domingo, 20 de novembro de 2022

O Tour de 59.




O ano de 59 vinha muito bem lançado. No Giro de Itália tinha acontecido um embate feroz entre Charly Gaul e Jacques Anquetil, com este a perder o Giro numa penúltima etapa cheia de montanha, ao ter aquilo que os franceses chamam "un jour sans" e os espanhóis mais prosaicamente chamam "una pájara". Ness etapa Anquetil perdera 9 minutos. Gaul era neste momento o detentor do título das duas Grandes Voltas, fazendo uma de Coppi ao contrário. Conseguiria ele repetir a dose de 59? 

Começando ao contrário, portugueses na equipa Internacional voltavam a se dois: Antonino Baptista e Sousa Cardoso, este provavelmente por uma vitória tida numa etapa da Vuelta. O Luxemburgo de Gaul voltava a ser emparelhado com a Holanda. A equipa belga voltava a ter um ramalhete interessante: Adriaensens, Brankart, Janssens, Planckaert, Hoevenaers. Brankart ganhara o recentemente criado GP du Midi Lbre, Hoevenaers tinha sido segundo na Gent Wevelgem e primeiro na Fléche Wallone, o segundo nesta sendo Marcel Janssens, Os italianos tinha Pierino Baffi para caçar etapas e Ercole Baldini e Vito Favero (nenhum deles a fazer uma grande época) para a Geral. Baldini, porém, trazia as insígnias do título de Campeão do Mundo, conquistado em 58 à frente de Bobet. A França apresentava Anquetil à cabeça, a prometer a vingança do acontecido em França (nunca um corredor francês ganhara o Giro), mas ao lado apareciam Bobet, Geminiani e um rapazito novo, Roger Riviére, 22 anos, que prometia muito. Os espanhóis voltavam com Bahamontes (Loroño recusara-se a ter um papel de subordinado na equipa e não alinhava) e a equipa Centre Midi acumulava Henri Anglade, Forestier, Dotto, Rohrbach e Louis Bergaud. Anglade era campeão de França e vencera recentemente o Dauphiné e fôra 2º na Volta à Suiça.

O percurso voltava a começar a montanha nos Pirenéus, desta vez um pouco mais cedo, à 10ª etapa. Voltava a haver 3 contra-relógios, sendo o do meio uma crono-escalada no Puy de Dôme.

Pelo 4º ano consecutivo Darrigade ganhou a primeira etapa. Dos principais Bahamontes e Hoevenaers chegaram na frente e ganharam minuto e meio. A 2ª etapa chegava a Namur, na Bélgica. Pelas lutas finais o pelotão chegou aos soluços. com pequenas diferenças. O vencedor da etapa fora o italiano Vito Favero. Era engraçado neste terreno ver Bahamontes 3º da geral. A 3ª etapa terminava no velódromo de Roubaix e aqui Antonino Baptista consegue entrar na fuga vitoriosa e é 7º na etapa. Algo para contar aos netos. Esta fuga ganhou 11' a um manso pelotão e colocou transitoriamente Antonino Baptista no top dez! A quarta etapa até Rouen foi decidida ao sprint sem mais. Na 5ª etapa uma fuga com pouca história recompensou outra vez Favero e Hoevenaers.

A 6ª etapa era um contra-relógio de 45 km. E foi ganha pela nova sensação francesa Roger Riviére.  Anquetil foi apenas 3º, tendo ainda pela frente o italiano Ercole Baldini. A seguir o suiço Rolf Graf, o francês Gerard Saint, e depois Gaul, Brankart e Anglade. Bahamontes foi 10º perdendo 3'. Bobet perdeu 4'. Sousa Cardoso 5', Antonino Baptista 7'. Este miraculosamente ainda era 10º na CG, mas Riviére como primeiro dos ases aparecia logo atrás. A etapa 7 rendeu uma fuga e com isso forneceu a Adriaensens e ao irrequieto Hoevenaers, 4' extra. Nas 2 etapas que se seguiram de aproximação aos Pirenéus, a etapa até Bordéus não teve muito que contar, a que terminou em Bayonne foi mais mexida e com um selecto grupo de "primeiros" a chegar a Bayonne pouco depois da escapada. O belga Eddy Pauwels era o nova camisola amarela. Os favoritos estavam separados por segundos. Era dia de descanso.

A etapa 10 tinha o Tourmalet no caminho e perto da meta. A equipa belga criou a surpresa ao inventar uma fuga, que no sopé do Tourmalet tinha 15 minutos de vantagem. Isto permitiu que fosse um belga a ganhar a etapa, Marcel Janssens, embora a amarela fosse para o francês Vermeulin, que também tinha participado na fuga, No Tourmalet Bahamontes e Gaul deixaram os outros para trás e chegaram à meta juntos com minuto e meio de avanço sobre Anquetil,  Riviére, Baldini, Anglade, Bobet. Outros belgas deram-se mal: Brankart e Adriaensens perderam tempo, Geminiani também. Sousa Cardoso chegou a oito minutos de Bahamontes, Baptista foi último.  Na etapa 10, com o Aspin e o Peyresourde, Bahamontes e Gaul voltaram a atacar nas montanhas mas depois fez-se uma junção parcial e chegaram 25 corredores juntos a St Gaudens, onde até Darrigade (futuro Campeão do Mundo em 59) ganhou ao sprint. Quem tinha perdido tempo? Brankart 3 minutos, Janssens (pagando o esforço do dia anterior) nove, idem Geminiani. Sousa Cardoso voltou a portar-se melhor do que Antonino Baptista.  A etapa 13 para Albi não teve história. Como estavam as coisas depois dos Pirenéus? À frente um peão francês, Vermeulin,. A seguir duas incógnitas belgas, não conhecidos como trepadores, Armand Desmet e Hoevenaers. Depois, uns minutos depois, apareciam 4 franceses a saber: o jovem Gerard Saint, Henri Anglade, Roger Rviére e François Mahé. Depis um trio de estrrangeiros: Baldini, Bahamontes e Gaul. Finalmente aparecia Adriaensens e só agora Anquetil. Janssens, Bobet e Brankart estacvam um pouco mais para trás, Geminiani tinha desaparecido em combate. Sousa Cardoso era 48º, Antonino Baptista 72º. 

