sábado, 5 de setembro de 2015

Rocha ágil / Completamente negra

TOURO II

"Rocha ágil
Completamente negra

A única praia possível
É uma poça de sangue"

Este poema é de Alberto de Lacerda e pertence a um conjunto de poemas chamado "Tauromagia". A poesia em língua castelhana inspirada pelo festa taurina é incontável. A sublimação da crueldade humana e do seu instinto de morte através de um estranho tipo de arte que para isso criou um esplêndido bicho, cujo único destino é ser morto em arena. Isto teve o seu tempo. Tempo que terá sido também esplêndido, "uma estranha forma de arte". Pede que nos concentremos na arena e não olhemos demasiado para as paixões que correm na assistência. Hemingway et al ajudou muito ao mito. 

Falo do toureio a pé, claro. O toureio a cavalo só é estrela em Portugal e não evita o castigo do animal, antes o aumenta. Refina-o, pois é feito em maior desigualdade e acontece "de cima para baixo". É um ménage a trois com, adivinho, grande sofrimento para o cavalo. Os ferros vão exsanguinando o touro. O toureio a cavalo é uma arte de senhores e de castigo contínuo, um bandarilhar a cavalo. O toureio a pé é a versão popular da festa. Para muitos rapazes do povo a arena de touros é o único salão onde alguma vez poderão dançar. É uma promessa de tango entre um homem e um animal. Mas que termina em morte. Em Portugal não se pica o touro, el tercio de varas. Porém, a sorte das bandarilhas tem na realidade o mesmo objectivo, castigar o touro, sangrá-lo. O toureiro a pé que não mata só castiga o touro uma vez, quando mata ou simula a morte. Mas antes houve uns quantos pares de ferros espetados.

Finalmente, a pega de caras é uma forma criativa - e de grande coragem, própria para jovens, como se um teste de virilidade, ou para homens mais velhos que dizem "ainda consigo" - de simular a devolução do touro ao curro e só existe onde não se mata, isto é, cá.
O tema de matar em Portugal apareceu há uns tempitos para puxar público, que tem vindo a diminuir. Se calhar a festa dos touros no seu todo está na hora é de acabar. 
Terei pena pelas pegas de caras, que se tornarão impossíveis ao não estar o touro cansado, sangrado...

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