de corpo são bastantes, os pequenos passos, a incerteza na articulação da perna, acho que o direita, a intolerância ao mais pequeno esforço, ambos os pulmões armadilhados pelo enfisema. "Como estás?" - "Estou bem." Despertam-lhe atenção poucas coisas, pergunta-me semanalmente por umas mochilas que por ali - pela casa dele e que já foi duas vezes minha - deixei, possivelmente uma meia dúzia daquelas pastas azuis da Bayer que eram antes frequentes nos congressos, eu respondo-lhe que as pode pôr no lixo, ele em silêncio discorda, por isso volta à carga na semana a seguir: "Tens aí umas mochilas...". 

Tinho ido assegurar-se de que a Melodia jantara. O regime alimentar de uma cadela domina as actualidades naquela casa. Sentou-se a meu lado, ofegante, a expiração prolongada. "Mas comeu! E comeu a batata!" A cadela adquiriu o hábito - o vício - de, depois de jantar, lhes pedir uma batata crua. Que, pelo veterinário, para nada serve porque os cães não absorvem amidos. Discordo do veterinário, amigo que sou  da mesma cadela, sei eu bem que muitas coisas como e que para nada de bom me servirão. Que faço coisas - este escrever para não ir mais longe - que a utilidade é nada. Mas faço, como, comemos. Assim o meu pai, adivinho, a raiar a hipóxia, satisfeito pelo jantar acontecido e terminado, o dos quatro convivas à mesa, pai, mãe, filho e neta, e de uma cadela um longínquo piso mais abaixo. 

Noventa anos é mesmo muito tempo. Talvez como presente agradecer-lhe de viva voz estes noventa anos. Sei eu bem que esta benesse que terça-feira vou receber não acontece a todos, nem a todas. 

Vamos ao que interessa, Espanha.

Sou republicano em Portugal e seria republicano se em Espanha. O regime monárquico parece-me um anacronismo. Et pourtant...

1. Existem vários regimes monárquicos na Europa. De cor aqui vai: Bélgica, Países Baixos, Dinamarca, Noruega, Suécia, Luxemburgo, Espanha, Reino Unido. À vista desarmada eu diria que ser uma monarquia quase parece assegurar prosperidade, pois são monarquias muitos dos países mais ricos da Europa, do Mundo...

2. O ser um país monarquia ou república nasce sobretudo da história que a esse país aconteceu. A monarquia pereceu em Itália com a 2ª Grande Guerra e o alinhamento da mesma com Mussolini. Pereceu na Alemanha com a derrota na 1ª Grande Guerra. No Reino Unido a monarquia é algo intrínseco à ideia nacional e internacional do dito. De alguma forma é a monarquia que "une o reino". E no entanto permitiu por exemplo um referendo Escocês. Coloca-se a mesma questão com a Bélgica. De qualquer forma a intervenção dos monarcas europeus na vida política é simbólica e/ou nula. Reafirmo a palavra "simbólica" porque de símbolos vivem os países, estas grandes comunidades que são. E nenhuma das monarquias europeias - com a excepção da norueguesa - foi plebiscitada. Assim aconteceram, assim ficaram.

3. Espanha é um caso especial. Especial pela sua história. Quando se discute Espanha parece ainda que a sua história tem apenas 80-90 anos, como se começando apenas em 36. Onde uma Espanha republicana começou  a ser derrotada por um futuro ditador, um general baixo e galego que dava pelo nome de. Já agora, a abdicação de Afonso XIII em 1931 nasceu de umas eleições municipais perdidas para os republicanos, não de um referendo (embora, na prática, as mesmas eleições fossem entendidas como tal). Espanha viveu uma transição da ditadura para a democracia muito curiosa, com a imposição de monarquia pelo ditador que saía, mas onde - incontestavelmente - o rei imposto por Franco foi fundamental para que a democracia se impusesse de uma forma incruenta. Embora Espanha seja a única monarquia europeia que já foi república e que o deixou de ser sem haver consulta popular, a verdade é que a transição aconteceu com a monarquia como um dado adquirido, sendo a mesma aceite tacitamente por Felipe González e Santiago Carrillo. Uma transição que permitiu que a direita reciclada se organizasse sob a AP de um triste ex-ministro de Franco, Manuel Fraga (realmente os galegos e Espanha... por diós!).  Assim como o 25 de Abri já foi há 40 anos também a transição espanhola. E os panos quentes daqueles tempos estão esquecidos. O cuidado que houve para esquecer as velhas noções de vencedores e vencidos. Et pourtant...

