É o teatro a voz humana. Ou não. Acabei de assistir a uma peça onde entrava a minha filha. Preocupada estava ela mais depois com o jogo cénico, a dinâmica da cena, como tinha corrido, onde subiram, desceram, deslizando de um lado para outro, recompondo o cenário, porque depois havia mais peça. É o teatro... teatro. A etimologia é grega e significa "espectáculo". São alunos. As vozes a crescerem e a fazerem-se, mas também - isso - a aprenderem a "encenar" - estar em cena, será, o que pedido fôr. As marcações, o movimento, usar o corpo todo em todas as suas cordas e não apenas as da voz. As palavras que se ouçam e que se perceba que não são tuas - e que se percebam. Palavras em movimento num corpo em movimento. E, vejamos, aprender a rir e a chorar em cena é bem difícil! Falar bem alto e gritar, para depois perceber que já não é preciso. As palavras fortes nem são as mais altas.
A peça era de Howard Barker. Século XX all over. "Feridas no Rosto", o título português. Sim, porque somos o rosto que temos, ou melhor, somos o rosto que somos. "It is impossible - now, at this point in the long journey of human culture - to avoid the sense that pain is necessity." E se doemos na cara ver-se-á mais. Nesta peça fere-se, bate-se e mata-se. Uma mãe, por exemplo. A ditadura do rosto faz de nós feras. Se somos o rosto que somos e visivelmente tu és mais bonito do que eu... Porém um momento há onde dois sósias se defrontam - uma das cenas onde entra a minha filha - e a igualdade gera ainda mais violência - a um sósia não podes ganhar na guerra dos rostos, ou não tens outro remédio senão perder quando o teu sósia do mesmo rosto fizer melhor uso sendo... uma pessoa melhor.
"Se mentires, saberei!" É uma das falas finais e fica por ali a bailar. Poderá contornar-se esta verdade? Dar a volta é a expressão quase certa - ela vira-lhe as costas. Este teatro negro pede-nos que se busque mentir sem que ninguém saiba. Ser assim livres, talvez, noutro mundo, noutra peça.
Outra opção - outro teatro? - é não mentir, ponto.
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