quinta-feira, 17 de março de 2022

Ghazni




A província de Ghazni é das mais populosas do Afeganistão, bem mais de um milhão de habitantes, e fica a meio caminho entre Kabul e Kandahar, sendo a cidade capital de Ghazni o principal entreposto comercial na estrada que liga os dois grandes centros. A província é rica em história e em pouco mais. A pouca agricultura que resiste à seca crónica completa aquilo que os homens emigrados em Kabul, no Paquistão, noutros sítios, enviam para casa. O norte da província é Hazara, a parte que é mais montanhosa. O sul é Pashtun, incluindo a cidade capital, de nome Ghazni também. A segurança desta província nunca foi muita. E algumas províncias pashtun deixaram de estar controladas pelas forças governamentais já desde 2017, 2018. 

Eis nove coisas sobre a província de Ghazni.

1 - A origem da cidade de Ghazni perde-se no fundo dos tempos. No entanto também Ghazni foi refundada (depois de destruída?) por Alexandre o Grande, como Alexandria Opiana.

2 - No séc X dc um governador de Ghazni, então províncias do Império Persa dos Samânidas, um turco mameluco, expandiu o território sob o seu governo e tornou-se de facto independente. O reino Ghaznávida atingiu o seu apogeu no século seguinte, ocupando partes da índia e do Irão, e atingindo inclusivé o Oceano índico. Ghazni era então uma metrópole comercial e cultural de primeira grandeza. Este apogeu pouco mais tempo durou porém, e a dinastia e o reino extingiram-se em 1186. Os Ghaznávidas culturalmente foram uma extensão da cultura persa do tempo e introduziram o islamismo na Índia como paga dos inúmeros saques realizados.

3 - A complexa história da cidade de Ghazni está expressa na presença de dois minaretes, restos de uma enorme mesquita e as escavações do palácio de Mas'ud III (séc. XII). Os minaretes, construídos em forma estrelada, eram também "torres de vitória" ao possuírem nas suas paredes descrições em baixo-relevo das vitórias dos Ghaznávidas. A citadela é algo posterior mas é enorme e imponente, embora também em ruínas. 

4 - Em Ghazni repousam os restos mortais de al-Biruni, um génio nascido mais para o norte em terras hoje do Uzbequistão mas que, coagido a estabelecer-se em Ghazni, nesta viveu até falecer. Viajou com o Imperador de Ghazni várias vezes até à India, escrevendo as primeiras obras relevantes sobre os seus costumes, obras consultadas séculos depois pelos ingleses! Foi astrónomo (ciência que diferenciava bem da astrologia), físico, linguista, e, com os seus estudos da Índia, está descrito como o "primeiro antropólogo", escrevendo vários livros onde comparava as várias religiões, dentro de uma visão abrangente e nunca integrista. Dos primeiros ainda a dividir a hora em sessenta minutos e estes em sessenta segundos, este grande homem tem direito a ter dado o nome a uma cratera na lua e a um asteróide. O seu cálculo do raio da Terra falhou por 2%, sendo a primeira aplicação conhecida da Lei dos Senos.

5 - A ISESCO declarou em 2013 Ghazni Capital Islâmica da Cultura.

6 - Ghazni foi o local de várias batalhas, devido à sua localização estratégica. Em  1148 os Gaznávidas perderam a cidade para um reino rival, sinal da sua decadência, embora a tenham reconquistado no ano a seguir. No século XIII Ghazni também foi arrasada pelos mongóis. Os ingleses tomaram Ghazni em 1839 na 1ª Guerra Anglo-Afegã, fazendo explodir parte do pano de muralha da cidadela, considerada inexpugnável. Em 2018 os talibã, que já dominavam vários distritos da província de Ghazni e controlavam a estrada Kabul-Kandahar, obrigando quem passava a pagar um tributo, atacaram Ghazni e durante quatro dias, dominaram parte da cidade. Retiraram finalmente após muita mortandade e destruição, não sabemos se derrotados ou se apenas porque sabaim que, três anos depois, entrariam de vez em Ghazni sem dificuldade nenhuma 

7 - Em 1988 viajou numa missão Soyuz o primeiro e até agora único natural do Afeganistão a chegar ao espaço. Era o tempo da presença soviética no Afeganistão. O homem chamava-se (e chama-se, ainda é vivo) Abdul Ahad Momand e é natural dum distrito do leste da província de Ghazni, da etnia pashtun. Quando da queda do regime em 1992, Abdul Momand emigrou para a Alemanha, tornando-se cidadão alaemão em 2003.

8 - Os hazaras compõem a população da metade noroeste da província. Em 1998 o Hazarajat, cercado pelos talibã, foi subjugado pela fome. Morreram mais de 100000 pessoas, no que foi para todos os efeitos um genocídio.

9 - Os hazaras curiosamente são conhecidos pela sua dedicação, tão espúria no Afeganistão, em escolarizar as suas crianças, incluindo as meninas, nas esperança de que a escolarização corrija a sua marginalização da sociedade afegã.


 

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