terça-feira, 24 de julho de 2018

Do que me lembro da Guiné - quinta parte.


E, finalmente, saímos de Bissau. Não posso dizer que Bissau seja uma terra bonita. Terá sido antigamente? Dizer que uma cidade era bonita nos tempos coloniais é, mais do que incorrecto, injusto para os colonizados - faziam eles parte da beleza cénica criada por Portugal? A famosa beleza "português suave" ?
Por outro lado não posso manifestar qualquer opinião sobre os habitantes de Bissau. Caminhei pouco por Bissau. E nós, dois brancos, efectuámos todo e qualquer contacto com a intermediação dos nossos anfitriões, outros dois brancos, estes sim, percebi, bem conhecidos de muita gente. É um elogio a este simpatiquíssimo casal dizer que nunca senti receio. Posto isto, Bissau não me pareceu uma cidade particularmente perigosa.
Saímos de Bissau. Para onde? Se eu soubesse contava. Na estrada, em bom estado, uns mocinhos tinham uma corda estendida para ver se parávamos e dávamos uma ajuda. Não parámos. À volta de Bissau adivinha-se que houve muitos arrozais. Dizem-me que ainda há alguns. Alguns quilómetros andados entramos em terra de monocultura da castanha de caju, actualmente a maior exportação da Guiné.
No meio de uma desolação encontrámos o mais improvável dos resorts. Gerido por um português com sotaque e biótipo alentejano, não consegui perceber como aquelas cabanas tinham qualidades para temperar o calor asfixiante que estava e convencer alguém a nelas ficar. A praia estaria a quilómetros, enfim, eu não sabia onde estava. O que retenho deste almoço? As ostras. Confesso: nunca tinha comido ostras. Noutra vida voltarei à Guiné para voltar a comer aquelas ostras. O peixe depois também foi correcto. Falava-se de negócios, fugas, fronteiras passadas sob ameaça, dinheiro, muito dinheiro. Falavam em português mas era para mim como que uma língua estranha.
A praia ficava uns quilómetros mais à frente. Mais do que uma praia era a curva de um rio. Outro resort, uma esplanada com um avarandado com cheiro antigo, colonial. As instalações um pouco sofridas. Um calor perfeito, uma brisa a pedido, a linda curva de um rio cujo nome nem perguntei. Voltei a arriscar no gelo.
À noite jantamos nas traseiras da casa dos nossos anfitriões, à luz do luar e de uns petromaxes, sem luz e também avariado o gerador da casa. Éramos cubanos, éramos portugueses, éramos guineenses. Irmanados pela boa comida e uma amizade de dias. A guerra voltou à conversa, sempre voltava. Amílcar, e os mais. E a diabetes da decana dos cubanos, que a obrigava a voltar à ilha. A Guiné e a doença não são boas amigas. Fiz boa amizade com um simpatiquíssimo oficial (ex- ?) da Força Aérea da Guiné. Que ajudara os cubanos a fazer, nos anos setenta, a ponte aérea para Angola.

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