domingo, 16 de novembro de 2014

Dos avós que temos ou tivémos, Paulo.

Não conheci o meu avô Manuel, o pai da minha mãe. Das grandes penas da minha vida esta é, sem dúvida, a mais irrevogável. Que se pode aprender com um avô ou uma avó? Nada que tenha a ver com palavras. Os avós são uma espécie de calor que nos acontece. As lições não têm princípio, nem meio, nem fim. Nem são lições mas momentos, episódios, achados que não vamos querer perder. Dos meus avós paternos, Guilherme e Piedade, pouco posso dizer porque o tal calor de que falo nunca foi muito. Alguém me disse recentemente que eu era o neto preferido. Que outros por isso sofreram. A culpa nas costas de uma criança é muito mais do que um casaco mal vestido. Eu não era o neto preferido. Era o rapaz primeiro, filho do irmão mais velho, e isto foi um peso. Os meus avós serviram-me apenas para eu aprender a ler o meu pai. Ao fim de muitos anos aprendi. A minha avó materna, Rosa, também nunca me transmitiu muito do calor de que falo. A casa dela foi-me quase sempre estranha e, para o fim, ficou cada vez mais longe, até se perder. Para a minha avó Rosa eu era o resultado de um casamento mal visto, não querido, indesejado. Aqui eu não precisei de a conhecer bem para aprender a ler a minha mãe. O meu acesso muito directo, horário, à minha mãe e aos seus problemas de vida deram-me toda a leitura necessária, que até hoje se prolonga. Ainda a semana passada alguém terá ido bater à porta da casa de meus pais para formalmente pedir desculpa por coisas passadas há trinta, quarenta, cinquenta anos. Assim são as famílias que, de mal construidas, acabam por perecer bem antes da morte dos seus elementos. É engraçado, toda a minha vida tenho-me encontrado com pessoas que elevam o altar familiar a grandes alturas. Eu não, nem qualidade nem defeito. Não aconteceu. É também por isto, meu caro amigo Paulo, que queria dar-te os parabéns, pela tua - contaram-me - grande tristeza pela recente morte da tua avó. E "os meus sentimentos" são estes. Um abraço.

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