4. A guerra civil espanhola foi uma guerra nada romântica - apesar de toda a poesia, de todos os romances escritos e dos filmes realizados. Aprendi ontem que Espanha é o segundo país do mundo com mais desaparecidos, a seguir ao Camboja. As Guerras dos Balcãs duraram com interrupções dez anos e provocaram 140000 mortos. A Guerra Civil Espanhola em três anos matou MEIO MILHÃO. Esta ferida é algo mais do que uma ferida apenas. E ainda não curou. A transição evitou um reacender dos conflitos, mas interessa saber se apenas os adiou em vez de os resolver. O que correu mal com Espanha?

5. O sucesso da transição espanhola assentou também em três partidos - a UCD de Suarez, o PSOE de Gonzalez e o PCE de Carrillo - e num acontecimento específico, a regionalização com a criação das autonomias, que em grande parte resolveu o problemas das nacionalidades históricas. Vejamos o que aconteceu a cada um destes factores. A UCD morreu com o apagar-se de Suarez. Foi absorvida pela AP/PP, na realidade um partido reciclado a partir de ex-franquistas e que depois adquiriu um líder, Aznar, com uma dialéctica nada conciliadora mas sim herdeira de tempos antigos. O PSOE chegou ao poder com Gonzalez, um feito histórico. Mas o poder não lhe fez bem. E a corrupção e a guerra suja contra o terrorismo passou factura a um partido que ficou definitivamente órfão dos tempos em que chamar-se "socialista" e "obrero" ainda tinha alguma lógica. O PCE foi mirrando tranquilamente, vítima da sua irrelevância eleitoral progressiva. Apagou o nome "comunista" da lista eleitoral - o que para nada serviu. Manteve-se como uma espécie de "segundo partido" onde o eleitorado votaria se. E as autonomias. Para começar o sistema eleitoral espanhol cometeu o erro de favorecer os partidos regionalistas, fazendo deles forças pivô no fazer e desfazer de governos. Logo o PNV e o CDC ganharam uma relevância nacional desproporcionada e começaram o seu jogo clássico de negociar autonomia e/ou dinheiro vs votos no congresso. Partidos de centro-direita por vocação e gestores de interesses por opção de classe, rapidamente caíram na corrupção - veja-se o Pujolismo. E levamos quarenta anos nisto. Por outro lado as autonomias criaram o cancro dos "barões" partidários, tanto no PSOE como no PP. A corrupção imobiliária começou a tomar conta de autonomias completas - em ambos os partidos. Milhões de pesetas e depois de euros compraram as consciências quase todas, as mais pesadas e as mais diáfanas.

6. A personalidade e prática cripto-franquista de Aznar, a traição terrível de Gonzalez a todo um povo que nele acreditou, o crescendo das chantagens autonómicas com a deriva independentista do PSC, tudo isto rematado com a abulia de Zapatero, permitiu que uma Espanha em crise económica, financeira e social se encontrasse dividida, partida em duas, como não tinha acontecido em quarenta anos. E agora?

7. Agora, repito, a questão monárquica parece-me ser aquela que menos interessa resolver. Mas as prioridades decidem-na os espanhóis, o que eu não sou. Independentemente de eu achar que, neste momento, um referendo manteria a monarquia "á frente" de Espanha. Mas não nos enganemos, à frente de Espanha está um galego (uma vez mais, é mania!) esquizofrénico chamado Rajoy, e por vontade popular - ou não seja o parlamento a representação do povo... - a governar tão legitimamente como, por ex., António Costa em Portugal!