Na etapa 13, etapa de média montanha, tinham anunciado que Bahamontes ia atacar. Atacou e cedo. E atacou e atacou. Um grupo pequeno de corredores conseguiu resistir e depoii das montanhas conseguiu apanhá-lo.Quem? Anglade, que ganhou a etapa, Anquetil, Baldini, François Mahé, o inglês Brain Robinson e o belga Adriaensens. A 4 minutos chegaram os belgas Hoevenaers e Eddy Pauwels, Brankart, Roger Riviére, o espanhol Fernando Manzaneque e o francês Bergaud. Charly Gaul apagou-se nos últimos quilómetros da etapa e perdeu em 50 km 20 minutos (o calor?), a par de Louison Bobet. A lista de candidatos estava agora bem mais curta. Sem Charly Gaul, o campeão em título. A etapa queimou muitos corredores que desistiram ou cortaram a meta fora do controlo. Sousa Cardoso e Antonino Baptista safaram-se com 32' de atraso. A etaspa 14 pouco adiantou, terminando em Clermont-Ferrand. 

A etapa 15 era o contrarrelógio no Puy de Dôme. E... Bahamontes ganhou. Gaul foi segundo a mais de um minuto. Depois três franceses, Anglade, Rivkiére, Anquetil, por esta ordem. Agora Brankart, depois mais três franceses, Saint, Huot e Mahé e, em décimo Adriaensens. Em 11º o antigo campeão Bobet, a cinco minutos, numa subida onde Bahamontes só tinha gastado 36'15. A maior desilusão? Ercole Baldini. Sousa Cardoso foi 45º, Antonino Baptista 78º e penúltimo. Lembro que Sousa Cardoso venceria a Volta a Portugal em 1960 com o Porto. Agora a amarela estava com o belga Hoevenaers mas por 4 segundos apenas, com Bahamontes em segundo. No mesmo minuto estavam o belga Eddy Pauwels e o francês Henri Anglade. Anquetil era sexto, mas a 5 minutos. Anglade era agora o capitão de França? Mas Bahamontes aparecia realmente como favorito, o melhor trepador que não se tinha deixado atrasar na primeira metade do Tour, ao contrário do habitual. Faltavam os Alpes e um último e longo contrarrelógio. A etapa 16 pouco adiantou, Pauwels ganhou segundos e a amarela, um detalhe. Estávamos em St Etienne e este ano havia um 2º dia de descanso.

A etapa 17 foi a primeira dos Alpes, terminando em Grenoble. Gaul e Bahamontes terminaram a etapa isolados. Gaul ganhou a etapa, Bahamontes a amarela.  Todos os demais chegaram num largo pelotão quase quatro minutos depois. Sousa Cardoso não acabou a etapa. Antonino Baptista perdeu também muito tempo. A etapa 18 englobava o Galibier, o Iseran e mais, mas só um furo de Bahamontes nos km finais permitiu um ataque de alguns. com vitória de Baldini em St Vincent. Segundos ganhos por Gaul, Anglade mas não Anquetil. Bobet desistiu nesta etapa. Dois belgas, que eram 2º e 3º, Hoevenaers e Pauwels, perderam algum tempo. Antonino Baptista aguentava-se nos últimos lugares, a duras penas. A última etapa alpina terminava em Annecy e passava no Grd San Bernardo e no Forclaz (2 vezes). Um curto pelotão formou-se logo no Grd S Bernardo que assim se manteve até à última subida. Antes o suiço Rolf Graf isolara-se - e ganhou a etapa. Na última subida voltou a atacar Bahamontes, respondeu Gaul. Ao fim do dia Antonino Baptista cortou a meta fora do tempo de controlo. Os Alpes tinham sido demasiado pesados para os dois portugueses. 

A etapa 20 não teve história. Ganhou Brian Robinson com 20' de avanço sobre o pelotão. A etapa 21 foi um contrarrelógio de 69 km. Bahamontes partiu para o mesmo com 5'40'' de avanço sobre Henri Anglade e 10'14'' sobre Jacques Anquetil. Ganhou a etapa Roger Riviére, com mais de 1 minuto de avanço sobre Anquetil. Bahamontes só perdeu cinco minutos para Anquetil e dois minutos para Anglade. Gaul não se esforçou e perdeu muito tempo. Bahamontes tinha 4'01'' de avanço sobre Anglade, 5'05'' sobre Anquetil e 5'17'' sobre Rivi'ere. Anglade podia queixar-se da falta de apoio do resto da equipa francesa, mas o Tour pertencia a Bahamontes sem espinhas. 

A última etapa foi uma barbaridade de 331 km até Paris, mas terminou em pelotão. Bahamontes era o vencedor. O público francês aplaudiu o vencedor, o segundo Henri Anglade também foi aplaudido. Anquetil e Riviére não. Bahamontes vencera na montanha e também no plano, ao defender-se nele melhor do que o habitual. 



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