Charles Laughton era um actor inglês naturalizado americano com 56 anos quando este seu único filme apareceu. Conhecido como actor "de composição" - e os americanos gostavam muito dos actores ingleses para fazerem trabalhos de "composição" à volta das suas estrelas de primeira grandeza, Laughton fez um filme de que então ninguém gostou, mas que hoje é considerado um dos marcos do cinema americano dos anos cinquenta. E fez só este filme, não mais. Morreu sete anos depois.
Talvez seja por "The Night Of The Hunter" que tantos actores de cinema passam para trás das câmaras. Infelizmente.
Os actores principais são Robert Mitchum, Shelley Winters e Liliam Gish. A história passa-se no Sul religioso nos tempos da Depressão. Mitchum é um pregador que vai seduzindo e assassinando viúvas pelo caminho e que vai parar á prisão por ter roubado um carro. Coincide na cela com um homem que assaltou um banco e matou duas pessoas. Este diz-lhe que tem dez mil dólares escondidos em casa antes de ser enforcado. Mitchum pouco depois é solto e vai à procura dessa nova viúva e do seu dinheiro. Encontra-a e percebe que ela não sabe do dinheiro mas os dois filhos do defunto sabem.
"The Night Of The Hunter" não é um filme de terror mas um filme de horrores. A Depressão e o mal que fez à sociedade americana; o horror da religião plana e fácil explorada pelos pregadores, a violência a que mulheres e crianças fácilmente foram sujeitas nesses tempos. Não há um homem bom nesta história. E mulher há uma só, Liliam Gish, que no fim acolhe as crianças e que as defende de carabina em punho. Tudo o mais é mau ou fraco. Ou são crianças.
"The Night Of The Hunter" é um filme filmado a preto-e-branco bebendo no expressionismo germânico dos anos vinte e trinta, está bom de ver. Mas não vamos esquecer que Laughton era um homem nascido no teatro, daí talvez o aspecto artificial e metafórico da accão, que se amplia à medida que o filme vai crescendo em suspense.
"The Night Of The Hunter" ofereceu várias imagens e sequências que ficaram para a história dos filmes, conhecidas mesmo por quem nunca viu o filme todo. As letras LOVE/HATE tatuadas nos dedos de Mitchum mais a devida explicacão, a voz deste a chamar as criancas quando desce ao armazém: "oh chil....dren!". Shelley Winters no fundo do rio no velho carro, Liliam Gish em contraluz, a carabina no colo. Acrescento uma mais, a dos animais que vamos vendo à medida que as criancas descem o rio no bote pela noite dentro, uma tartaruga, uma rã, um coelho. Uma teia de aranha. Testemunhas silenciosas da inocência em fuga. Mas uma coruja mergulha e mata o coelho. "These are hard times for little things!" Todos aqueles animais buscavam também um esconderijo na noite. Mas o pregador, como a coruja, trabalha de noite: "Does he ever sleep?" - pergunta o rapaz. E o pregador ameaca: "I'll be back! With the night!"
"The Night Of The Hunter" é ainda muito mais do que isto. Mas vê-lo uma só vez não chega. Donald Trump também devia vê-lo. Correcção: já o viu.
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