8. O problema da democracia é que, querendo, todos podem votar... incluso los malos de la película! USA! USA! USA!...

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Aquilo que eu nunca fui.

"Dr. Manuel Gama?" - a voz traía alguma incerteza na expressão: quem assim me interpelava por telefone sabia que este não era o meu nome "clínico" mas, afinal de contas, o ralhete implicava distância e a colega em questão, bem mais nova e, só por engano - acredito, doutorada, iria naufragar  na sua intenção no nome que procurava de todo evitar, aquele pelo qual toda a gente que me interessa no meu hospital me conhece. Resultou que o ralhete não era para mim, que o equívoco provocou um murmurado - nem sei bem se o ouvi - pedido de desculpas. Manuel Gama é o nome do meu pai. É possível que, com o correr do Tempo, esse terrível aliado, venha também, aqui e ali, a ser o meu. Para treinar, tenho um amigo, um amigo só, que, novo nas minhas redondezas, chama-me de Manel. Soa-me bem, até. Dr. Manuel Gama nunca fui, nunca serei. Passe bem, minha cara Doutora. E vá dar aulas noutro telefone.

Este nome que é o meu.

"Guilherme!" - chamou-me. Fnac. Há quanto tempo não ouvia o meu nome tão bem dito. Andava eu por ali perdido, procurando com que me entreter, acabei por estacionar em DVD's low cost, "To Have and To Have Not", "Tabu", "I Was A Male War Bride". Gosto tanto de Cary Grant. "Guilherme!". Era uma despedida que estava por fazer e se fez. Sem palavras, claro. Apertou-se-me o coração perante um tão maior que o meu. Pensei logo naquele momento em oferecer-lhe o primeiro volume da poesia do Ruy Cinatti, um poeta tão seu! Mas o volume é tão pesado e desajeitado, tão mal pensado pela Assírio & Alvim!. Sim, confirma-se. O meu amigo Padre Nuno foi-se embora.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

"Sabes, não me ganhas."

"Sabes, não me ganhas. A tua e a minha solidão são equivalentes, a vontade de comer do mundo as partes que sabemos boas - e tu e eu sabemos tanta coisa, um problema, eu sei - também, pois, mas eu consigo protelar por mais tempo os tempos infindos da grande paragem que pode propiciar a queda da muralha, o desarmar das defesas, o desfalcar dos andares últimos onde tu ou eu, tu e eu, temos snipers atentos, insensíveis, a mira atenta e desprovida até da crueldade, tão eficazes. Eu, minha cara amiga, tenho os meus livros."
LM 

sábado, 12 de novembro de 2016

Que foi feito do Eduardo?

Verifiquei há pouco que a minha querida ADO - no futebol sénior - está neste momento na 2ª divisão B do Campeonato Distrital da A.F.de Aveiro, campeonato liderado pelo S.Vicente de Pereira. S.Vicente de Pereira é uma pequena freguesia, a mais pequena e menos povoada do concelho de Ovar. Nem sabia que tinha equipa de futebol. S.Vicente tem de importante algumas "casas de brasileiro". Nem sabia minto, de S.Vicente era o Eduardo Santos Silva, o melhor jogador de futebol do Liceu, Semedo incluído. Que acho que jogou na equipa de juniores do S.Vicente. Tinha uma finta imbatível. Que foi feito de ti, Eduardo?

Serralves - Michael Krebber.

Não, não, ao contrário do habitual não vou fazer de conta que entendo Michael Krebber, de quem eu nunca tinha ouvido falar até esta exposição. Alemão (fixe), o seu quid parece ser o que fazer quando tudo já foi pintado? Em todas as artes esta é/será A pergunta. O abaixo foi o que eu vi (e gostei).